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— Às vezes fico quente e louca, e ela tem que me dar banhos frios. Às vezes preciso<br />
vomitar. Às vezes fico tremendo, fraca e cansada, e só quero dormir.<br />
Estava acontecendo de novo. Exatamente como Marian. Eu podia sentir bile no fundo da<br />
garganta, que se fechava. Voltei a chorar, me levantei, sentei de novo. Meu estômago revirava.<br />
Pousei a cabeça nas mãos. Amma e eu estávamos doentes exatamente como Marian. Precisou<br />
ficar óbvio assim antes que eu enfim entendesse — quase vinte anos tarde demais. Quis berrar<br />
de vergonha.<br />
— Brinque de boneca comigo, Camille.<br />
Ela não notou, ou ignorou, minhas lágrimas.<br />
— Não posso, Amma. Preciso trabalhar. Lembre-se de estar dormindo quando mamãe<br />
voltar.<br />
* * *<br />
Arrastei roupas sobre minha pele dolorida e me olhei no espelho. Você está tendo<br />
pensamentos loucos. Está sendo irracional. Mas não estava. Minha mãe matou Marian.<br />
Minha mãe matou aquelas garotinhas.<br />
* * *<br />
Cambaleei até o vaso e vomitei um jorro de água quente e salgada, as gotas do vaso acertando<br />
minhas bochechas enquanto eu me ajoelhava. Quando o estômago destravou, me dei conta de<br />
que não estava só. Minha mãe estava de pé atrás de mim.<br />
— Pobre menina — murmurou ela. Eu me assustei, me afastei engatinhando. Me encostei na<br />
parede e olhei para ela acima. — Por que está vestida, querida? Não pode ir a lugar nenhum.<br />
— Preciso sair. Preciso trabalhar. Ar fresco vai me fazer bem.<br />
— Camille, volte para a cama — disse, a voz ansiosa e aguda. Ela marchou até minha<br />
cama, levantou as cobertas e deu um tapinha. — Volte, querida, você precisa ser inteligente<br />
com sua saúde.<br />
Lutei para ficar de pé, agarrei as chaves do carro na mesa e passei por ela em disparada.<br />
— Não posso, mamãe; não vou demorar.<br />
Deixei Amma no andar de cima com suas bonecas doentes e desci a rampa de carros tão<br />
rápido que amassei o para-choque dianteiro no ponto em que a ladeira termina de repente na<br />
rua. Uma mulher gorda empurrando um carrinho de bebê fez cara de reprovação para mim.<br />
* * *<br />
Comecei a dirigir sem destino, tentando organizar meus pensamentos, repassando os rostos de<br />
pessoas que conhecia em Wind Gap. Eu precisava que alguém me dissesse claramente que