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OS FUNDAMENTOS DA LIBERDADE

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132 Os Fundamentos da Liberdade<br />

escolhemos um modo de vida, sempre temos de escolher também entre<br />

uma série de vantagens e desvantagens e, uma vez feita a opção, devemos<br />

estar preparados para aceitar certas desvantagens em nome de um<br />

maior benefício. Quem prefere receber uma renda constante em troca<br />

de sua atividade precisa dedicar suas horas de trabalho às tarefas imediatas<br />

que lhe são determinadas. E fazer o que lhe é ordenado é, para o<br />

assalariado, a condição essencial para alcançar este objetivo. No entanto,<br />

mesmo que isso lhe pareça às vezes profundamente desagradável,<br />

em condições normais ele não deixa de ser livre, ou seja, não está sendo<br />

coagido. É verdade que o risco ou sacrifício que L abandono do emprego<br />

implica freqüentemente são tão grandes, que o indivíduo continua<br />

nele, ainda que o deteste. Mas o mesmo ocorre em quase todas as ocupações,<br />

até as independentes.<br />

O essencial é que, numa sociedade competitiva, o assalariado não<br />

está à mercê de um empregador, exceto em períodos de considerável desemprego.<br />

Sabiamente, a lei não reconhece contratos permanentes de<br />

venda do trabalho do indivíduo e, em geral, nem faz valer os contratos<br />

temporários. Ninguém pode ser coagido a trabalhar sempre com determinado<br />

patrão, mesmo que se tenha comprometido a fazê-lo; e, em<br />

uma sociedade verdadeiramente competitiva, haverá outras alternativas<br />

de emprego, ainda que menos compensadoras. < 2 ><br />

Fica claro que a liberdade do assalariado depende da existência de<br />

grande número e variedade de empregadores quando comparamos esta<br />

situação àquela em que há apenas um empregador - o Estado - e na qual<br />

ter um emprego é o único meio legal de se ganhar a vida. A aplicação<br />

coerente de princípios socialistas, por mais que seja disfarçada em delegação<br />

do poder de empregar a corporações públicas só em nome independentes,<br />

e a outras empresas semelhantes, levaria, necessariamente, à<br />

existência de um único empregador. Agindo direta ou indiretamente,<br />

este empregador disporia de poder ilimitado de coagir o indivíduo.<br />

3. Os Padrões Morais do Assalariado<br />

A liberdade dos assalariados depende, portanto, da existência de<br />

um grupo de indivíduos cuja posição é diferente da sua. No entanto,<br />

numa democracia em que os assalariados formam a maioria, é sua concepção<br />

de vida que determina se tal grupo poderá ou não existir e desempenhar<br />

suas funções. As concepções dominantes serão as da grande<br />

maioria, cujos membros pertencem a organizações hierárquicas e prati-<br />

2 É importante lembrar que mesmo aqueles que, pela idade ou pelo caráter especializado<br />

de suas atividades, não podem, individualmente, pensar em mudança de posição,<br />

são amparados pela necessidade que tem o empregador de criar condições de trabalho que<br />

lhe assegurem o indispensável fluxo de nova mão-de-obra.<br />

O Assalariado e o Homem Independente 133<br />

camente desconhecem os problemas e opiniões que regem as relações<br />

entre as distintas unidades dentro das quais trabalham. Os padrões criados<br />

pelos indivíduos que compõem tal maioria podem contribuir para<br />

torná-los membros efetivos da sociedade, mas não podem ser aplicados<br />

ao conjunto da sociedade, sem implicar perda da liberdade.<br />

É inevitável que os interesses e valores dos assalariados sejam um<br />

tanto diferentes daqueles dos indivíduos que aceitam o risco e a responsabilidade<br />

de organizar o uso dos recursos. Um homem que trabalha<br />

sob a direção de outro por um salário fixo pode ser tão consciencioso,<br />

laborioso e inteligente quanto aquele que precisa escolher constantemente<br />

entre alternativas; mas dificilmente será tão criativo ou ousado,<br />

porque a margem de escolha em seu trabalho é mais restrita. < 3 > Normalmente,<br />

não se espera que ele desempenhe tarefas que não sejam prescritas,<br />

ou que não sejam convencionais. Ele não pode ir além do que lhe é<br />

confiado, ainda que seja capaz de realizar muito mais. Uma função<br />

prescrita é necessariamente limitada, restrita a uma esfera de ação e baseada<br />

em uma divisão de trabalho predeterminada.<br />

A condição de assalariado não afeta apenas a iniciativa e a inventividade<br />

de um indivíduo. Ele praticamente desconhece as responsabilidades<br />

daqueles que controlam os recursos e precisam preocupar-se<br />

constantemente com novas soluções e combinações; está pouco familiarizado<br />

com as atitudes e modos de vida decorrentes da necessidade de<br />

tomar decisões sobre o emprego da propriedade e da renda. Para o indivíduo<br />

independente não há distinção clara entre a vida privada e o trabalho,<br />

como ocorre com o assalariado que vendeu parte de seu tempo<br />

por um ganho fixo. Enquanto para o assalariado trabalhar significa<br />

adaptar-se a certa estrutura durante certo número de horas, para o indivíduo<br />

independente implica traçar e modificar continuamente seu plano<br />

de vida e descobrir soluções para problemas sempre novos. O indivíduo<br />

independente e o assalariado diferem fundamentalmente em seus pontos<br />

de vista a respeito do que se pode considerar renda, dos riscos a correr<br />

e do modo de vida a ser adotado tendo em vista o sucesso.<br />

A principal diferença entre os dois está, no entanto, no fato de que<br />

ambos têm opiniões distintas' quanto à maneira de determinar remunerações<br />

adequadas aos vários serviços: É difícil avaliar corretamente os<br />

serviços de um indivíduo que trabalha sob a supervisão de um chefe,<br />

3 Cf. a interessante análise destes problemas em E. Bieri, "Kritische Gedanken<br />

zum Wohlfahrtsstaat", Schweizer Monatschefte, XXXV (1956), especialmente 575:<br />

"Die Zahl der Unselbststiindigerwerbenden hat stark zugenommen, sowohl absolut wie<br />

prozentuell zu den Beschãftigten. Nun ist das Gefüht der Verantwortung für sich und die<br />

Zukunft bei den Setbststãndigerwerbenden aus naheliegenden Gründen tebhafter entwickelt;<br />

sie müssen auf tange Sicht planen und haben auch die Mõglichkeit, durch Geschick<br />

und Initiative für schlechte Zeiten vorzusorgen. Die Unselbststãndigerwerbenden hingegen,<br />

die in regetmãssigen Abstãnden ihren Lohn erhalten, haben ein anderes, statisches<br />

Lebensgefüht; sie planen selten auf tange Sicht, und erschrecken bei der geringsten<br />

Schwankung. Ihr Sinnen und Trachten ist auf Stabilitiit und Sicherheit gerichtet".

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