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O Coruja - Unama

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www.nead.unama.br<br />

Qual não foi, porém, a sua decepção, quando, levando trabalho a um jornal,<br />

ouvia essas palavras daqueles mesmos que dantes o elogiavam:<br />

— Homem! Deixe ficar isso... Havemos de ver, mas o senhor bem sabe que<br />

o público vai e tornando exigente: é preciso dar-lhe coisas boas!.<br />

Teobaldo compreendeu então o alcance de certas palavras de seu pai:<br />

"Esconde o mais que puderes a tua necessidade; ela só por si é o pior estorvo que<br />

se pede levantar defronte de ti, quando precisares de dinheiro..."<br />

E com eleito: dantes, Teobaldo mal apresentava algum trabalho nas<br />

redações, só ouvia em torno de si elogios e palavras de entusiasmo. É que sabiam<br />

perfeitamente que ele não precisava ganhar a vida; agora era um necessitado como<br />

qualquer e então viravam-lhe as costas, porque a necessidade é sempre ridícula e<br />

importuna<br />

O mesmo justamente lhe sucedera com os teatros. Dantes, quando<br />

Teobaldo freqüentava a caixa dos teatros nas horas de ensaio, pagando champanha<br />

aos artistas e levando-os depois do espetáculo a cear nos melhores hotéis; dantes,<br />

quando ele os presenteava nos benefícios e lhes emprestava dinheiro, muita vez<br />

perguntaram-lhe os empresários por que razão, dispondo de tanto talento e de tanto<br />

espírito, não escrevia ele alguma coisa para ser levada à cena. Havia por força de<br />

fazer sucesso!... Teobaldo que experimentasse!<br />

E agora, quando a necessidade lhe invadira a casa, rapaz, lembrando-se de<br />

tão repetidas solicitações feitas ao seu talento, tornou de um romance inglês e<br />

extraiu daí um drama que, se não era um primor de arte, estava ao menos no gosto<br />

do público e podia dar lucro ,aqueles mesmos empresários o receberam com frieza,<br />

dizendo-lhe secamente que deixasse ficar o trabalho e aparecesse depois. E, mais<br />

tarde, talvez sem terem lido a obra, acrescentaram-lhe com meias palavras e dandolhe<br />

o pretensioso tratamento de "filho" que ele fosse cuidar de outro ofício e<br />

perdesse as esperanças de arranjar alguma coisa por aquele modo.<br />

Com o seu gênio altivo, com a educação que tivera, Teobaldo não podia<br />

insistir em tais pretensões. Era bastante perceber um gesto de má vontade ou de<br />

pouco caso para lhe subir o sangue às faces, e muito fazia já conseguindo reprimir a<br />

cólera que se assanhava dentro dele, sôfrega por escapar em frases violentas.<br />

Depois dessas lutas e dessas tentativas estéreis, voltava para casa<br />

desanimado e furioso contra tudo e contra todos, encerrando-se no quarto e<br />

fechando-se por dentro para chorar à vontade.<br />

Vinha-lhe então quase sempre a idéia do suicídio, mas não vinha com ela a<br />

resolução, e o desgraçado continuava a viver.<br />

Todavia o tempo ia-se passando e o círculo das necessidades apertava-se<br />

cada vez mais.<br />

<strong>Coruja</strong> era agora o único sustentáculo da casa, era quem pagava o aluguel,<br />

a pensão de comida para Teobaldo que ele continuava a almoçar e jantar no<br />

colégio, era quem lhe pagava a lavadeira, e quem lhe fornecia dinheiro.<br />

Mas tudo isso era feito com tamanha delicadeza, com tanto amor, que<br />

Teobaldo, quando lhe aparecia qualquer revolta do caráter, ficava mais<br />

envergonhado de seu orgulho do que com receber aqueles obséquios.<br />

E nunca o André andou tão satisfeito, tão alegre de sua vida; dir-se-ia que<br />

ele, praticando aqueles sacrifícios, alcançava enfim a realização dos seus melhores<br />

sonhos.<br />

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