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Dessa perspectiva, a própria linguagem, mesmo<br />
na forma de “fala”, aparece como um agenciamento<br />
de “práticas discursivas”, desde contar, listar, fazer<br />
contratos, cantar, passan<strong>do</strong> pela recitação de preces,<br />
até emitir ordens, confessar, comprar uma merca<strong>do</strong>ria,<br />
fazer um diagnóstico, planejar uma campanha,<br />
discutir uma teoria, explicar um processo. Essas<br />
práticas não habitam um <strong>do</strong>mínio amorfo e funcionalmente<br />
homogêneo de significação e negociação<br />
entre indivíduos – elas estão localizadas em locais e<br />
procedimentos particulares, os afectos e as intensidades<br />
que os atravessam são pré-pessoais, elas são<br />
estruturadas em variadas relações que concedem<br />
poderes a alguns e delimitam os poderes de outros,<br />
capacitam alguns a julgar e outros a serem julga<strong>do</strong>s,<br />
alguns a curar e outros a serem cura<strong>do</strong>s, alguns a<br />
falar a verdade e outros a reconhecer sua autoridade<br />
e a abraçá-la, aspirá-la ou submeter-se a ela.<br />
Logo retornarei a esse argumento. Mas à luz <strong>do</strong><br />
que foi dito até agora, quero examinar alguns desenvolvimentos<br />
recentes na própria psicologia, os<br />
quais consideram a subjetivação em relação à linguagem<br />
e que buscam explicar o eu em termos de<br />
“narrativa”: as estórias que contamos uns aos outros<br />
e a nós próprios.<br />
“Não se trata apenas <strong>do</strong> fato de que dizemos<br />
<strong>nos</strong>sas vidas como estórias: mas existe um senti<strong>do</strong><br />
importante no qual <strong>nos</strong>sas relações mútuas são vividas<br />
de forma narrativa” (GERGEN & GERGEN, 1988,<br />
p. 18). Para aquelas pessoas que argumentam dessa<br />
forma, os eus são realmente constituí<strong>do</strong>s no<br />
interior da fala. A linguagem, aqui, é entendida<br />
como um complexo de narrativas <strong>do</strong> eu que <strong>nos</strong>sa<br />
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