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O Coruja - Unama

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www.nead.unama.br<br />

posição a que chegara, sua vida fora uma série de conquistas fáceis, uma<br />

interminável cadeia de bons acasos.<br />

Mas agora justamente que mais nada lhe faltava a conquistar; agora que ele,<br />

dispondo ainda de uns restos de mocidade para ser amado como homem, era já<br />

celebrizado como medalhão; agora que ele possuía tudo; agora que todas as<br />

classes do seu país haviam já lhe tributado a melhor parte do seu entusiasmo; agora<br />

é que ele se sentia menos satisfeito, porque, à medida que se alargavam os<br />

horizontes da sua ambição tanto mais a consciência da sua mediocridade o<br />

estreitava em um terrível círculo de inconsoláveis desgostos.<br />

Pouco a pouco foi-se tornando invejoso. Afinal já não podia ouvir falar dos<br />

homens verdadeiramente grandes, sem ficar com o coração apertado por um punho<br />

de ferro que o estrangulava. As grandes e legitimas reputações, os nomes universais,<br />

fossem de artistas, de poetas, de descobridores, de filósofos ou de guerreiros, o<br />

irritavam acerbamente e enchiam-no de um ódio surdo, inconfessável e assassino.<br />

Principalmente ao voltar dos seus relativos triunfos, quando no círculo<br />

mesquinho das suas glórias ouvia o próprio nome aclamado e coberto de ovações, é<br />

que mais desabrida lhe roncavam por dentro a dor da inveja e a consciência da sua<br />

incapacidade.<br />

— Oh antes nunca chegasse a ser nada, nem tivesse pensado em ser<br />

alguma coisa!<br />

Ser tão pouco, quando tanto se ambiciona; ambicionar tanto e ter certeza de<br />

nunca ir além da própria pequenez, é muito mais doloroso, é muito mais cruel do<br />

que ficar eternamente sucumbido ao peso da primeira desilusão!<br />

Era isto que agora o fazia mau de todo; era isto o que agora o tornava infeliz,<br />

desconsolado e triste.<br />

Nunca houvera penetrado dentro de si mesmo e, quando, graças à<br />

franqueza da esposa, o fizera pela primeira vez, achou-se tão vazio e tão ridículo<br />

aos próprios olhos, achou-se tão de gesso, que sentiu ímpetos de reduzir-se a pó.<br />

E, com o correr de mais algum tempo e com a percepção da sua<br />

inferioridade, veio-lhe o tédio, o desprezo próprio, a grande moléstia dos que sobem<br />

na convicção e sem causa; veio-lhe o desfalecimento dos que vencem sem ter<br />

lutado, dos que olham para trás e não encontram no passado sequer uma boa<br />

recordação, à sombra da qual repousem o espírito fatigado e o coração desiludido;<br />

veio-lhe o fastio e o cansaço dos que nunca amaram, dos que nunca sofreram nem<br />

se sacrificaram por ninguém; veio-lhe enfim o desespero dos egoístas, o desespero<br />

dos que se vêem isolados no meio do público que os aclama vitoriosos, mas que,<br />

está pronto a virar-lhes as costas logo que o menor interesse particular chama a sua<br />

atenção para outro lado.<br />

E, da mesma forma que o <strong>Coruja</strong> sentia-se cansado de ser tão bom, tão dos<br />

outros e precisava cometer uma ação má para repousar; assim Teobaldo,<br />

reconhecendo o seu egoísmo e a sua indiferença pelos que o amaram, desejou pela<br />

primeira vez em sua vida praticar o bem.<br />

Mas, se àquele era impossível cometer uma ação má, a este não seria mais<br />

fácil praticar um rasgo de abnegação e de heroísmo.<br />

Os extremos encontraram-se de novo; as duas criaturas, que o isolamento<br />

unira no colégio, fugiam agora dos homens, homens tão caprichosos, tão ruins e tão<br />

pequenos como os seus condiscípulos de outrora.<br />

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