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Baudelaire entregou-se a vícios e à boemia. Já sofria de depressão antes mesmo<br />
de encontrar-se na miséria. E sentiu-se toda a vida perseguido pelo padrasto.<br />
Perseguição: eis o argumento-motriz da saga dos órfãos Baudelaire na obra de Snicket.<br />
O caráter maldito, porém, coube ao próprio narrador das história, uma vez que vive na<br />
clandestinidade e tem medo de ser punido pelas coisas que escreve.<br />
O universo baudelaireano inclui a exisência de um flâneur. Baudelaire tentou<br />
explicar o complexo sentido do termo como sendo a pessoa cujo papel seria o de<br />
entender o processo da modernidade, do urbanismo e do cosmopolitismo através do<br />
fluxo da cidade. O flâneur é afetado pelo desenho da cidade e pelo andamento da<br />
mesma. Os órfãos Baudelaire, sub-repticiamente são afetados na medida em que<br />
transitam pelas cidades. Antes do incêndio que os deixou órfãos, os irmãos “moravam<br />
com seus pais numa enorme mansão no centro de uma cidade muito movimentada e<br />
muito poluída” (SNICKET, vol. 1: 10).<br />
Os nomes dos lugares por onde eles transitam – ou “flanam” –, como a Praia do<br />
Sal, o Porto Enevoado, a Aldeia de Tédia, o Rio da Amargura e a Avenida Sombria nos<br />
remetem a situações sempre desagradáveis, causando no leitor um mood tão pessimista<br />
quanto os poemas de Baudelaire eram capazes de criar. E mesmo com esta intenção,<br />
Snicket ironiza a respeito destes nomes próprios:<br />
Embora a Avenida Sombria ficasse a apenas alguns quarteirões de distância do lugar onde<br />
antes se erguera a mansão Baudelaire, as três crianças nunca tinham estado antes naquelas<br />
vizinhanças e presumiram que a palavra "sombria" na Avenida Sombria era simplesmente um<br />
nome e nada mais, assim como Bulevar George Washington não indica necessariamente que ali<br />
mora George Washington, ou Sexta Avenida não indica que as lojas ali só abrem às sextas-<br />
feiras. Mas naquela tarde os Baudelaire perceberam que Avenida Sombria era mais que um<br />
nome. Era uma descrição apropriada. Em vez de postes de luz, havia árvores enormes a<br />
intervalos regulares ao longo da calçada, de um tipo que as crianças nunca tinham visto antes<br />
— e que mal podiam ver agora. No alto de um tronco grosso e espinhento, os galhos pendiam<br />
como roupa pendurada para secar, espalhando suas folhas largas e chatas em todas as direções,<br />
como um teto baixo e folhudo por cima das cabeças dos Baudelaire. Esse teto bloqueava toda a<br />
luz que vinha de cima e com isso, muito embora fosse o meio da tarde, a rua parecia escura<br />
como se já fosse noite — se bem que um tanto esverdeada. Não se diria que era um bom jeito<br />
de fazer com que os órfãos se sentissem bem-vindos ao se aproximar do seu novo lar.<br />
(SNICKET, Vol. 6: 12-13).<br />
Para Walter Benjamin (1994b), a dialética da flânerie se descreve da seguinte<br />
maneira: “por um lado, o homem que se sente olhado por tudo e por todos,<br />
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