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No coracao do mar - Charlotte Rogan

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ajoelha<strong>do</strong> à minha frente, até que gritei:<br />

— Henry! O que está acontecen<strong>do</strong>?<br />

Tentei ser o mais convincente possível, pois começava a temer que houvesse<br />

algo erra<strong>do</strong> com ele, que estivesse <strong>do</strong>ente ou até morren<strong>do</strong> e que se preocupasse<br />

por ter arranca<strong>do</strong> de mim a promessa de casar com ele sob falsos pretextos aos<br />

quais estava comprometi<strong>do</strong>, ainda que sua decisão estivesse tomada.<br />

Por fim, como não consegui pensar em outra coisa a fazer, caí de joelhos a<br />

seu la<strong>do</strong> e ali permanecemos, na companhia de crianças curiosas que, agora<br />

estimuladas por nossa estatura reduzida, nos rodeavam arrastan<strong>do</strong> os pés na terra<br />

e queren<strong>do</strong> desesperadamente conseguir de Henry algumas das moedas que ele<br />

sempre guardava no bolso, porém se sentiam inibidas pela emoção que se<br />

desprendia de nós, forte como o campo magnético que emanava <strong>do</strong> centro da<br />

Terra, e também pelo espanto, pois tenho certeza de que até então nunca tinham<br />

visto adultos se comportan<strong>do</strong> daquela forma.<br />

Os olhos de Henry haviam adquiri<strong>do</strong> um ar sombrio; agora eu os compararia<br />

com a cor <strong>do</strong> <strong>mar</strong> quan<strong>do</strong> nuvens pesadas se acumulam no alto, mas é óbvio que<br />

a comparação não me ocorreu naquele momento. Eu não pensava em nada,<br />

estava aterrorizada, incapaz de descobrir o que levara o homem charmoso e<br />

tranquilo que eu amava a ajoelhar-se naquele pedaço de terra que não era um<br />

terreno rico e de cheiro agradável, produto de várias gerações de evolução<br />

natural, mas uma combinação de estrume de cavalo e água de lavagem, sujeira<br />

de botas e restos de comida estragada demais até para ser consumida por<br />

crianças miseráveis. Depois percebi, com um choque que parecia saltar como<br />

fogo primordial <strong>do</strong>s olhos febris de Henry para os meus, que o motivo que levara<br />

Henry a ajoelhar-se naquele terreno imun<strong>do</strong> era eu.<br />

Estendi as duas mãos, não mais amedrontada porém ainda incerta sobre o que<br />

fazer com meu poder, e declarei:<br />

— Eu encontrei meu único e verdadeiro amor.<br />

Tomei suas mãos quentes entre as minhas, frias, e afirmei-lhe que não me<br />

importava que tivesse menti<strong>do</strong> para mim, contanto que fosse por uma boa razão,<br />

e eu confiava que assim fosse.<br />

— Acho que não suportaria uma mentira de fins levianos — brinquei, na<br />

tentativa de arrancar-lhe um sorriso, mas Henry era a personificação da tristeza.<br />

Parecia magro e cativante, muito diferente <strong>do</strong> banqueiro mundano que eu até<br />

então imaginara que fosse.<br />

— Menti para você duas vezes — admitiu Henry. — Não saí da cidade, mas<br />

isso é o que menos importa. A maior mentira é que sou comprometi<strong>do</strong> e ainda<br />

não desfiz o noiva<strong>do</strong>. Pensei em desfazer, mas quan<strong>do</strong> fui...<br />

Claro que eu sabia que ele era noivo, mas a confissão, vinda de seus lábios<br />

lívi<strong>do</strong>s, atingiu-me como se só então eu tomasse conhecimento <strong>do</strong> fato.<br />

— Mas então como pode me pedir... — comecei. — Como posso...

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