Download Monografia - Tag Cultural
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A obra de Snicket possui um caráter acessível, principalmente pelo fato de ser<br />
destinada a crianças e adolescentes, que requerem as intervenções do autor para explicar<br />
o significado de uma expressão ou provérbio que possivelmente ainda não esteja<br />
incluído no repertório do público-alvo não-adulto. Isso demonstra que mesmo o escritor<br />
possui um horizonte de expectativa: o escritor também nutre expectativas em relação ao<br />
seu leitor (Quem lerá o meu livro? Que idade terá esta pessoa? É membro de uma<br />
sociedade laica, cristã ou islâmica? Quais características das personagens que crio<br />
podem não estar de acordo com a moral deste leitor?).<br />
Contudo, mesmo que o público-alvo sejam os menores, Snicket não os<br />
subestima, deixando pistas e referências a outras obras que também povoam o<br />
imaginário coletivo do Ocidente (Robinson Cruzoé, Chapeuzinho Vermelho, Lewis<br />
Carroll, os irmãos Grimm e algumas lendas populares). Provavelmente, com o<br />
excessivo refinamento de algumas citações, é possível depreender que o leitor adulto<br />
também está contemplado no horizonte de expectativas de Snicket, uma vez que ele<br />
referencia a literatura constante do repertório adulto (Virginia Woolf, T. S. Elliot,<br />
Baudelaire, Platão e Shakespeare, entre outros). Stierle afirma que “o sujeito da<br />
produção e o sujeito da recepção não são pensáveis como sujeitos isolados, mas apenas<br />
como social e culturalmente mediados, como sujeitos ‘transubjetivos’”. (STIERLE,<br />
2001: 143)<br />
A auto-reflexividade da ficção não implica a sua autonomia quanto ao mundo real. O mundo<br />
da ficção e o mundo real se coordenam reciprocamente: o mundo se mostra como horizonte da<br />
ficção, a ficção, como horizonte do mundo. O âmbito da recepção dos textos ficcionais<br />
demarca-se apenas na apreensão desta dupla perspectiva. (STIERLE, 2001: 171)<br />
Mas é pela explicação de Ieda de Oliveira que esta relação autor-leitor torna-se<br />
mais compreensível:<br />
O Eu-comunicante e o Tu-interpretante são pessoas reais, com identidade psicossocial, ao<br />
passo que o Eu-enunciador e o Tu-destinatário são entidades do discurso, só tendo existência<br />
teórica.<br />
(...) O Eu-comunicante, portanto, é quem fala ou escreve e o Tu-interpretante é quem ouve ou<br />
lê (e interpreta) o texto, seja este oral ou escrito. O Tu-destinatário é a imagem que o Eu-<br />
comunicante tem do Tu-interpretante, ou seja, é uma hipótese formulada pelo Eu-comunicante<br />
sobre quem seja o Tu-interpretante. Ocorre que essa é a “imagem” que o Eu-comunicante se<br />
dirige. Se o Tu-destinatário coincidir com o Tu-interpretante (se, portanto, a hipótese do Eu-<br />
comunicante estiver correta) a comunicação será bem sucedida. Caso contrário, ela fracassará.<br />
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