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O Coruja - Unama

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www.nead.unama.br<br />

Ele a porfiar e Branca a fingir que não o compreendia, desviando-se das<br />

garras do sedutor com a imperturbável calma de quem tem toda a confiança em si.<br />

Mas o demônio não desanimava, e, com quanto mais força a prima o repelia, tanto<br />

mais prontamente ele voltava aos pés dela, como o trapézio que o acrobata<br />

arremessa e logo torna na proporção do impulso recebido.<br />

E aquela constante repressão dos desejos o atormentava dia e noite; aquele<br />

amor enjaulado dentro dele, como uma fera, indo e vindo incessantemente, sem<br />

encontrar descanso, nem repousar um instante, deixava-o prostrado e cada vez<br />

mais sôfrego.<br />

Contudo, não desanimava: Ah! Ele tanto havia de lançar aos pés daquela<br />

estátua o fogo de sua paixão que o bronze acabaria derretendo-se.<br />

E Aguiar, seguro de que não a venceria só com a força do seu amor,<br />

começou a fingir-se desinteressado e generoso; com tal ciência que Branca foi aos<br />

poucos abrindo para ele uma excepção no terrível juízo que fazia dos homens,<br />

chegando até a arrepender-se de o ter julgado tão mal e transformando-o<br />

insensivelmente em amigo íntimo, a quem por último já confiava os segredos das<br />

suas mágoas e as queixas que tinha contra o marido. E o velhaco aproveitava com<br />

muito jeito tais regalias para denunciar as culpas e as fraquezas de Teobaldo, que<br />

por este próprio lhe eram reveladas.<br />

Branca o ouvia sempre com a mesma calma, imperturbável e altiva, os olhos<br />

meio cerrados, os lábios contraídos numa dura expressão de asco.<br />

— Ah! Mas não devemos condená-lo por isso... Dizia o traiçoeiro. — Nele,<br />

aquilo é uma questão de gênio!... Teobaldo nunca poderia dar um bom marido; nunca<br />

seria capaz de dedicar-se durante a vida inteira por qualquer pessoa, fosse esta, a<br />

mais adorável das criaturas. Todo ele é pouco para pensar em si mesmo; tudo que<br />

não for ele; tudo que não for a sua querida e respeitável individualidade, nenhum valor<br />

tem a seus olhos; tudo que não for ele, é público e faz parte do resto da humanidade,<br />

a quem, na sua louca pretensão, ele considera um simples complemento de sua<br />

pessoa. Então, na eterna febre de armar ao efeito e não desgostar seja lá a quem for,<br />

jamais tem franqueza para ninguém: se lhe pedem qualquer obséquio, ele nunca diz<br />

que não, promete sempre, ainda que um instante depois já nem se lembre de<br />

semelhante coisa; se uma mulher lhe lança um sorriso de provocação, ele responde<br />

com outro, ainda que a deteste; não tem amigos — Tem auditório; não tem amor —<br />

Tem amantes. É uma simples questão de vaidade, no sentido positivista da palavra.<br />

Ele, enquanto fala, não se dirige à pessoa com quem conversa, mas sim às que o<br />

observam de parte, só preocupando com o efeito que está produzindo sobre elas. E,<br />

como é na conversa, é em todos os atos de sua vida.<br />

Branca ficou muito surpreendida e perdeu por instantes a sua calma<br />

habitual, uma vez em que o primo lhe declarou que Teobaldo, antes da mulher do<br />

conselheiro, já tivera tido muitas outras amantes de igual espécie.<br />

— E depois dessa Perguntou ela.<br />

— Ora! Respondeu Aguiar, com um sorriso de quem perdoa. Hoje, em<br />

certas rodas aristocráticas, ser amante de Teobaldo é um indispensável atestado de<br />

bom-gosto; as senhoras da moda o adoram e cuidam dele como de um objeto de<br />

sua propriedade. O desgraçado não se pertence; não pode dar um passo sem ter de<br />

voltar-se para a direita e para a esquerda, sempre a fingir que ama, sempre a<br />

enganar. Para o que, diga-me, quais são as noites que ele passa aqui Depois que<br />

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