26.06.2013 Views

OS FUNDAMENTOS DA LIBERDADE

OS FUNDAMENTOS DA LIBERDADE

OS FUNDAMENTOS DA LIBERDADE

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

414 Os Fundamentos da Liberdade<br />

a um constante rodízio, estes se agarram àquilo que têm e as propriedades<br />

alugadas são encaradas como bens inalienáveis da família, que são<br />

transmitidos de uma geração a outra, independentemente da necessidade.<br />

Os que herdam uma residência alugada normalmente estão em melhor<br />

situação do que se não tivessem herdado, enquanto uma proporção<br />

cada vez maior da população não consegue moradia, ou só pode<br />

obtê-la por meio de favores oficiais, ou de um sacrifício financeiro que<br />

mal pode suportar, ou ainda por meios ilegais ou desonestos < 3 ).<br />

Ao mesmo tempo, o proprietário perde o interesse em investir na<br />

manutenção de edifícios além da quantia que a lei lhe permite reaver<br />

dos inquilinos para tal fim. Em cidades como Paris, onde a inflação reduziu<br />

o valor real dos aluguéis a um vigésimo ou talvez menos do que<br />

eram, a deterioração sem precedentes dos imóveis é tão rápida, que sua<br />

recuperação será inviável por muitas décadas.<br />

Entretanto, não são os prejuízos materiais o mais grave problema.<br />

Em função do controle dos aluguéis, grandes segmentos das populações<br />

dos países ocidentais ficaram, na vida diária, sujeitos a medidas arbitrárias<br />

das autoridades e acostumaram-se a pedir permissão e a procurar<br />

orientação para as principais decisões. Chegaram ao ponto de considerar<br />

normal que o capital que financia sua casa lhes seja cedido gratuitamente<br />

por outrem e que o bem-estar econômico individual dependa<br />

do partido político no poder, o qual freqüentemente emprega seu controle<br />

sobre a habitação para favorecer os que o apóiam.<br />

Se hoje o respeito à propriedade, à lei e aos tribunais se encontra<br />

tão profundamente abalado, é porque a autoridade é constantemente<br />

chamada a decidir sobre os méritos relativos de necessidades, a alocar<br />

serviços essenciais e a dispor daquilo que teoricamente continua sendo<br />

propriedade privada, segundo seu julgamento em termos de prioridade<br />

no caso de diferentes necessidades individuais. Estabelecer, por exemplo,<br />

se "um proprietário, com a esposa inválida e três filhos pequenos,<br />

que deseja ocupar sua casa, seria mais prejudicado, se seu pedido fosse<br />

negado, do que o inquilino, com apenas um filho, mas com a sogra paralítica,<br />

se seu pedido fosse deferido", < 4 ) é um problema que não pode<br />

ser resolvido pelos princípios normais de justiça, mas apenas pela·inter-<br />

3 Cf. M. Friedman e G. J. Stigler, Roofs or Ceilings? (Nova Iorque: Foundation for<br />

Economic Education, 1946); B. de Jouvenel, No Vacancies (Nova Iorque: Foundation<br />

for Economic Education, 1948); R. F. Harrod, Are These Hardships Necessary? (Londres,<br />

1948); F. W. Pais h, "The Economics of Rent Restriction", Lloyds B. R., abril de<br />

1950, reproduzido na obra do mesmo autor Post- War Financial Problems (Londres,<br />

1950); W. Roepke, Wohnungszwangswirtschaft- ein europiiisches Problem (Düsseldorf,<br />

1951); A. Amonn, "Normalisierung der Wohnungswirtschaft in grundslltzlicher Sicht",<br />

Schweitzer Monatshefte, junho de 1953; e meus ensaios anteriores, Das Mieterschutzproblem<br />

(Viena, 1929) e "Wirkungen der Mietzinsbeschrllnkungen", Schriften des Vereins<br />

jür Sozialpolitik, Vol. CLXXXII (1929).<br />

4 O exemplo foi dado por F. W. Paish no ensaio citado na nota anterior, página 79.<br />

Habitação e Planejamento Urbano 415<br />

venção arbitrária da autoridade. Uma recente decisão do Tribunal Administrativo<br />

de Apelação alemão mostra-nos claramente quão grande é<br />

o poder que este tipo de controle confere às decisões mais importantes<br />

da nossa vida privada; este tribunal entendeu necessário declarar ilegal<br />

a recusa da repartição de intercâmbio de mão-de-obra de uma prefeitura<br />

local em encontrar trabalho para uma "pessoa residente em outro distrito,<br />

a menos que ela primeiramente obtivesse junto às autoridades da<br />

habitação licença para se mudar e promessa de residência - não porque<br />

nenhuma das duas autoridades tivesse competência para recusar seu pedido,<br />

mas porque a recusa implicava uma "inadmissível conjugação de<br />

interesses administrativos independentes". < 5 ) Sem dúvida, a coordenação<br />

das atividades de diferentes autoridades, tão desejada pelos planejadores,<br />

pode transformar decisões que normalmente se configurariam<br />

apenas como atos de arbitrariedade em poder despótico de controlar toda<br />

a vida dos indivíduos.<br />

3. O Sistema Público de Habitação<br />

Embora o controle de aluguéis, mesmo nos países em que vigora<br />

há muito tempo, ainda seja considerado medida de emergência que se<br />

tornou politicamente impossível abandonar, < 6 ) a iniciativa de reduzir o<br />

custo da habitação para os segmentos mais pobres da população, pela<br />

oferta de habitações pertencentes ao Estado e cedidas ou alugadas a um<br />

custo subsidiado à população ou por subvenções aos custos de construção,<br />

já é aceita como característica permanente do Estado previdenciário.<br />

Poucos entendem que, a menos que tal iniciativa seja cuidadosamente<br />

limitada em dimensão e método, provavelmente produzirá resultados<br />

muito semelhantes aos do controle dos aluguéis.<br />

O primeiro ponto a ser destacado é que qualquer grupo de pessoas<br />

que o governo pretenda auxiliar com habitações pertencentes ao Estado<br />

só será beneficiado se os órgãos oficiais cederem todas as novas residências<br />

de que esse grupo precisa. Se o governo oferecer apenas uma parte<br />

d'as residências necessárias, na realidade isto não constituiria um acréscimo,<br />

mas apenas uma substituição de parte da oferta do setor privado.<br />

Em segundo lugar, as moradias mais baratas fornecidas pelo governo<br />

terão de ser estritamente limitadas à classe que se pretende auxiliar; e,<br />

para atender meramente à busca de aluguéis mais baixos, o governo terá<br />

de fornecer número de residências consideravelmente maior do que a<br />

própria demanda da classe poderia comportar. Em terceiro lugar, esta<br />

limitação do sistema público de habitação às famílias mais pobres ge-<br />

5 E. Forsthoff, Lehrbuch des Verwaltungsrechts, I (Munique, 1950), 222.<br />

6 Tentativas determinadas e sistemáticas de abolir todo o sistema de controle de aluguéis<br />

só foram feitas recentemente na Grã-Btetanha e na Alemanha. Nos Estados Unidos,<br />

este tipo de controle ainda existe na cidade de Nova Iorque.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!