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O Coruja - Unama

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www.nead.unama.br<br />

E as bebedeiras repetiam-se. Então no dia do recebimento do ordenado a<br />

coisa era feia; nesse dia escondia-se a louça e preparava-se a casa para o infalível<br />

chinfrim.<br />

Mas agora o borracho, receoso já de que as duas mulheres lhe dessem<br />

busca às algibeiras, como costumavam fazer, escondia o dinheiro em lugares os<br />

mais extravagantes que se podem imaginar; escondia-o dentro da meia, escondia-o<br />

no forro da farda e às vezes debaixo dos sovacos.<br />

E, logo que a mulher ou a sogra, depois de uma terrível luta com o alferes,<br />

conseguiam descobrir e arrancar-lhe o dinheiro, o homem ficava possesso.<br />

— Ladras! Berrava ele quase sem abrir os olhos! Ladras! Não posso ter um<br />

vintém que não mo roubem!<br />

O Picuinha afinal caiu nesse estado mórbido das pessoas inutilizadas pela<br />

bebida e do qual, como os trabalhadores das minas de mercúrio, só conseguem<br />

fugir por instantes refugiando-se no próprio veneno que os corrompe e mata.<br />

Acordava muito mole, com um pigarro convulso, que só deixava depois que<br />

ele vomitasse a sua pituíta dos ébrios; e pela manhã tinha sempre o corpo dorido, a<br />

salivação grossa e amarga, os intestinos em brasa, os olhos ardendo e<br />

lacrimejando; mas, era só beber um trago de parati, e ficava logo esperto.<br />

Também, agora não precisava de mais para aprontar-se; uma dose pela<br />

manhã, antes de entrar no serviço; outra à tarde, ao deixá-lo, e ninguém o via senão<br />

ébrio.<br />

Os superiores começaram, pois, a repreendê-lo com mais freqüência e já o<br />

ameaçavam com uma queixa ao chefe; na repartição diziam todos que, se ele há<br />

muito não estava na rua, era simplesmente porque o comandante tinha pena de<br />

deixar aos paus um pobre diabo com a mulher e filhos.<br />

Não obstante, depois de mais algumas crises como a que o tomou pela<br />

primeira vez, o Picuinha ficou irremediavelmente perdido e incapaz de todo e<br />

qualquer serviço. Estava até meio idiota e o corpo tremia-lhe todo como o de um<br />

velho de cem anos.<br />

CAPÍTULO XXI<br />

— Uma desgraça nunca vem só! Sonsiderou D. Margarida, pois que<br />

justamente quando o genro se inutilizava para ganhar o pouco que até aí ganhava,<br />

era ela acometida por uma carga de reumatismo. e tão forte, que não lhe permitia<br />

servir-se dos braços, nem das pernas.<br />

O <strong>Coruja</strong>, sabendo disto, foi visitá-la incontinente.<br />

— Ah! É você... Resmungou a velha, ao ver entrar no quarto a<br />

entristecedora figura de André.<br />

Inês escondeu-se para não lhe aparecer.<br />

Ele estava muito acabado e abatido; parecia mais velho, ainda no seu andar<br />

de coxo.<br />

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