21.04.2013 Views

Geografia e geopolítica: a contribuição de ... - Biblioteca - IBGE

Geografia e geopolítica: a contribuição de ... - Biblioteca - IBGE

Geografia e geopolítica: a contribuição de ... - Biblioteca - IBGE

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

Delgado <strong>de</strong> Carvalho e o ensino <strong>de</strong> <strong>Geografia</strong> Política ................................. 109<br />

Impasses <strong>de</strong>ssa natureza não <strong>de</strong>veriam comprometer o projeto pretendido por<br />

Delgado <strong>de</strong> Carvalho, requerendo estratégias que ultrapassassem o plano imediato da<br />

ação didática. Assim, nosso autor procura circunscrever claramente o objeto da <strong>Geografia</strong><br />

política e esboçar sua <strong>de</strong>finição. A partir <strong>de</strong> um universo relativamente amplo <strong>de</strong><br />

concepções, marcado ainda por controvérsias entre “escolas nacionais”, ele se alinha<br />

e à versão elaborada por Camille Vallaux num livro publicado com Jean Brunhes em<br />

1921, La Géographie <strong>de</strong> l’histoire: géographie <strong>de</strong> la paix et la guerre sur terre et sur mer, no qual<br />

a <strong>Geografia</strong> política aparece subordinada à <strong>Geografia</strong> humana 6 – ao lado da <strong>Geografia</strong><br />

econômica, da <strong>Geografia</strong> do povoamento, da <strong>Geografia</strong> das civilizações (ou social) e da<br />

<strong>Geografia</strong> regional (CARVALHO, 1929, p. 17). Com base nessa matriz, Delgado organiza<br />

seu programa, assim formalizado: <strong>Geografia</strong> política (noções gerais e objeto); a mobilida<strong>de</strong><br />

dos povos; o Estado (formação, tipos e evolução); a posição e o espaço (segundo<br />

as teorias <strong>de</strong> Supan e Ratzel); as fronteiras; e as cida<strong>de</strong>s políticas 7 (CARVALHO, 1929).<br />

Ao examinar a argumentação presente em Introdução à geografia política e em <strong>Geografia</strong><br />

humana – política e econômica, percebemos uma acentuada influência <strong>de</strong> autores<br />

franceses, sobretudo <strong>de</strong> Camille Vallaux, em quem Delgado se ancora quase totalmente<br />

na sua exposição sobre tipos <strong>de</strong> Estado, fronteiras e na crítica à teoria do espaço <strong>de</strong> Ratzel.<br />

Trata-se, na verda<strong>de</strong>, <strong>de</strong> uma influência recorrente, já presente na adoção do conceito<br />

<strong>de</strong> região natural e atualizada nesse momento, bem como no interesse posterior pela<br />

obra <strong>de</strong> Jacques Ancel (1936 e 1938). Po<strong>de</strong>mos então admitir uma “primazia francesa”<br />

na <strong>Geografia</strong> política <strong>de</strong> Delgado <strong>de</strong> Carvalho? Esse é um ponto relativamente complexo,<br />

cuja discussão pressupõe consi<strong>de</strong>rar duas questões: (1) os geógrafos franceses mais<br />

utilizados por Delgado não são os que seguem mais fielmente os protocolos metodológicos<br />

da Escola Geográfica Francesa, mas, ao contrário, aqueles que apresentam certa<br />

tensão com relação a ela; (2) o terreno sobre o qual se <strong>de</strong>senvolve a <strong>Geografia</strong> política,<br />

em qualquer <strong>de</strong> suas versões, foi <strong>de</strong>limitado teoricamente por Ratzel (RAFFESTIN,<br />

1993, p. 13-14), o que induz à aceitação do universo conceitual e meios <strong>de</strong> pensamento<br />

<strong>de</strong>senvolvidos por esse autor e, mais amplamente, pela <strong>Geografia</strong> alemã.<br />

No que diz respeito à primeira questão, cabe <strong>de</strong>stacar a resistência do meio acadêmico<br />

francês em absorver a <strong>Geografia</strong> política como campo <strong>de</strong> estudo legítimo da<br />

ciência geográfica, <strong>de</strong>squalificando-a epistemologicamente e tolerando-a apenas como<br />

uma crítica <strong>de</strong> sua congênere alemã. É justamente isso que fundamenta as reprovações<br />

<strong>de</strong> Vallaux por Demangeon (ESCOLAR, 1991, p. 10) e <strong>de</strong> Ancel por Gottmann (RAFFES-<br />

TIN, 1993, p. 20). O caso <strong>de</strong> Vallaux é particularmente representativo <strong>de</strong> uma atitu<strong>de</strong><br />

contrastante, em relação a Vidal <strong>de</strong> La Blache e seus discípulos, quanto ao questionamento<br />

das proposições ratzelianas. Concordando com uma análise perspicaz, enquanto<br />

o primeiro procura “apropriar-se teoricamente do objeto da <strong>Geografia</strong> política, não<br />

tendo mais remédio que discutir (e ser influenciado) com Ratzel no plano empírico”,<br />

a segunda adota a “estratégia epistemológica [...] do silêncio e da negação [...] do problema<br />

geopolítico” (ESCOLAR, 1991, p. 24). Esses diferentes posicionamentos são reveladores,<br />

por sua vez, da existência <strong>de</strong> diferentes discursos _ um “marginal” e outro<br />

“oficial” _ convivendo na <strong>Geografia</strong> francesa. A escolha <strong>de</strong> Delgado, no entanto, recai<br />

sobre Vallaux. Se compararmos, nas obras examinadas, a presença <strong>de</strong>sse autor com a<br />

<strong>de</strong> outros geógrafos franceses, a diferença é constrangedora. As referências a Vidal,<br />

Demangeon e mesmo Brunhes (consi<strong>de</strong>rado fora <strong>de</strong> sua colaboração com Vallaux) são<br />

muito periféricas, só adquirindo maior vulto em um capítulo <strong>de</strong>dicado ao estudo do<br />

habitat humano (CARVALHO, 1933, p. 93-118).<br />

Quanto à perenida<strong>de</strong> da obra <strong>de</strong> Ratzel, po<strong>de</strong>mos pensá-la inicialmente como um <strong>de</strong>sdo-<br />

bramento da questão anterior. Ao acolher os geógrafos franceses que, em certa medida,<br />

conferem uma positivida<strong>de</strong> à <strong>Geografia</strong> política alemã, Delgado também a está reconhe-<br />

6 Impossível não lembrar <strong>de</strong> Lucien Febvre em A Terra e a evolução humana, on<strong>de</strong> se <strong>de</strong>fine a proposta <strong>de</strong> uma <strong>Geografia</strong><br />

política “estreitamente solidária da geografia humana” (FEBVRE, 1922, p. 479-480).<br />

7 É sintomático que também em <strong>Geografia</strong> humana, política e econômica, o único capítulo referente ao urbano (“Formação <strong>de</strong><br />

Cida<strong>de</strong>s”) apareça na parte <strong>de</strong> <strong>Geografia</strong> política e não na <strong>de</strong> <strong>Geografia</strong> econômica, numa obra que separa explicitamente<br />

os dois conteúdos (CARVALHO, 1933).

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!