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:: Depoimentos - IDART 30 Anos<br />
uma leitura urbana no sentido de que, ainda que essas fábulas não sejam<br />
orientadas por uma cultura urbana, elas são escritas com a informação de<br />
autores devidamente municiados com valores e com uma maneira de ver o<br />
teatro, de ver o mundo, que é, sim, uma maneira cosmopolita. É possível<br />
ver na discussão de um texto como Agreste tempo e lugar arcaicos, préindustriais,<br />
um posicionamento ideológico, estético, uma discussão sobre<br />
gêneros e sexualidade, posicionamento francamente contemporâneo<br />
e cosmopolita. Nesse sentido, ao mesmo tempo em que você tem essa<br />
primeira face do texto falsa no sentido temático, ela nos traz assuntos<br />
historicamente latentes, atuais. As estratégias formais seguem a mesma<br />
“dupla identidade”: desenvolvem-se inspiradas na base de uma prática<br />
cultural tradicional, a narrativa oral, mas deixam entrever as marcas<br />
de uma época em que o fragmento e a descontinuidade são elementos<br />
estruturantes.<br />
20<br />
Esse argumento pede ainda uma leitura que, mesmo provisória, tenta<br />
apontar a emergência da narrativa tanto em textos como os da Companhia<br />
do Latão quanto nas formas mais hibridizadas pela coisa poética, presentes<br />
nos autores que acabei de citar. Para além da hibridização de gêneros,<br />
me parece que um certo componente trágico da existência, que pode<br />
ser perfeitamente estendido a outros exemplos da produção atual, é o<br />
que tematiza subliminarmente essas histórias. E mesmo quando elas se<br />
apresentam numa freqüência quase mitológica e sacrificial, como é o caso<br />
do próprio Agreste, e portanto a-histórica, como se quisesse se deslocar<br />
do momento presente, elas deixam vazar nas entrelinhas uma espécie<br />
de consciência muito local, muito brasileira, muito contemporânea e<br />
muito próxima, qual seja, uma espécie de consciência lírica e trágica do<br />
subdesenvolvimento, que não é algo em geral, é a nossa condição de país<br />
dependente. É uma leitura que estou fazendo. Assim, proponho reutilizar,<br />
sob essa perspectiva, os termos que o Sarrazac usa, que nós temos usado<br />
bastante <strong>para</strong> analisar essas desconjunturas, digamos assim, do texto<br />
contemporâneo: “texto híbrido”, “devir do drama” ou “autor-rapsodo” ou<br />
ainda outro conceito hoje bem difundido, pelo menos academicamente,<br />
que é “teatro pós-dramático”, o teatro que tem dispensado a forma do<br />
drama burguês <strong>para</strong> lançar mão de várias outras estratégias textuais,<br />
inclusive a narrativa.