06.12.2012 Views

tese - vanda do vale arantes - ufmg - Biblioteca Digital de Teses e ...

tese - vanda do vale arantes - ufmg - Biblioteca Digital de Teses e ...

tese - vanda do vale arantes - ufmg - Biblioteca Digital de Teses e ...

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

No livro Território <strong>de</strong> Epidauro e Capítulos da história da Medicina e na conferência<br />

intitulada A Medicina <strong>de</strong> Os Lusíadas, Nava tratou da mescla <strong>de</strong> práticas <strong>de</strong> cura que se fizeram<br />

<strong>do</strong>minantes no perío<strong>do</strong> colonial e são sobreviventes em nossos dias. Tratamos da questão na<br />

comunicação “Medicina portuguesa nos escritos <strong>de</strong> Pedro Nava – uma introdução” 235 . Nesse<br />

texto, <strong>de</strong>stacamos a postura <strong>de</strong> Nava frente às práticas populares e <strong>de</strong> outras abordagens <strong>de</strong> cura.<br />

Ele consi<strong>de</strong>rou esse material apenas como curiosida<strong>de</strong> para o entendimento <strong>de</strong> costumes entre a<br />

população. Enten<strong>de</strong>u que, somente com as propostas iluministas, as luzes da razão começaram a<br />

aclarar a obscurida<strong>de</strong> das práticas <strong>de</strong> cura no mun<strong>do</strong> luso-brasileiro. Em Beira-mar, com<br />

curiosida<strong>de</strong> e humor, observou que, na enfermaria, os <strong>do</strong>entes expressavam-se em linguagem<br />

própria:<br />

137<br />

(...) Naquelas manhãs <strong>do</strong> Libânio aprendi nova língua – a interpretativa e<br />

pitoresca das pacientes, que eu tinha <strong>de</strong> traduzir para as papeletas. Ai! <strong>do</strong>utor,<br />

senti como se eu fosse um monte <strong>de</strong> gelo <strong>de</strong>rreten<strong>do</strong>, não vi mais nada e caí. A<br />

coisa em linguagem médica queria dizer: suores e lipotímia. Assim era feito com<br />

a série <strong>de</strong> figurações verbais que cada um usava para exprimir suas <strong>do</strong>res,<br />

agonias, aflições. Lembro as que guar<strong>de</strong>i para sempre. Tenho o tornozelo cheio<br />

<strong>de</strong> vidro moí<strong>do</strong>. Uma <strong>do</strong>r como se as carnes estivessem <strong>de</strong>spregan<strong>do</strong> <strong>do</strong>s meus<br />

ossos. Sinto um rebola<strong>do</strong> no joelho. Meu Deus, <strong>do</strong>utor! tenho sensação <strong>de</strong><br />

formigamento que vai da papada à ponta <strong>do</strong> pé e ao mesmo tempo parece que<br />

estão enchen<strong>do</strong> minha perna e minhas ca<strong>de</strong>ira que nem pneumático <strong>de</strong><br />

automóvel. Meu sangue tem pimenta. Tenho uma canga no pescoço e a cabeça<br />

feito mingau. Uma correria <strong>de</strong>ntro <strong>de</strong> mim. Sofro <strong>de</strong> fisgadas ardidas. Meu corpo<br />

fica feito bacia <strong>de</strong> saboada quan<strong>do</strong> as bolhas tão rebentan<strong>do</strong> – aí ele ar<strong>de</strong> e chia,<br />

bate to<strong>do</strong> por <strong>de</strong>ntro, e com perdão da má palavra, treme até na via da vagina.<br />

Tem estrelinhas <strong>de</strong> metal <strong>de</strong>baixo <strong>de</strong> minha pele. Uma corrente <strong>de</strong> ar nos ossos<br />

da perna afora. Me <strong>de</strong>u um ronco na cabeça. Isto tu<strong>do</strong> era preciso fazer repetir,<br />

perguntar como era, captar e afinal transcrever na linguagem técnica com que se<br />

classificam as <strong>do</strong>res, as aflições, as sensações falsas <strong>do</strong> ptiatismo, as parestesias<br />

revestidas <strong>de</strong> comparações fantasistas 236 .<br />

O último texto que recortaremos, o qual contém elementos sobre as experiências <strong>de</strong> Nava<br />

como acadêmico, em Beira-mar, trata da visão que o memorialista apren<strong>de</strong>u a ter sobre o corpo<br />

235 VALE, Vanda Arantes. Medicina portuguesa nos escritos <strong>de</strong> Pedro Nava – uma introdução. In: 2º COLÓQUIO<br />

DO POLO DE PESQUISA DAS RELAÇÕES LUSO-BRASILEIRAS, 2004, Rio <strong>de</strong> Janeiro. Anais... Rio <strong>de</strong> Janeiro:<br />

Real Gabinete Português <strong>de</strong> Leitura, 2004. Disponível em:<br />

. Acesso em: 20 ago. 2006.<br />

236 NAVA, Pedro. Beira-mar: memórias 4. 2. ed. Rio <strong>de</strong> Janeiro: José Olympio, 1979. p. 330-331.

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!