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OS FUNDAMENTOS DA LIBERDADE

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394 Os Fundamentos da Liberdade<br />

um tipo de sistema monetário que não exigisse controle deliberado.<br />

Particularmente, se os homens não tivessem passado a utilizar instrumentos<br />

de crédito como dinheiro, ou substitutos do dinheiro, provavelmente<br />

hoje poderíamos confiar em um mecanismo auto-regulador. (I)<br />

Hoje, todavia, esta possibilidade nos é vedada. Não conhecemos alternativas<br />

substancialmente diferentes para as instituições de crédito sobre<br />

as quais se fundamenta em grande parte a organização da moderna atividade<br />

econômica. Por outro lado, a evolução histórica criou condições<br />

em que a existência dessas instituições tornou necessário um controle<br />

deliberado dos sistemas conjugados de moeda e crédito. Além disso,<br />

outras circunstâncias, que não podemos certamente esperar mudar por<br />

uma simples alteração dos nossos sistemas monetários, tornam inevitável,<br />

por enquanto, que esse controle seja de modo geral exercido pelos<br />

governos. ( 2 ><br />

A situação decorre de três razões fundamentais de diferentes graus<br />

de generalidade e validade. A primeira refere-se à moeda em si, independentemente<br />

de situações históricas, e explica por que as alterações<br />

da oferta relativa de dinheiro têm efeito muito mais perturbador do que<br />

as transformações produzidas em qualquer uma das outras condições<br />

que influem em preços e produção. A segunda concerne a todos os sistemas<br />

monetários em que a oferta de dinlieiro está intimamente relacionada<br />

ao crédito - sistemas nos quais se baseia toda a economia moderna.<br />

E a terceira diz respeito ao volume atual dos gastos governamentais<br />

e é, portanto, uma condição que podemos eventualmente alterar, mas<br />

que por enquanto devemos aceitar em todas as decisões relativas à política<br />

monetária.<br />

O primeiro destes fatores faz o dinheiro representar uma espécie de<br />

"parafuso frouxo" do mecanismo de mercado, que, de outro modo,<br />

poderia autodirigir-se, parafuso que pode interferir nos mecanismos de<br />

ajustamento o bastante para causar a desorganização periódica da produção,<br />

a menos que este efeito seja antecipado e deliberadamente neu-<br />

I Cf. L. von Mises, Human Action (New Haven: Yale University Press, 1949), páginas<br />

429-445.<br />

2 Embora eu esteja convencido de que o moderno sistema bancário de crédito, da maneira<br />

como se desenvolveu, exige a criação de certas instituições públicas - a exemplo dos<br />

bancos centrais -, duvido que seja necessário ou mesmo conveniente que essas instituições<br />

(ou governo) detenham o monopólio da emissão de todos os tipos de moeda. O Estado<br />

tem, naturalmente, o direito de proteger a credibilidade da unidade monetária que ele (ou<br />

quem quer que seja) emite e, se emite "dólares", por exemplo, tem o direito de impedir<br />

que outros emitam moedas do mesmo nome. E, como é sua função fazer valer os contratos,<br />

ele deve também determinar qual é o "valor legal" para o pagamento de qualquer<br />

obrigação contraída. Porém, parece não haver razão para o Estado proibir o uso de outros<br />

instrumentos de troca, sejam eles mercadoria ou moeda emitida por outro organismo,<br />

nacional ou estrangeiro. Uma das medidas mais eficazes para se proteger a liberdade<br />

individual deveria ser, na verdade, a adoção de constituições que proíbam todas as restrições<br />

às transações em qualquer tipo de moeda ou metal precioso, em tempo de paz.<br />

A Estrutura Monetária 395<br />

tralizado. Isto ocorre porque a utilidade da moeda, ao contrário das<br />

mercadorias comuns, não está no fato de ela ser consumida, mas no fato<br />

de poder circular. Conseqüentemente, os efeitos de uma mudança na<br />

oferta de dinheiro (ou·na sua demanda) não levam diretamente a um<br />

novo equilíbrio. As alterações da base monetária são, num sentido todo<br />

particular, "auto-reversíveis". Se, por exemplo, um acréscimo ao estoque<br />

de dinheiro for inicialmente gasto em um bem ou serviço, não apenas<br />

criará nova demanda, temporária por natureza, como desencadeará<br />

uma série de conseqüências que inverterão os efeitos do aumento inicial<br />

da demanda. Os que primeiro receberem esse novo dinheiro irão gastálo<br />

em outras coisas. À semelhança das ondas provocadas por um seixo<br />

lançado na água, o aumento da demanda espalhar-se-á por todo o sistema<br />

econômico, alterando em cada ponto, temporariamente, os preços<br />

relativos; essa alteração persistirá, na medida em que a quantidade de<br />

dinheiro continuar crescendo, mas se inverterá assim que cessar esse<br />

crescimento. Exatamente o mesmo ocorrerá se qualquer parcela da base<br />

monetária for destruída, ou mesmo se a população começar a reter numerário<br />

em quantidades maiores ou menores em relação à sua receita e<br />

gastos do que faz normalmente. Cada transformação desse tipo provocará<br />

uma cadeia de alterações na demanda que não correspondem a<br />

uma mudança dos fatores reais subjacentes e "irão, portanto, causar<br />

modificações dos preços e da produção, perturbando o equilíbrio entre<br />

a oferta e a demanda. < 3 ><br />

Se, por esse motivo, as alterações da oferta monetária forem particularmente<br />

perturbadoras, esta oferta, nos nossos dias, será também<br />

capaz de mudar, com conseqüências prejudiciais. O que importa notar<br />

é que a proporção em que o dinheiro é gasto não deve flutuar de forma<br />

indevida. Isto significa que quando, em qualquer momento, as pessoas<br />

decidem alterar o volume de dinheiro em seu poder, em relação aos pagamentos<br />

feitos (ou, na linguagem dos economistas, quando elas resolvem<br />

optar por maior ou menor liquidez), a quantidade de dinheiro deveria<br />

ser alterada nas mesmas proporções. Seja qual for nossa-definição<br />

de "numerário", a propensão das pessoas a reter parte de seus recursos<br />

dessa forma está sujeita a consideráveis flutuações, tanto por períodos<br />

curtos quanto por períodos longos; e certas inovações espontâneas do<br />

mercado (como, por exemplo, os cartões de crédito e os cheques de viagem)<br />

podem afetá-la profundamente. Nenhum tipo de ajustamento automático<br />

da oferta de dinheiro é capaz de produzir as correções desejadas<br />

antes que tais alterações na demanda de dinheiro ou na oferta de<br />

3 As mais importantes dessas variações temporárias e auto-reversíveis da demanda<br />

que as alterações monetárias tendem a causar são as variações da demanda relativa de<br />

bens de consumo e de investimento; este assunto não pode ser tratado aqui sem uma abordagem<br />

de todas as polêmicas acerca da teoria dos ciclos econômicos.

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