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O Coruja - Unama

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www.nead.unama.br<br />

— Um peralta que abandonou os estudos, que não arranjou meios de vida,<br />

um pobre diabo! Ainda vem para aqui com soberbas... Bata a outra porta, se quiser:<br />

comigo não se arranjará! Ah! Eu logo vi que semelhante educação havia de dar nisto<br />

mesmo!<br />

Entretanto Teobaldo sofria e sofria muito. Só quem já atravessou uma boa<br />

quadra de necessidade, quando se tem o estômago mal confortado e o coração<br />

cheio de orgulho, poderá julgar do desgosto profundo e do tédio homicida que o<br />

acompanhavam.<br />

Maldita educação! Maldito temperamento! Compreender o seu estado e não<br />

poder reagir contra ele; sentir escorregar-se para o abismo e não conseguir suster a<br />

queda; haverá maior desgraça e mais dolorosa tortura<br />

A surda aflição que lhe punha no espírito a sua falta de recursos, a força de<br />

reproduzir-se, havia já se convertido em estado patológico, numa espécie de<br />

enfermidade nervosa, que o trazia sempre desinquieto e lhe dera o hábito de levantar<br />

de vez em quando o canto do lábio superior com um certo trejeito de impaciência.<br />

Orgulhoso como era, a ninguém, a nenhum amigo, exceção feita do <strong>Coruja</strong>,<br />

confessava as suas necessidades e este fato ainda mais as agravava.<br />

E quando em tais ocasiões lhe pediam dinheiro emprestado Oh! Não se<br />

pode imaginar que suplício para Teobaldo!<br />

Principiava por lhe faltar a coragem de confessar que não o tinha; e, se o do<br />

pedido insistia, começava ele a arranjar pretextos, a remanchear, a prometer para daí<br />

a pouco, a mentir, como um caloteiro que deseja engodar um credor impertinente.<br />

E, se o sujeito não desistia, Teobaldo dizia-lhe que esperasse um instante e<br />

corria a empenhar o relógio, a arranjar dinheiro fosse lá como fosse, contanto que<br />

não tivesse de confessar a sua miséria a outro necessitado.<br />

Estes sacrifícios eram tanto mais rigorosamente cumpridos, quanto menos<br />

seu amigo era o sujeito que lhe fazia o pedido; não representavam desejo de servir,<br />

mas pura e simples manifestação de vaidade.<br />

Quando, porém, o pedinchão lhe era de todo desconhecido, Teobaldo<br />

preferia passar por mau e respondia-lhe com a lógica de um sovina, e aos mendigos<br />

negava a esmola rindo, fingindo não acreditar nas lágrimas de fome que muita vez<br />

lhes saltavam dos olhos.<br />

CAPÍTULO XIV<br />

Voltou a casa às horas de jantar, e mais aborrecido do que nunca. Para isto<br />

contribuía em grande parte a insociável catadura com que o tio recebeu.<br />

Ao entrar na alcova soltou uma exclamação:<br />

— Pois a senhora ainda está aí Perguntou ao dar com Ernestina estendida<br />

na cama. — Ora esta!<br />

— Você é um malvado! Respondeu ela com dificuldade, por causa de uma<br />

formidável rouquidão. Você é um judeu!<br />

— Está incomodada<br />

A teimosa meneou a cabeça afirmativamente e explicou, mais por mímica do<br />

que por palavras, que aquela sua ida à janela a pusera naquele estado.<br />

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