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OS FUNDAMENTOS DA LIBERDADE

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262 Os Fundamentos da Liberdade<br />

execução da política nesse sentido da palavra. Sua tarefa é a administração<br />

e a alocação dos recursos postos à disposição do governo para<br />

atender às necessidades da comunidade, que variam constantemente.<br />

Todos os serviços que o governo presta aos cidadãos, da defesa nacional<br />

à manutenção das estradas, das medidas sanitárias ao policiamento<br />

das ruas, são necessariamente deste tipo. Para essas tarefas lhe são concedidos<br />

meios específicos e seus próprios funcionários, e o governo terá<br />

de decidir constantemente qual a nova prioridade e os meios que empregará.<br />

A tendência dos administradores profissionais voltados para essas<br />

tarefas é submeter tudo quanto for possível à consecução dos objetivos<br />

públicos que eles perseguem. O Estado de Direito é tão importante hoje<br />

porque basicamente protege o cidadão contra esta tendência da máquina<br />

administrativa em constante expansão a absorver a esfera privada.<br />

Isto significa, em última instância, que os órgãos aos quais são confiadas<br />

essas tarefas especiais não devem exercer quaisquer poderes soberanos<br />

(Hoheitsrechte, como dizem os alemães) visando a seus próprios<br />

fins, mas devem limitar-se aos meios que lhes são concedidos.<br />

8. Direitos Fundamentais e Liberdades Civis<br />

Sob o império da liberdade, a esfera livre do indivíduo inclui todas<br />

as ações que não são limitadas explicitamente por uma lei geral. Vimos<br />

que se considerou especialmente necessário proteger alguns dos mais<br />

importantes direitos privados contra sua violação pela autoridade e que<br />

também se temeu que a enumeração explícita de alguns direitos pudesse<br />

ser interpretada como se só eles tivessem proteção especial da Constituição.<br />

Esses temores provaram ser justificados. Em geral, porém, a experiência<br />

parece confirmar a idéia de que, apesar de todas as declarações<br />

de direitos serem inevitavelmente incompletas, elas conferem importante<br />

proteção a certos direitos que, reconhecidamente, podem ser ameaçados<br />

com facilidade. Hoje em dia, devemos estar particularmente conscientes<br />

de que, como resultado da revolução tecnológica, que cria sempre<br />

novas ameaças potenciais à liberdade individual, nenhuma enumeração<br />

de direitos protegidos pode ser considerada completa. (JO) Na era<br />

do rádio e da televisão, o problema do livre acesso à informação não é<br />

mais um problema de liberdade de imprensa. Numa era em que drogas<br />

ou técnicas psicológicas podem ser usadas para controlar as ações dos<br />

indivíduos, o problema do livre controle do nosso corpo não é mais<br />

uma questão de proteção contra restrições de ordem física. O problema<br />

da liberdade de ir e vir assume novo sentido quando as viagens ao es-<br />

30 Z. Giacommetti, Die Freiheitsrechtskataloge ais Kodijikation der Freiheit (Zurique,<br />

1955); também cf. M. Hauriou, Précis de droit constituiionnel (2? edição; Paris,<br />

1929), página 625, e F. Battaglia, Le Carte dei diritti (2? edição; Florença, 1946).<br />

As Salvaguardas da Liberdade Individual 263<br />

trangeiro se tornam impossíveis para aqueles a quem as autoridades de<br />

seu país se recusam a emitir um passaporte.<br />

A questão assume a máxima importância quando consideramos<br />

que possivelmente estejamos apenas no limiar de uma era na qual as<br />

possibilidades tecnológicas do controle da mente tendem a se desenvolver<br />

a largos passos e o que à primeira vista pode parecer um poder inócuo<br />

ou benéfico sobre a personalidade do indivíduo poderá ser usado<br />

pelo governo. As maiores ameaças à liberdade humana provavelmente<br />

ainda estejam por vir. Talvez não esteja longe o dia em que a autoridade,<br />

acrescentando à água dos nossos reservatórios drogas apropriadas<br />

ou por algum outro método semelhante, será capaz de levar à euforia<br />

ou deprimir, estimular ou paralisar as mentes de populações inteiras para<br />

seus próprios fins. < 31 l Para que as Declarações de Direitos não sejam<br />

meras formalidades, devemos reconhecer que sua intenção era proteger<br />

o indivíduo contra todàs as violações a sua liberdade e, portanto, devemos<br />

pressupor que elas contenham uma cláusula geral preservando da<br />

interferência governamental as imunidades que os indivíduos desfrutaram<br />

de fato no passado.<br />

Em última instância, essas garantias legats de certos direitos fundamentais<br />

nada mais são do que parte das salvaguardas da liberdade individu.al<br />

que o constitucionalismo proporciona e elas não podem dar<br />

maior segurança contra as violações da liberdade pelo legislativo do que<br />

as próprias constituições. Como vimos, elas podem apenas dar proteção<br />

contra ações imprevidentes e apressadas da legislação corrente e<br />

não podem evitar nenhuma supressão dos direitos pela ação deliberada<br />

do legislador supremo. A única salvaguarda contra isso é a consciência<br />

clara dos perigos por parte da opinião pública. Tais cláusulas são importantes<br />

principalmente porque imprimem na consciência do público<br />

o valor desses direitos individuais e os tornam parte de um credo político<br />

que o povo defenderá mesmo quando não entender totalmente seu<br />

significado.<br />

9. Condições de Interferência na Esfera Individual<br />

Até aqui, apresentamos as garantias da liberdade individual como<br />

se fossem direitos absolutos que nunca pudessem ser violados. Na realidade,<br />

elas significam apenas que a atividade normal da sociedade está<br />

baseada nelas e que qualquer desvio exige justificativa especial. Entretanto,<br />

os princípios mais fundamentais de uma sociedade livre talvez te-<br />

31 Se o leitor desejar um relato não excessivamente pessimista dos horrores que nos<br />

podem ameaçar, leia Aldous Huxley, Brave New World (Londres, 1932), e Brave New<br />

World Revisited (Londres, 1958); e, se quiser conhecer uma obra mais alarmante, que<br />

não pretende advertir mas expor um ideal "científico", ver B. F. Skinner, Walden Two<br />

(Nova Iorque, 1948).

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