Onofre Lopes Júnior - Fundação Jose Augusto
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Sítio Novo - A arte que brota entre as serras<br />
Rabeca leva “surra” de seu Nezinho<br />
“Quero dá logo uma ‘surra’ na rabeca para esquentar o<br />
couro, depois a gente conversa”. A frase do rabequeiro<br />
Manoel Justino Sobrinho, 74 anos, o Nezinho, foi mais<br />
do que um aviso. Homem de pouca conversa, ele gosta<br />
mesmo é de tirar um som de sua rabeca feita de madeira<br />
e chifre de boi. Toca desde criança e continua morando<br />
no Sítio Saquinho, no alto da Serra da Tapuia, local<br />
apropriado para reunir os amigos e fazer um forró com<br />
rabeca, sanfona, triângulo e pandeiro.<br />
Eram pouco mais de oito horas da manhã quando<br />
Nezinho chegou à casa da fi lha Maria Justino, local da<br />
entrevista, carregando sua rabeca enrolada num pedaço<br />
de pano. Veio caminhando pela estrada de barro e chegou<br />
sem aparentar cansaço. Mal sentou, já colocou a rabeca<br />
para tocar.<br />
A apresentação, improvisada na sala da casa da fi lha,<br />
começou com o choro clássico “Tico-Tico no Fubá”.<br />
Depois, tocou “Brasileirinho” e o hino do ABC Futebol<br />
Clube para, fi nalmente, dizer que a rabeca já estava no<br />
ponto e que podíamos iniciar a conversa. “Em 56 já fazia<br />
viagem pelo Agreste, toquei por todo canto neste meio de<br />
mundo...”, comentou.<br />
Nezinho ganhou sua primeira rabeca ao completar oito<br />
anos de idade. José Justino, o Deca, irmão mais velho, foi<br />
o responsável em ensinar o caçula a manusear a rabeca. Os<br />
ensinamentos do irmão foram além do esperado e a rabeca<br />
foi passando de brincadeira de criança a instrumento de<br />
profi ssão.<br />
78 Julho 2004<br />
A infância e juventude do rabequeiro foram marcadas<br />
pelas apresentações do João Redondo {mamulengo} e boide-reis,<br />
comuns naquela época por toda a região Agreste.<br />
Tão populares e tão bonitas que Nezinho sente saudade e<br />
fi ca feliz ao recordar. “O João Redondo do ‘véio’ Antônio<br />
Fernandes parecia um cinema de tão bonito”.<br />
O rabequeiro tem seis fi lhos. “Tive pouco”, diz. Não<br />
são poucos os membros da família que fazem da música<br />
um meio de vida ou tocam por prazer. O fi lho José<br />
Justino, conhecido como o sanfoneiro Zé de Nezinho, e<br />
o neto Iranilson de Moura Justino, 16 anos, pandeirista,<br />
acompanham Nezinho nas apresentações. O primo João<br />
Anjo, morador do Sítio Tanquinho em Santa Cruz,<br />
também toca rabeca.<br />
As últimas apresentações foram animando o Boi-de-reis<br />
de São Tomé, município vizinho a Sítio Novo, e durante<br />
o Festival da Cultura no ano passado. Nezinho puxa a<br />
memória e lembra que as manifestações folclóricas já<br />
foram mais comuns, mas acredita que a cultura popular<br />
tende a sobreviver apoiada por eventos como o Festival da<br />
Cultural local.<br />
O rabequeiro Nezinho, homem simples e sem formação<br />
musical, faz parte de uma linhagem de músicos em<br />
extinção. Passou toda a vida trabalhando no roçado e<br />
viveu o auge das plantações de algodão em Sítio Novo.<br />
“Naquela época, trabalhar com algodão era melhor do<br />
que ter aposento. Apanhei muito algodão. Teve dia de<br />
apanhar 148 arrobas”.