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O Coruja - Unama

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www.nead.unama.br<br />

E, depois de sacudir os braços e repelir do pulmão o ar alcoolizado:<br />

— Caramba! Quero saber se tenho de dar contas de meus atos a safardana<br />

algum desta vida!<br />

— Pois então não se casasse!... Arriscava Inês.<br />

— Ah! Se eu pudesse adivinhar, decerto! Antes de tudo a minha liberdade!<br />

Agora já nem com o que eu ganho posso contar!<br />

— Quem o ouvisse havia de supor que lhe custamos muita coisa! Olha a<br />

graça! Depois do tal casamento é preciso puxar aqui muito mais pela agulha e pelo<br />

ferro de engomar!<br />

— Ó raio de uma fúria! Berrava afinal o Picuinha, se não calas essa boca do<br />

diabo, racho-te de meio a meio!<br />

— Também é só para que você presta, casta de um bêbado!<br />

— É! O <strong>Coruja</strong> havia de prestar para muito mais!<br />

— E talvez que sim!<br />

— Bem, mas basta! Estou farto! Arre!<br />

D. Margarida em geral só se metia nestas polêmicas de Inês e Picuinha,<br />

quando a contenda chegava ao auge, e então é que era barulho!<br />

Quase sempre terminava o banzé com a intervenção dos vizinhos, muita vez<br />

com a da Policia.<br />

O alferes, porém, longe de tomar caminho, ficava pior de dia para dia.<br />

As duas senhoras já não conseguiam apanhar-lhe dinheiro, senão tirandolho<br />

à força das algibeiras, e isso mesmo quando sobrava algum da pândega.<br />

E que não lhe apresentassem na manhã seguinte a calça engomada e a<br />

camisa limpa, que haviam de ver o bom e o bonito!<br />

— Ah! Dizia a velha, aquele malvado, cortado em pedacinhos e posto em<br />

salmoura, ainda não pagava a metade do mal que nos tem feito!<br />

Este malvado, a quem ela se referia, não era o alferes, era o <strong>Coruja</strong>.<br />

Uma ocasião, entretanto, depois de uma tremenda carraspana, o alferes foi<br />

acometido por um violento ataque de nervos e viu-se obrigado a guardar a cama<br />

durante uma semana inteira; apareceram-lhe perturbações cardíacas e ligeiros<br />

sintomas de amolecimento cerebral.<br />

O médico declarou que isso tudo era efeito do álcool, e proibiu ao doente<br />

que bebesse, que fumasse, e recomendou-lhe que tivesse toda a regularidade na<br />

comida, sem o que se arriscava a ficar perdido para sempre.<br />

Picuinha ficou muito impressionado com o que ouviu do médico, e parecia<br />

seriamente resolvido a mudar de vida.<br />

Principiou arranjando mês e meio de licença e durante este tempo<br />

submeteu-se ao mais rigoroso tratamento; logo, porém, que se achou com a saúde<br />

mais garantida, foi aos poucos recaindo nos seus antigos hábitos; e então, de cada<br />

bebedeira que apanhava, era--lhe preciso ficar em casa dois, três dias, prostrado,<br />

muito irascível, muito nervoso, a beber caldos, sem poder suportar no estômago um<br />

bocado de pão.<br />

Por estas crises tornava-se tão insuportável à mulher e à sogra, que as duas<br />

já pediam a Deus que o levasse por uma vez.<br />

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