A Prosa Literária de Orlando da Costa - Universidade Aberta
A Prosa Literária de Orlando da Costa - Universidade Aberta
A Prosa Literária de Orlando da Costa - Universidade Aberta
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
mãos. O que ela po<strong>de</strong> salvar <strong>da</strong> sua i<strong>de</strong>nti<strong>da</strong><strong>de</strong>, ela, o povo vai continuar a<br />
salvaguar<strong>da</strong>r e vai conseguir, creio. (VALE, 2004: 295)<br />
O facto <strong>de</strong> qualquer um dos livros <strong>de</strong>sta trilogia, ter sido escritos com o<br />
olhar <strong>de</strong> distanciamento físico e temporal que facilita “or<strong>de</strong>nar o campo literário”<br />
no que concerne à matéria histórica, permitiu ao escritor um espaço amplo para<br />
uma articulação credível entre os vários planos temporais <strong>da</strong> diegese <strong>de</strong> refina<strong>da</strong><br />
elaboração estética.<br />
Como ponto <strong>de</strong> intersecção nas obras temos o espaço geográfico – Goa –<br />
e, numa perspectiva mais abrangente, po<strong>de</strong>mos ain<strong>da</strong> aceitar como traço comum o<br />
tempo <strong>de</strong> uma Goa ain<strong>da</strong> sob o colonialismo português on<strong>de</strong> pairava a sombra <strong>da</strong><br />
guerra. O escritor, atento às evoluções políticas e sociais, porque o “olhar do<br />
romancista sobre o mundo e sobre os homens jamais é distraído ou gratuito, retira<br />
do cabe<strong>da</strong>l <strong>da</strong>s suas observações e <strong>da</strong>s suas experiências, as personagens e as<br />
situações romanescas”. 144<br />
Os espaços, as atmosferas, mesmo alguns pormenores carregados <strong>de</strong><br />
simbolismo que o autor utiliza “tudo na narrativa é significante” como sustentava<br />
Roland Barthes”. 145 E significantes são as críticas implícitas <strong>de</strong> uma narrativa<br />
elabora<strong>da</strong> nas bases <strong>da</strong> autentici<strong>da</strong><strong>de</strong> autóctone, visando ilustrar pelos símbolos,<br />
personagens e memórias a relação colonizador - colónia. Consi<strong>de</strong>ramos úteis para<br />
a nossa análise dois aspectos mencionados no texto <strong>de</strong> Oliveira Marques,<br />
reportados a séculos anteriores, porém <strong>de</strong>terminantes para a História <strong>de</strong> Goa e em<br />
consonância com a ficcionali<strong>da</strong><strong>de</strong> no corpus em estudo: a miscigenação e a<br />
mestiçagem.<br />
Os casamentos mistos em Goa começaram por 1509. Ca<strong>da</strong> casal<br />
recebia um importante subsídio ou dois em dinheiro, o que rapi<strong>da</strong>mente fez<br />
aumentar o número <strong>de</strong> consórcios. Em três ou quatro anos, mais <strong>de</strong><br />
144 Aguiar e Silva, sobre a observação <strong>da</strong> reali<strong>da</strong><strong>de</strong> pelo escritor, conclui: «Esta análise intencional<br />
e quase cientifica <strong>da</strong> reali<strong>da</strong><strong>de</strong> representa o <strong>de</strong>senvolvimento extremo <strong>de</strong> uma atitu<strong>de</strong> <strong>de</strong> espírito<br />
comum a todo o romancista […]» (1982,371).<br />
145 Roland Barthes, O efeito do Real, Literatura e Reali<strong>da</strong><strong>de</strong>, p. 90. (texto publicado pela primeira<br />
vez em Communications, 11, 1968).<br />
94