01.06.2014 Views

animais são muito mais que algo somente - Proppi - UFF

animais são muito mais que algo somente - Proppi - UFF

animais são muito mais que algo somente - Proppi - UFF

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

2.2 – ENTRE OUTROS<br />

Como outros povos ameríndios, para os Mbya o universo é povoado por outras<br />

categorias de seres <strong>que</strong> se tomam como gente. No entanto, duas são <strong>mais</strong> recorrentes: os<br />

mortos e os <strong>ani<strong>mais</strong></strong>. Ambas são categorias potencialmente atuantes <strong>que</strong> a todo instante<br />

buscam formas de interagir com as pessoas vivas. Dos mortos é possível dizer <strong>que</strong> o façam<br />

durante o período da noite, seja tentando influenciar as atitudes de pessoas <strong>que</strong> transitam<br />

neste período, seja durante o sono: o sonho é a via privilegiada para se comunicarem com<br />

os vivos, dialogando, comendo ou praticando atos sexuais com estes. Os vivos nunca<br />

procuram qual<strong>que</strong>r tipo de relação com um morto, <strong>que</strong> deve ser es<strong>que</strong>cido tão logo caia a<br />

primeira chuva após o seu sepultamento.<br />

Quanto aos <strong>ani<strong>mais</strong></strong>, vimos <strong>mais</strong> acima <strong>que</strong> há certos períodos em <strong>que</strong> as pessoas<br />

estão <strong>mais</strong> sujeitas a serem subjetivadas por eles <strong>que</strong>, travestidos em belos homens ou<br />

belas mulheres, tentam seduzir pessoas <strong>que</strong> entraram na puberdade ou os homens <strong>que</strong> se<br />

encontram na couvade. Mas as relações com os <strong>ani<strong>mais</strong></strong> perpassam um universo <strong>mais</strong><br />

amplo. Mostrarei nas páginas <strong>que</strong> se seguem como é perigoso não estar atento às ações<br />

dessas espécies de seres e <strong>que</strong> as pessoas enganadas terminam por ir residir com eles.<br />

2.2.1 A morte, os mortos e os <strong>ani<strong>mais</strong></strong><br />

Quando saí de Araponga, quis fazer uma pausa de uma semana para analisar parte<br />

dos dados de campo <strong>que</strong> eu tinha até então reunido. Decidi ficar numa pousada na cidade<br />

de Parati, onde recebia a visita de alguns mbya para trabalhos de transcrição e análise do<br />

material fonográfico. Numa dessas ocasiões, um rapaz conhecido como Tiro, <strong>que</strong> olhava<br />

algumas fotos no notebook, disse <strong>que</strong> não gostava de tirar fotos, <strong>somente</strong> quando era<br />

necessário ele tirava, mas à-toa ele não o fazia. Seu falecido pai já lhe ensinara assim.<br />

Outro rapaz, Anguja, colocou-se como partidário de sua opinião.<br />

Sem entender <strong>muito</strong> bem, ao mesmo tempo em <strong>que</strong> achava no mínimo estranho<br />

essa recusa, quis especular sobre suas razões.<br />

“É <strong>que</strong> jurua é diferente, respondeu Tiro; os índios, quando morre alguém, não gostam<br />

de ficar lembrando, vocês não, já ficam sempre olhando, lembrando. A gente não,<br />

quando morre alguém, a gente pega as coisas da pessoa e coloca junto com ela dentro<br />

do caixão, não fica nada, a gente não fica lembrando”.<br />

98

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!