Download Monografia - Tag Cultural
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adquirindo um significado especial, é recebida pelo leitor, que dela se enriquece. (...) A<br />
narrativa implica uma técnica de arranjo e apresentação, que lhe comunica estrutura<br />
arquitetônica, beleza de forma e unidade de efeito. Estas são as fontes de interesse entre a<br />
personalidade do autor e a personalidade do leitor, nesta criando um interesse absorvente, uma<br />
sintonia psíquica. (COUTINHO, 2008: 50-51)<br />
Já o teatro, presentifica. Não como a literatura. Presentifica trazendo pra frente<br />
da cena uma situação, por meio também dos verbos e das orações, da estrutura textual.<br />
O discurso do teatro acaba sendo presentificante e põe o leitor dentro da situação. “Os<br />
Baudelaire eram crianças adoráveis”, por exemplo, é uma construção que “fertiliza” a<br />
imaginação do leitor mais do que se o verbo estivesse no tempo presente do indicativo.<br />
Snicket utiliza em seu discurso, na elaboração da narrativa, a ironia, a mudança<br />
de sentido das palavras, a criação de novas palavras, uma personagem que não sabe<br />
falar ainda, mas que entende sinestesias (Sunny troca o olfato pelo paladar em uma<br />
situação). Isso dá um caráter diferente à sua obra, devido à contradição da expectativa<br />
que o autor cria para o leitor.<br />
Mesmo em termos de estrutura o autor mostra sua intenção de fazer alguma<br />
diferença no mercado editorial. A repetição da palavra “nunca” é uma estrutura<br />
escolhida como menção à liberdade da poesia concreta de ocupação do espaço. Em vez<br />
de escrever um parágrafo inteiro para dizer aos leitores infantis os motivos pelos quais<br />
não se deve mexer em eletricidade, ele enfatiza com a repetição do “nunca” que isso não<br />
deve ser feito sob qualquer hipótese, mesmo sem dar explicação para tais motivos.<br />
Quando ele faz uso de tais artifícios (ver Anexos), ele está dizendo algo de uma maneira<br />
incomum. Analiticamente isso pode ter uma projeção na mente da criança, por efeito da<br />
estrutura em que esta advertência foi transmitida. É como a variação da entonação na<br />
oralidade ou da expressão facial grave. Desta forma é possível manipular o leitor.<br />
Candido e Benjamin falam a respeito:<br />
A arte, e, portanto, a literatura, é uma transposição do real para o ilusório por meio de uma<br />
estilização formal, que propõe um tipo arbitrário de ordem para as coisas, os seres, os<br />
sentimentos. Nela se combinam um elemento de vinculação à realidade natural ou social, e um<br />
elemento de manipulação técnica, indispensável à sua configuração, e implicando uma atitude<br />
de gratuidade. Gratuidade tanto do criador, no momento de sentir e apreciar. Isto ocorre em<br />
qualquer tipo de arte, primitiva ou civilizada. (CANDIDO, 1985: 53).<br />
A narrativa, que durante tanto tempo floresceu num meio de artesão – no campo, no mar e na<br />
cidade –, é ela própria, num certo sentido, uma forma artesanal de comunicação. Ela não está<br />
interessada em transmitir o “puro em si” da coisa narrada como uma informação ou um<br />
relatório. Ela mergulha a coisa na vida do narrador para em seguida retirá-la dele. Assim se<br />
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