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Onofre Lopes Júnior - Fundação Jose Augusto

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Chico Antônio - cem anos depois<br />

Até que o menino se fez homem e amadureceu em seu<br />

peito aquele amor desesperado pela arte de cantar coco.<br />

Naquele tempo, Chico vagava pelas cidades do agreste<br />

potiguar, vendendo cocos secos que comprava nas cidades<br />

do litoral e cantando cocos surrealistas nas feiras do<br />

interior. Até que Antônio Bento de Araújo Lima, fi lho<br />

do coronel Araújo Lima, proprietário do Engenho Bom<br />

Jardim, em Goianinha e de outros engenhos mais, que era<br />

um apaixonado pelas artes plásticas e pelas manifestações<br />

da cultura popular, teve notícia do nosso embolador e<br />

mandou convidá-lo para morar no Bom Jardim.<br />

Antônio Bento era amigo dos escritores Câmara Cascudo<br />

e Mário de Andrade e, em 1928, quando se realizou a<br />

viagem de Mário ao Rio Grande do Norte, logo ele traçou<br />

um plano para que o escritor paulista pudesse conhecer<br />

Chico Antônio e vê-lo cantar os seus cocos de embolada.<br />

Esse episódio, que um dia, no futuro, Aloísio Magalhães<br />

descreveria como o encontro de duas grandes forças da<br />

natureza: de um lado, Mário, representando a cultura<br />

erudita, e do outro, Chico Antônio, o caudaloso rio da<br />

cultura popular; aconteceu no Engenho Bom Jardim,<br />

município de Goianinha, no dia 10 de janeiro de 1929.<br />

Para entender este momento mágico, deixemos que<br />

fale o próprio Mário de Andrade, no livro “O Turista<br />

Aprendiz”:<br />

“Estou divinizado por uma das comoções mais<br />

formidáveis de minha vida”.<br />

Tão emocionado fi cou Mário de Andrade com a arte de<br />

cantar coco de Chico Antônio, que lhe propôs, duas ou<br />

três vezes, durante sua permanência no Rio Grande do<br />

Norte, levá-lo para São Paulo. Prevaleceu o bom senso de<br />

Chico Antônio, preocupado com a esposa e os fi lhos. E o<br />

nosso coqueiro fi cou no Bom Jardim.<br />

Depois de um mês e meio de pesquisas intensas em nosso<br />

Estado, documentando as mais importantes manifestações<br />

da cultura popular do RN, Mário de Andrade regressa a<br />

São Paulo, em fevereiro de 1929, passando antes pela<br />

Paraíba e Pernambuco.<br />

Depois disto, foi o ostracismo para Chico Antônio.<br />

E assim se passou meio século. Até que em 1979, 50 anos<br />

depois de Mário, numa pesquisa de campo da <strong>Fundação</strong><br />

José <strong>Augusto</strong>, nosso embolador é redescoberto, morando<br />

nas “Porteiras”, um pequeno sítio de sua propriedade.<br />

Não obstante a idade de 75 anos, Chico ainda tangia<br />

o seu ganzá e entoava os velhos cocos, que foram o<br />

deslumbramento de Mário de Andrade, em 1929.<br />

22 Julho 2004<br />

Na condição de Diretor de Promoções Culturais da<br />

<strong>Fundação</strong> José <strong>Augusto</strong>, após a redescoberta do coqueiro,<br />

nós procuramos incentivar a todos os integrantes da área<br />

cultural, a fi m de que fossem prestadas a Chico Antônio<br />

as homenagens que ele merecia.<br />

À frente das homenagens que lhe foram prestadas pelo<br />

Ministério da Educação e Cultura, estava nada menos do<br />

que Aloísio Magalhães, não apenas um grande artista e<br />

intelectual, mas, sobretudo uma grande personalidade<br />

humana.<br />

Sobre a inspiração de Aloísio Magalhães e a execução de<br />

Lélia Coelho Frota, presidente do Instituto do Folclore,<br />

foram planejadas várias homenagens a Chico Antônio<br />

como um Seminário realizado em Natal com professores<br />

do Rio Grande do Norte e de outros estados; a publicação<br />

de um tablóide denominado “Estrada Nova”, para<br />

distribuição nas escolas do RN, particularmente em Pedro<br />

Velho e um “long-play” com os cocos de Chico Antônio.<br />

Não fi caram aí porém, nesses atos ofi ciais, as homenagens<br />

prestadas a Chico Antônio.<br />

Rolando Boldrin apresentou-o no programa “Som<br />

Brasil” da TV Globo, apresentação antecedida de uma<br />

entrevista coletiva com os maiores jornais de São Paulo,<br />

“Estadão”, “Folha”, “Globo” (sucursal), e outros mais. A<br />

apresentação no “Som Brasil” foi um sucesso. O público<br />

o aplaudiu de pé.<br />

Eduardo Escorel, conhecido cineasta brasileiro, através de<br />

um projeto da FUNARTE, produziu um vídeo “Chico<br />

Antônio, o herói com caráter”, que ganhou o prêmio, em<br />

festival de cinema.<br />

Outro vídeo sobre Chico Antônio foi produzido por<br />

Carlos Lira, diretor da TVU, dentro do projeto ”Memória<br />

Viva”.<br />

Infelizmente não foram de glórias os últimos anos de vida<br />

de Chico Antônio.<br />

Logo depois de sua redescoberta, o autor deste artigo<br />

conseguiu com o governo estadual uma pensão especial<br />

de três Salários Mínimos, para o embolador. Familiares<br />

seus, movidos pela cobiça seqüestraram o cantador e o<br />

mantiveram em cárcere privado até o seu falecimento, no<br />

dia 15 de outubro de 1993, na cidade de Canguaretama.<br />

De nada adiantaram os nossos apelos às autoridades do<br />

executivo e do judiciário do município.<br />

Chico Antônio morreu como outros grandes artistas<br />

da cultura popular do Rio Grande do Norte, como<br />

Zé Relampo, Manuel Marinheiro, Joaquim Cardoso,<br />

Antônio Gordo. Ingloriamente.

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