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Geografia e geopolítica: a contribuição de ... - Biblioteca - IBGE

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<strong>Geografia</strong> e <strong>geopolítica</strong><br />

106 ....................... A <strong>contribuição</strong> <strong>de</strong> Delgado <strong>de</strong> Carvalho e Therezinha <strong>de</strong> Castro<br />

Essa formação, somada ao domínio dos idiomas francês, inglês e alemão,<br />

constituía um cabedal consi<strong>de</strong>rável para um jovem <strong>de</strong> 22 anos recém-chegado no<br />

Brasil, que Delgado não se furtou a utilizar. Seu primeiro emprego seria o <strong>de</strong> redator<br />

<strong>de</strong> política internacional no Jornal do Comércio, para o qual escreveu diversas<br />

matérias. Mas sentia-se atraído pelo campo científico e educacional, a ponto <strong>de</strong> – em<br />

<strong>de</strong>z anos – escrever quatro livros sobre geografia do Brasil (CARVALHO, 1908, 1910,<br />

1913, 1916), além <strong>de</strong> organizar projetos acadêmicos como a Escola <strong>de</strong> Altos Estudos,<br />

que funcionaria no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro <strong>de</strong> 1913 a 1916. No<br />

início da década seguinte, Delgado é nomeado conferencista nas Escolas <strong>de</strong> Intendência<br />

e do Estado-Maior do Exército e inicia sua atuação no Colégio Pedro II na<br />

Escola Normal, on<strong>de</strong> leciona Sociologia. Faz parte <strong>de</strong>ssa época, também, seu envolvimento<br />

no Curso Livre Superior em <strong>Geografia</strong> (1926-1927), organizado no âmbito<br />

da Socieda<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Geografia</strong> do Rio <strong>de</strong> Janeiro e <strong>de</strong>stinado a atualizar professoras do<br />

ensino primário.<br />

A ativida<strong>de</strong> docente <strong>de</strong> Delgado <strong>de</strong> Carvalho, como se po<strong>de</strong> perceber, acompanha<br />

o sentido das reformas educacionais em curso no Brasil dos anos <strong>de</strong> 1920. Voltada<br />

inicialmente para oficiais militares e quadros dirigentes do País – como os alunos da<br />

Escola <strong>de</strong> Altos Estudos –, ela se amplia para professores e alunos do ensino público. O<br />

próprio Delgado participa dos movimentos <strong>de</strong> renovação pedagógica, assinando o Manifesto<br />

dos pioneiros da educação (1932). Seu prestígio intelectual, a esta altura consolidado,<br />

cre<strong>de</strong>ncia-o a cargos oficiais no Conselho Nacional <strong>de</strong> Educação (1931) e no Conselho<br />

Nacional <strong>de</strong> <strong>Geografia</strong> (1937), como representante do Ministério da Educação.<br />

Delgado <strong>de</strong>staca-se ainda por uma vasta produção escrita. Em quase 70 anos <strong>de</strong><br />

trabalho, publicou numerosos artigos e manuais didáticos, alguns dos quais extremamente<br />

inovadores. Seu livro sobre o Brasil Meridional, por exemplo, escrito em francês<br />

em 1910, revolucionou o modo <strong>de</strong> organização dos conteúdos em <strong>Geografia</strong>, ao substituir<br />

o formato <strong>de</strong> apresentação por estados – inspirado nas antigas corografias – pelas<br />

“regiões” [pays] do café, do mate e do gado; sua Geographia do Brasil (1913), revela-se<br />

pioneira por antecipar a regionalização adotada pelo <strong>IBGE</strong> em 1942, base da classificação<br />

vigente até hoje; por fim, Methodologia do ensino geográphico (1925), <strong>de</strong>stinada a<br />

professores, po<strong>de</strong> ser apontada como a mais importante <strong>contribuição</strong> ao ensino <strong>de</strong> <strong>Geografia</strong><br />

na primeira meta<strong>de</strong> do Século XX, ao introduzir no universo escolar conceitos<br />

como região natural e discutir programas e processos didáticos.<br />

Em comum, essas obras investem contra aquilo que Delgado <strong>de</strong>nominava “concepções<br />

geográficas tradicionais”, baseadas na <strong>de</strong>scrição sem explicação, na memorização<br />

e no culto à nomenclatura. Tais características, segundo o autor, afastavamse<br />

em tudo do objeto real da geografia, o estudo da Terra como habitat do homem.<br />

Tratava-se, portanto, <strong>de</strong> um objeto que não <strong>de</strong>veria ser apresentado ao aluno <strong>de</strong> forma<br />

austera e ingrata, mas sim como algo vivo e cativante. Através <strong>de</strong> recursos didáticos<br />

apropriados (mapas, diagramas, perfis e fotografias), o professor <strong>de</strong> <strong>Geografia</strong> <strong>de</strong>veria<br />

organizar o conteúdo programático sem recorrer a <strong>de</strong>scrições áridas e nomenclatura<br />

exagerada, buscando sempre a abordagem que sistematiza, compara e generaliza; que<br />

faz uso <strong>de</strong> princípios causais na explicação. Escrevendo diretamente para os mestres,<br />

como em Methodologia do ensino geográphico, Delgado dava-lhes os instrumentos<br />

para se atingir tal fim.<br />

A posição alcançada por Delgado <strong>de</strong> Carvalho lhe permitiu influenciar na <strong>de</strong>finição<br />

<strong>de</strong> conteúdos e programas <strong>de</strong> estudos, que moldariam o rosto da geografia brasileira<br />

antes <strong>de</strong> sua institucionalização. Tal influência foi reiterada nas últimas décadas em<br />

trabalhos <strong>de</strong> história do pensamento geográfico e ensino <strong>de</strong> <strong>Geografia</strong>, que enfatizaram<br />

a importância do autor na construção <strong>de</strong> uma ‘orientação mo<strong>de</strong>rna’ para a disciplina e<br />

na escolha <strong>de</strong> um critério racional para a divisão regional do País, baseado no conceito<br />

<strong>de</strong> região natural (VLACH, 1989; FERRAZ, 1995). No presente texto, na trilha <strong>de</strong> contribuições<br />

mais recentes (ZUSMAN; NUNES PEREIRA, 2000; VLACH, 2004), esten<strong>de</strong>mos<br />

esse legado à <strong>Geografia</strong> política, cultivada pelo autor, mas nem sempre reconhecida, <strong>de</strong>vido<br />

ao ostracismo a que foi con<strong>de</strong>nada na formação da geografia acadêmica no Brasil,<br />

<strong>de</strong> acentuada matriz francesa.

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