Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
— …não queres acordar o dragão…<br />
Conseguia sentir o calor <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> si, um terrível ardor no ventre.<br />
O seu filho era alto e orgulhoso, com a pele acobreada <strong>de</strong> Drogo<br />
e o cabelo louro prateado <strong>de</strong>la, com olhos violeta em forma <strong>de</strong> amêndoas.<br />
E sorriu-lhe, e começou a erguer a mão na direcção da <strong>de</strong>la, mas<br />
quando abriu a boca o fogo jorrou. Viu o coração a ar<strong>de</strong>r-lhe no peito,<br />
e num instante ele <strong>de</strong>saparecera, consumido como uma traça por uma<br />
vela, transformado em cinzas. Chorou pelo filho, pela promessa <strong>de</strong> uma<br />
boca querida no seu seio, mas as lágrimas transformaram-se em vapor<br />
quando lhe tocaram a pele.<br />
— … queres acordar o dragão…<br />
Fantasmas alinhavam-se ao longo do corredor, vestidos com as vestes<br />
<strong>de</strong>sbotadas <strong>de</strong> reis. Nas mãos traziam espadas <strong>de</strong> fogo pálido. Tinham cabelos<br />
<strong>de</strong> prata, cabelos <strong>de</strong> ouro e cabelos brancos <strong>de</strong> platina, e os seus olhos<br />
eram <strong>de</strong> opala e ametista, <strong>de</strong> turmalina e ja<strong>de</strong>. “Mais <strong>de</strong>pressa”, gritaram<br />
“mais <strong>de</strong>pressa, mais <strong>de</strong>pressa”. Ela correu, com os pés a <strong>de</strong>rreter a pedra<br />
on<strong>de</strong> a tocavam. “Mais <strong>de</strong>pressa!” gritavam os fantasmas como se fossem<br />
um só, e ela gritou e atirou-se em frente. Uma gran<strong>de</strong> faca <strong>de</strong> dor rasgou-lhe<br />
as costas e sentiu a pele a abrir-se, cheirou o fedor <strong>de</strong> sangue a ar<strong>de</strong>r e viu a<br />
sombra <strong>de</strong> asas. E Daenerys Targaryen levantou voo.<br />
— … acordar o dragão…<br />
A porta erguia-se na sua frente, a porta vermelha, tão próxima, tão<br />
próxima, o corredor era uma mancha à sua volta, o frio ficava para trás.<br />
E agora já não havia pedra, e ela voava pelo mar dothraki, cada vez mais<br />
alto, com o ver<strong>de</strong> a ondular por baixo, e tudo o que vivia e respirava fugia<br />
aterrorizado da sombra das suas asas. Conseguia sentir o cheiro <strong>de</strong> casa,<br />
conseguia vê-la, ali, mesmo por trás daquela porta, campos ver<strong>de</strong>jantes e<br />
gran<strong>de</strong>s casas <strong>de</strong> pedra e braços que a mantivessem quente, ali. Escancarou<br />
a porta.<br />
— … o dragão…<br />
E viu o irmão Rhaegar, montado num garanhão tão negro como a<br />
sua armadura. Fogo cintilava, vermelho, através da fenda estreita da viseira<br />
do seu elmo. “O último dragão” sussurrou, ténue, a voz <strong>de</strong> Sor Jorah. “O<br />
último, o último.” Dany ergueu o polido visor negro do irmão. O rosto que<br />
estava lá <strong>de</strong>ntro era o <strong>de</strong>la.<br />
Depois daquilo, durante muito tempo, só houve dor, o fogo no seu<br />
interior, e os sussurros das estrelas.<br />
Acordou sentindo o sabor das cinzas.<br />
— Não — gemeu — por favor, não.<br />
— Khaleesi? — Jhiqui pairou sobre ela, uma corça assustada.<br />
A tenda estava ensopada em sombras, silenciosa e fechada. Flocos <strong>de</strong><br />
92