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O Coruja - Unama

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www.nead.unama.br<br />

<strong>Coruja</strong>, fácil como era para se escravizar aos hábitos, no fim de algum<br />

tempo já não podia passar sem aqueles calmos serões à luz do velho candeeiro de<br />

D. Margarida; já não podia dispensar a xicarazinha de café, que ele ouvia moer no<br />

pilão, no quintal; e precisava sentir ao seu lado, durante aquelas horas certas, o<br />

vulto passivo e silencioso de Inês.<br />

Seu coração imaculado e casto foi pouco a pouco se deixando vencer por<br />

um sentimento até aí desconhecido para ele.<br />

Era um amor muito transparente, muito calmo, que esperava com evangélica<br />

paciência o dia da ventura, sem a mais ligeira perturbação dos sentidos.<br />

CAPÍTULO V<br />

CAPÍTULO V<br />

Desde que André se mudou para o colégio, a casa de Teobaldo foi aos<br />

poucos perdendo o seu digno aspecto de asseio e de ordem, até se transformar em<br />

verdadeira república de estudantes.<br />

A Ernestina ficou pasma.<br />

— Como este rapaz tem mudado!... Exclamava ela a cada instante, sem<br />

atribuir sequer ao outro, ao feio, a alma da primitiva limpeza e do primitivo arranjo,<br />

que tanto a maravilharam.<br />

Agora, Teobaldo já não tinha, como dantes, certo escrúpulo em conservar a<br />

casa decente. Os seus companheiros da pândega, que lhe pareciam com mais<br />

freqüência, já não lhe ouviam dizer em certas ocasiões: "Não; não façam isso, para<br />

não afligir o <strong>Coruja</strong>! Ele não gosta destas brincadeiras!..."<br />

Ernestina suportava-lhe as estouvices porque não tinha outro remédio:<br />

adorava-o cada vez mais; sofria em vê-lo tão extravagante, tão sem correção e sem<br />

,juízo, mas sofreria ainda pior se não o pudesse ver absolutamente.<br />

Enquanto a não abandonara a esperança de conquistá-lo, empregou para<br />

isso todos os recursos de sua ternura; depois, certa de que nada conseguiria,<br />

resignou-se às migalhas do amor que ele lhe atirava de vez em quando, como para<br />

a esfaimar ainda mais.<br />

A infeliz já se não queixava e já nem sequer procurava disfarçar o seu<br />

cativeiro; entretanto, um dia em que lhe apareceu na porta uma mulher alta, bonita,<br />

vestida com um certo exagero de moda, a perguntar muito desembaraçada se era ali<br />

que morava Teobaldo, ela disparatou:<br />

— Pois até mulheres já queriam entrar também na patuscada Era só o que<br />

faltava!<br />

E, fechando-lhe a porta no nariz:<br />

— Procure-o na rua, se quiser!<br />

Depois, meteu-se no quarto e pôs-se a chorar, como uma desesperada.<br />

Às três horas, quando Teobaldo chegou de fora, ela foi-lhe ao encontro e,<br />

mais branca do que a cal da parede, os beiços trêmulos, as feições estranguladas<br />

de ciúme, disse-lhe quase sem poder falar:<br />

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