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CAPÍTULO XV<br />
Aguiar, depois que emprestara os seis contos de reis a Teobaldo, deixava<br />
transparecer muito mais claramente aos olhos da prima as suas intenções a respeito<br />
desta; Branca fingia não dar por isso, mas, de si para si, tomava as suas cautelas<br />
contra o sedutor.<br />
Não lhe convinha entretanto denunciá-lo ao marido, não só porque bem<br />
poucas vezes entrava em conversa íntima com este, como porque, conhecendo o<br />
gênio irrefletido de Teobaldo, temia, em lhe dizendo tudo, armar algum escândalo<br />
mais perigoso e lamentável do que o próprio objeto que o promovia.<br />
Uma ocasião, porém, o primo chegou-lhe a falar com tamanha insistência e<br />
com tamanha clareza, que ela instintivamente ergueu-se da cadeira em que estava e<br />
mediu-o de alto a baixo.<br />
— Por que me trata desse modo... Perguntou o Aguiar, abaixando os olhos<br />
e afetando tristeza.<br />
— Porque o senhor assim o merece, respondeu ela imperturbavelmente.<br />
— E terei eu culpa de amá-la tanto...<br />
— Proíbo-o de repetir semelhante frase, ou ver-me-ei obrigada a tomar<br />
medidas mais sérias a este respeito. E, por enquanto, não lhe posso prestar<br />
atenção. Com licença.<br />
— Branca! Ouça, peço-lhe que me ouça!<br />
— Enquanto não estiver disposto a se portar dignamente para comigo, farme-á<br />
o obséquio de não por os pés nesta casa.<br />
Dito isto, Branca se afastou tranqüilamente, como se viera de dar qualquer<br />
ordem a algum dos seus criados, e saiu da sala sem o menor gesto que traísse a<br />
sua indignação.<br />
Apesar disso, no entanto, ele não desistiu da sua empresa e, sem se dar por<br />
achado com as palavras da prima, continuou a freqüentar a casa, como se nada<br />
houvesse sucedido de extraordinário e apenas tratando de disfarçar o seu projeto de<br />
novos ataques.<br />
Um belo dia, três meses depois daquela cena, surpreendendo Branca no<br />
fundo de um caramanchão que havia na chácara, a ler distraída, tomou-a de<br />
improviso pela cintura e caiu-lhe aos pés, exclamando:<br />
— Perdoa, perdoa, se de tudo me esqueço e não resisto a este amor<br />
insensato que me consome.<br />
E ia ferrar-lhe um beijo na face, quando Branca, escapando-lhe das mãos,<br />
ligeira como um pássaro, lançou-lhe contra o rosto uma bofetada.<br />
Ele ergueu-se rubro de cólera e encarou-a de frente.<br />
— Rua! Fez ela, apontando-lhe a saída. Já!<br />
Ele não se mexeu.<br />
— Já! Não ouviu! Não quero que fique aqui nem mais um instante! Rua!<br />
— Enxota-me!<br />
— E, se não me quiser obedecer, juro-lhe que Teobaldo a isso o constrangerá!<br />
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