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Onofre Lopes Júnior - Fundação Jose Augusto

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A b a n d o n o s<br />

Como saber de onde tinha vindo aquele ser? Não havia<br />

nenhuma grávida, nas redondezas, esperando para<br />

aquela época. Até que uma patroa desconfi ou de sua<br />

empregadinha que há meses sofria de barriga d’água.<br />

E assim o mistério foi desfeito. O crime revelado. A<br />

criança era fruto do mais original pecado, ocorrido entre<br />

um patrão português e uma infeliz empregada. Caso<br />

encerrado: a infratora sem opção caiu na vida fácil ou,<br />

quem sabe, morreu acidentalmente? Este é o boato que<br />

circula pelas calçadas. E a prova do crime (a enjeitada)<br />

foi criada no abandono. Este episódio serviu para ensinar<br />

às “ moças donzelas” que este era o castigo imposto às<br />

“transgressoras” das normas de uma sociedade hipócrita<br />

e fétida.<br />

Foi assim que iniciou a história da nossa Severina, aliás,<br />

Conceição.<br />

Conceição foi o seu nome<br />

Não teve outro de pia.<br />

Conceição fi lha bastarda<br />

Do português com a empregada.<br />

Como havia muitas fi lhas bastardas<br />

De portugueses com empregadas<br />

Ela fi cou sendo chamada<br />

Conceição fi lha bastarda do português<br />

Com a <strong>Jose</strong>fa talvez fi nada<br />

Vulgo “safada”<br />

Lá de Santa Cruz<br />

Limites de Tangará<br />

Interior do Rio Grande do Norte.<br />

Como batata nasce na terra e como vive cachorro viralata,<br />

da mesma forma nasceu e cresceu a Conceição<br />

fi lha bastarda. Ela sequer desconfi ava que era infeliz.<br />

Isso porque acreditava. Em quê? Que sua mãe estava<br />

viva e que viria buscá-la, num cavalo branco, em plena<br />

madrugada. Isso lhe dava às vezes estado de graça. Nunca<br />

perdera a fé. Ela pensava que a pessoa era obrigada a ser<br />

feliz. Então era. Assim passou sua vida representando com<br />

obediência o papel de ser. Até que um dia, após o almoço,<br />

estava balançando-se numa cadeira,<br />

para cá... ... ... ...<br />

para cá... ... ... ...<br />

para lá... ... ... ...<br />

para lá... ... ... ...<br />

repentinamente uma voz sussurrou-lhe nos ouvidos:<br />

- Encontraram tua mãe! Ela está moribunda no abrigo<br />

de velhos Juvino Barreto e deseja te conhecer. Ela<br />

correu desesperada, num momento de ímpeto, alegria<br />

e ansiedade. Correu em busca de seu destino, sua sina...<br />

no meio do caminho tinha uma pedra. Caiu. Acordou<br />

atordoada: cadeira... chão... Conceição!!!... Lembrou-se<br />

do abandono dos pais... da infância perdida... dos fi lhos<br />

ingratos que tivera... das traições e abandono do marido...<br />

das discriminações sofridas... Uma lágrima rolou de sua<br />

face envelhecida. Nesse momento, tomou consciência<br />

de que em sua SÓ/LIDA/IDADE, desconhecia a<br />

solidariedade. E que a sua fi el companheira sempre fora<br />

a SOLIDÃO.<br />

Julho 2004<br />

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