edição de 15 de abril de 2024

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João Oliver, da ESPM: evasão de marcas pode aumentar Yasmin Curzi, da FGV Direito Rio: discurso da censura André Miceli, da FGV e MIT: desdobramentos e urgência
“Espero que essa
discussão não seja feita
de maneira afobada”
cionada pelo presidente da República, Luiz Inácio Lula da
Silva (PT), e publicada no Diário Oficial da União no dia 15
de janeiro de 2024, a Lei 14.811 instituiu a Política Nacional
de Prevenção e Combate ao Abuso e Exploração Sexual
da Criança e do Adolescente e alterou a Lei dos Crimes
Hediondos e o Estatuto da Criança e do Adolescente.
Um mês depois, o TSE regulamentou o uso de inteligência
artificial (IA) na propaganda de partidos, coligações,
federações partidárias, candidatas e candidatos
nas eleições municipais de 2024. A tecnologia só será
permitida com um aviso explícito. Conteúdos em áudio
ou vídeo manipulados por IA (deepfake) estão proibidos,
e podem acarretar na cassação de mandatos ou
registros, com responsabilidades apuradas pelo Código
Eleitoral. A intenção é coibir o uso da tecnologia para desinformar
e confundir os eleitores.
Em compensação, o Projeto de Lei 2630/20, que
criaria a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e
Transparência na Internet, conhecido como PL das Fake
News, foi abandonado. Na última terça-feira (9), Arthur
Lira (PP-AL), presidente da Câmara dos Deputados, propôs
a formação de um grupo que trabalhará por cerca de
30 a 40 dias a fim de conceber um novo texto para regulamentar
as redes sociais. O objetivo é responsabilizar as
big techs por conteúdos nocivos, além de estudar regras
para o uso de inteligência artificial.
“O governo pressionou a aprovação de um lado. Mas,
do outro, a extrema direita se articulou bem, por exemplo,
com a postura do Musk de instigar esse tipo de ação
no X”, observa Yasmin Curzi, professora da FGV Direito Rio.
Segundo a especialista, a movimentação se transformou
em “palco e retórica para o discurso da censura, que tem
uma adesão social muito forte”, emenda. De acordo com
Yasmin, campanhas foram engendradas para difamar o
PL, taxando-o como “o projeto da censura”.
“Quando um texto ganha uma narrativa como essa,
ele simplesmente não ganha apoio. Perdermos tempo
com uma discussão que não vai para frente será muito
pior do que reunirmos, como sempre fizemos, com
muita tranquilidade e transparência, grupos de trabalho
para assuntos delicados na Casa que sempre tiveram
êxito”, justifica Arthur Lira.
Embora tenha neutralizado o PL das Fake News, a troca
de farpas entre Musk e Moraes reacendeu a discussão,
que dependerá do capital político investido pelo governo
nesta nova etapa. “Com os desdobramentos, criará
urgência”, analisa André Miceli, coordenador acadêmico
da FGV e CEO da MIT Technology Review no Brasil.
O professor adverte, no entanto, para o perigo de
votações que proíbam uma ferramenta ou que pautem
restrições mais rígidas. “Espero que essa discussão não
seja feita de maneira afobada”, diz Miceli. A conjuntura
provocou também a manifestação do ministro Dias Toffoli
(STF), que pretende mandar até junho os autos de
uma ação para o julgamento do Marco Civil da Internet
(Lei 12.965/2014). A ideia é revisar o trecho que isenta
as plataformas de responderem por conteúdos e delitos
praticados por terceiros.
DesmarcanDo o X
A ameaça de fechar o escritório no Brasil não parece
ser necessariamente uma preocupação de Musk com
empregos. Ao assumir a operação, o empresário demitiu
7,5 mil funcionários, metade da força de trabalho da
rede, em 2022. O X encerrou a presença de um ícone entranhado
na história mundial das redes sociais. Marcas
que antes utilizavam a plataforma como termômetro
cultural, hoje buscam alternativas para compensar o voo
que o pássaro azul representou um dia.
A fuga de marcas já vem sendo percebida. Não é para
menos. Musk declarou que prefere o modelo de assinaturas
que o dinheiro de patrocinadores. O endosso a
temas caros à humanidade também afasta investimentos.
Em novembro de 2023, IBM, Apple, Disney, Comissão
Europeia, Lionsgate e Paramount interromperam a exibição
de anúncios no X após a disseminação de conteúdo
antissemita, intensificado após a guerra entre Israel e
o grupo terrorista Hamas, que estourou um mês antes.
“Houve uma fuga muito grande de patrocínios desde
que Musk assumiu”, atesta Yasmin Curzi, da FGV Rio.
Se o X for proibido no Brasil, os anunciantes vão poder
requerer as suas verbas. Nesse tipo de compra de
mídia, normalmente o custo só é computado quando
a impressão é realizada ou no momento do clique. “As
verbas disponibilizadas para a ferramenta acabam não
sendo executadas e, portanto, não existe custo. É uma
questão relativamente simples”, considera Miceli.
Já a permanência da plataforma incidirá na reputação
das marcas. “Algumas não querem ficar associadas
a Elon Musk e ao X, como já ocorreu. É uma questão de
posicionamento”, explica Miceli. É preciso considerar
também o quanto a plataforma será eficiente para conversar
com certos targets. “À medida que a confusão
acontece, tem um público que vai saindo naturalmente
da plataforma, e ela deixa de ser interessante para determinados
produtos”, acrescenta Miceli.
O professor de marketing e mídia João Oliver, da
ESPM, lembra a força que o Twitter já teve na formatação
de estratégias de mídia e marca. Mas não reconhece
a mesma potência no X. “Há uma clara mudança, no antes
e depois. Fica cada vez mais difícil aprovar um plano
de mídia”, situa Oliver. Para o acadêmico, o desvio de
curadoria e boas práticas da plataforma preocupa mais
que a possível associação e conivência de anunciantes à
postura de Musk. Conteúdos incompatíveis com o perfil
do usuário distorcem o propósito que a plataforma já ostentou
no passado. “A evasão de marcas pode ficar ainda
maior”, sinaliza Oliver.
Lançado em 2006, o Twitter foi comprado por Musk
em 2022 e renomeado para X no ano passado. Até o processo
de aquisição foi controverso. Primeiro, o bilionário
adquiriu 9,2% das ações da companhia. Em seguida,
disse que iria comprá-la por R$ 44 bilhões. Mas desistiu
alegando o descumprimento de obrigações contratuais
para a análise de contas falsas e spam. O Twitter o processou
e Musk voltou atrás.
jornal propmark - 15 de abril de 2024 37