A Prosa Literária de Orlando da Costa - Universidade Aberta
A Prosa Literária de Orlando da Costa - Universidade Aberta
A Prosa Literária de Orlando da Costa - Universidade Aberta
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
obe<strong>de</strong>cia a tradições enraiza<strong>da</strong>s por muitos séculos e alimenta<strong>da</strong>s por<br />
conveniências nem sempre perceptíveis a todos, como anteriormente exposto.<br />
Algumas personagens que se nos aparentam <strong>de</strong>spoja<strong>da</strong>s <strong>de</strong> sentimentos interiores,<br />
calam as relações amorosas e os filhos <strong>de</strong>ssas aventuras pesando esse segredo no<br />
percurso <strong>da</strong>s suas vi<strong>da</strong>s. Anteriormente, em análise a OSDI, falámos <strong>da</strong> atracção<br />
entre Natel e o sol<strong>da</strong>do expedicionário português, voltamos em OUOMM a<br />
encontrar personagens que nos fazem repensar nas relações amorosas durante o<br />
colonialismo português. O tio <strong>de</strong> Manú, Roque Sebastião teria vivido um romance<br />
com a ama do sobrinho, “uma mulher alta e <strong>de</strong> pele escura. Tinha um rosto oval e<br />
ovais eram os olhos negros <strong>de</strong> um manso fulgor sensual, tal como o sorriso que se<br />
<strong>de</strong>sprendia dos lábios bem <strong>de</strong>senhados e carnudo” (OUOMM, p.55).<br />
Avultam na diegese as interrogações sem resposta, por tão óbvias<br />
seguramente mas inconvenientes para Roque Sebastião. Impensável o<br />
<strong>de</strong>scen<strong>de</strong>nte <strong>de</strong> uma família <strong>de</strong> gãocars, <strong>da</strong>s mais antigas <strong>de</strong> Margão, manter uma<br />
relação amorosa com uma cria<strong>da</strong> senão como amante, pior seria assumir a<br />
paterni<strong>da</strong><strong>de</strong> <strong>de</strong> uma criança nasci<strong>da</strong> <strong>de</strong>ssa união e aceitá-la como her<strong>de</strong>ira<br />
legitima. Da passivi<strong>da</strong><strong>de</strong> do narrador está implícita a intenção <strong>de</strong> ser o leitor, pela<br />
sua liber<strong>da</strong><strong>de</strong> semiótica 93 a preencher as dúvi<strong>da</strong>s <strong>de</strong> Roque Sebastião sobrepostas<br />
às interrogações retóricas ao ser surpreendido pelo filho <strong>de</strong> Preciosa filho,<br />
companheiro <strong>da</strong> mãe até à sua morte: «“Se estava tão doente, por que não me veio<br />
dizer antes e só me aparece agora?! (…) ” E o seu pai? ” (…) “ Disse que partia<br />
<strong>de</strong> vez, sem ter a certeza se eu era realmente se eu era seu filho ou não”»<br />
(OUOMM, p.302).<br />
Este assunto é retomado em SFNC expondo-nos o conflito familiar pelo<br />
nascimento <strong>de</strong> uma criança fora do casamento. O filho, Bostu será “afastado” <strong>da</strong><br />
93 Enten<strong>de</strong>mos por liber<strong>da</strong><strong>de</strong> semiótica uma <strong>da</strong>s exigências que o texto faz ao leitor e <strong>de</strong>fini<strong>da</strong> por<br />
Aguiar e Silva: como um exercício que se fun<strong>de</strong> na interacção <strong>da</strong>s próprias estruturas textuais, com<br />
os instrumentos, os processos e as estratégias <strong>de</strong> <strong>de</strong>scrição, análise e interpretação utilizados pelo<br />
leitor (1990,94).<br />
56