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Onofre Lopes Júnior - Fundação Jose Augusto

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Cefet), onde concluiu o curso de mineração. Zé Aruanã,<br />

estrela do atletismo da escola, brincou com o colega que<br />

gostava de correr nas provas de 3 mil metros, mas que,<br />

bem sabia, tocava violão para a turma nos intervalos de<br />

aula:<br />

- Se tem Bob Dylan, se tem Bob Marley, tem também<br />

Bob William!<br />

Foi assim que ele fi cou conhecido como Bob. Mais tarde,<br />

porém, outros dois amigos, Fernando Mineiro (deputado<br />

estadual) e Roberto Hugo (professor de matemática),<br />

passaram a lhe chamar pelo nome com o qual viria assinar<br />

seus quadros e ser reconhecido como um dos mais ativos<br />

e talentosos artistas da cidade. Foi ainda na ETFRN<br />

que recebeu, quase por acaso, um valoroso incentivo. O<br />

professor de inglês Thomé Filgueira surpreendeu o aluno<br />

desenhando a caricatura de Mick Jagger, o famoso astro do<br />

rock. Ao invés da censura, o elogio. “Muito bom”, exaltou<br />

o professor, hoje considerado uma das grandes expressões<br />

da pintura impressionista potiguar. “Apareça amanhã no<br />

ateliê”, recomendou. Ele foi, sim, e acabou pertencendo<br />

a uma geração que fez jus ao ateliê da escola. Entre os<br />

anos de 1976/78, por lá também estiveram Carlos Sérgio<br />

Borges, Júlio César Revoredo e João Natal.<br />

Os caminhos trilhados ainda com certa timidez o levaram<br />

a encontrar confi ança para os passos que daria em seguida.<br />

Em março de 1980, aos 22 anos, tomou a decisão que<br />

deixou toda família apreensiva. Pediu demissão do<br />

IBDF (atual Ibama), onde entrou por concurso público,<br />

tendo se classifi cado em primeiro lugar, para militar<br />

exclusivamente no meio artístico. Ele até que gostava do<br />

que fazia no serviço público federal, onde, por mais de<br />

dois anos, exerceu a função de auxiliar agropecuário. Na<br />

prática, reproduzia mudas nos viveiros do Instituto. Mas<br />

achava que os chefes tinham mentalidade retrógrada. Era<br />

demais para ele!<br />

- Estou honrado em conseguir esta façanha neste elefante<br />

sem memória que é o Rio Grande do Norte -, afi rma<br />

Marcelus Bob, referindo-se ao fato de viver para a arte e<br />

da arte durante duas décadas e meia.<br />

Antes de explicar melhor o que quis dizer acima, um<br />

parênteses. A expressão “elefante branco sem memória”,<br />

segundo Marcelus Bob, foi cunhada pelo poeta Carlos<br />

Gurgel numa das muitas tertúlias que compartilharam. A<br />

façanha que deixa o artista honrado, contudo, é a de não<br />

ter tido outro ganha-pão, durante todos estes anos, senão<br />

aquele que conquista, dia após dia, com a criatividade<br />

com que manuseia pincel, óleo, esmalte sintético, acrílico<br />

e tudo o mais que pode servir de tinta e deixar marcas na<br />

tela, como café e remédio, produtos com os quais já fez<br />

trabalhos experimentais.<br />

- Nunca mais minha carteira foi assinada; nem sei por<br />

onde ela anda.<br />

Arte irreverente e perigosa<br />

Marcelus Bob é um legítimo exemplar remanescente da<br />

contracultura, coisa cada vez mais rara hoje em dia. Gosta<br />

de chocar com o comportamento irreverente e o estilo<br />

agressivo com que se apresenta até nos salões ofi ciais.<br />

Além das aparências, contudo, temos a impressão de estar<br />

diante de uma pessoa sensível e gentil com seu semelhante.<br />

Nosso primeiro encontro foi na Pinacoteca do Estado,<br />

abrigada no antigo Palácio do Governo, na Praça dos Três<br />

Poderes, centro da cidade. Conversamos por quase duas<br />

horas, à sombra das árvores frondosas do pátio externo do<br />

prédio. O artista usava camiseta sem mangas, pintada por<br />

ele mesmo, calça preta justa e desbotada, bolsa de pano<br />

a tiracolo, um par de chinelos “japonês” brancos e um<br />

colar de sementes nativas no pescoço. Os cabelos longos<br />

e ondulados estavam espalhafatosamente voando sobre<br />

o rosto, no qual repousava um óculos escuro sobre os<br />

olhos que estampavam o rescaldo das estripulias da noite<br />

anterior.<br />

Julho 2004<br />

9

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