01.06.2014 Views

animais são muito mais que algo somente - Proppi - UFF

animais são muito mais que algo somente - Proppi - UFF

animais são muito mais que algo somente - Proppi - UFF

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

da casa. Como essa jovem não era casada e chegou à aldeia quando estava por volta do<br />

quarto mês de gravidez, a brincadeira <strong>que</strong> <strong>mais</strong> aconteceu nos dias <strong>que</strong> se seguiram foi<br />

alguém chegar até um outro homem e perguntar: “reja’uma pa tanhembu?” (você tomou<br />

banho com cinzas?).<br />

A despeito das brincadeiras, esse parece ser o primeiro cuidado <strong>que</strong> o pai deve<br />

observar após o nascimento de um filho. Não se trata de uma medida profilática para a<br />

criança, mas para ele próprio; o risco a <strong>que</strong> está exposto é o –jepota. O início da<br />

paternidade instaura o pai neste estado perigoso, durante algum tempo estará em resguardo,<br />

o <strong>que</strong> em Guarani é dito aku (<strong>que</strong>nte). Conforme notou Schaden (1962: 85) “aku é o estado<br />

do pai e da mãe, nos primeiros dias após o nascimento da criança”, estado esse <strong>que</strong> sujeita<br />

a pessoa a perigo de encantamento sexual por espécies outras.<br />

Entre vários povos das terras baixas sul-americanas o nascimento de uma criança é<br />

uma ocasião cercada de cuidados, ora em direção ao ser <strong>que</strong> emerge do útero e <strong>que</strong>, como<br />

observou Gow (1997), não se trata necessariamente de um ser humano. Ora em direção aos<br />

pais – entre os Guayaki, Clastres ([1972] 1995) demonstra o quanto é ambígua a situação<br />

de um homem cuja esposa acaba de parir, instaurado num estado liminar entre a natureza e<br />

a cultura, definido como bayja.<br />

Até a <strong>que</strong>da do umbigo a mãe não se afasta da criança. Ambas permanecem a maior<br />

parte do tempo deitadas e uma série de atividades estão proibidas à mãe. Ela não deve<br />

tomar banho, não deve realizar nenhum trabalho doméstico e nem mesmo cozinhar. O<br />

afastamento da cozinha estende-se por um período maior, <strong>que</strong> normalmente as pessoas<br />

dizem durar trinta dias.<br />

Certo dia enquanto caminhavamos pela praia de Parati-Mirim, Isa<strong>que</strong> se recusou a<br />

mergulhar no mar, alegando <strong>que</strong> havia menos de um mês <strong>que</strong> seu filho havia nascido;<br />

sendo assim, ele não poderia tomar banho de mar, nem de cachoeira. Além de não ser<br />

próprio fre<strong>que</strong>ntar tais lugares, o pai não deve se afastar <strong>muito</strong> da casa, pois é possível <strong>que</strong><br />

o nhe’ë da criança ao acompanhar o pai se perca pelos caminhos. Durante um certo período<br />

também não deverá trabalhar com instrumentos cortantes; estes poderiam fazer com <strong>que</strong> se<br />

abrisse novamente o umbigo da criança. O <strong>que</strong> Lima (2005) tratou como teoria da ação<br />

humana, para os Yudjá, parece ser aplicável aos Mbya: nenhum esforço <strong>que</strong> a criança não<br />

suporte deve o pai fazer, a alma da criança imita as ações do pai, contudo sem poder<br />

suportar as consequências de tais ações.<br />

96

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!