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RISCO E FUTURO DA

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Risco e futuro da democracia brasileira<br />

Direito e Política no Brasil contemporâneo<br />

120<br />

norte-americana tem permitido o instituto sob o argumento da “mutualidade<br />

de vantagens” para ambos os lados 44 . Há, ainda, o entendimento de que o<br />

direito subjetivo a um julgamento sob o instituto do contraditório (e, no caso<br />

norte-americano de maneira mais expressiva, sob um tribunal de júri) esse “direito”<br />

do qual o acusado/réu abre mão no momento em que faz o “contrato”<br />

de plea bargaining não seria propriamente um direito, mas uma prerrogativa<br />

(entitlement) que, explorada até as últimas consequências, poderia ser negociada<br />

e renunciada. 45<br />

Pelo viés do pragmatismo, argumenta-se que não fosse a plea bargaining<br />

as cortes estariam abarrotadas, não se poderia desbaratar tantas organizações<br />

criminosas, prender tantos malfeitores – erros e abusos seriam um<br />

“mal necessário”, um “mal menor” em nome da guerra contra o crime, a<br />

corrupção, o terrorismo, as drogas. Essa concepção do direito penal como<br />

uma guerra, uma batalha contra inimigos assustadores, é justamente algo<br />

que alguns estudiosos vêm apontando como deletério e perigoso em termos<br />

democráticos. Nesse paradigma, “as condenações são vistas como vitórias<br />

numa batalha, e não como a procura da verdade por um Judiciário neutro”,<br />

aponta a professora Jacqueline E. Ross, da Universidade de Illinois. (Ross,<br />

2006, p. 717). Justificam-se, a partir daí, mecanismos que visam obter o<br />

máximo possível de condenações, como se isso fosse um objetivo em si. Mecanismos<br />

que, para alguns, fazem parte de algo maior que o sistema jurídico<br />

penal. Pois o processo penal, assegura Alexandra Natapoff, pesquisadora e<br />

professora de Direito da Loyola Law School, de Los Angeles, é central no<br />

modo como se maneja a democracia. Em seu livro Snitching: criminal infor-<br />

44. Ross, 2006, p. 725. Tradução minha. A suposição desse modelo contratual é que ambas as partes contratantes<br />

estão no melhor juízo possível de seus próprios interesses. E quando não estão, devem e podem estar<br />

– basta que sejam introduzidas reformas pontuais para corrigir os “constrangimentos” à ação e aos “déficits” de<br />

informação dos “atores” individuais.<br />

45. Ross, 2006, p. 722. Crucial, aqui, a distinção, na língua inglesa, entre rights (direitos) e entitlements (geralmente,<br />

traduzível também por “direitos”, mas talvez mais afim à nossa acepção de “prerrogativas”). Rights<br />

(direitos) são universais, incondicionados, “naturais” e, portanto, irrenunciáveis. Entitlements são individuais,<br />

condicionados a uma situação específica, e eventualmente provisória, de seu detentor. Exemplo: “Undergraduate<br />

students are not entitled to run for postgraduation finance support” (estudantes não formados não têm direito a<br />

concorrer à ajuda financeira para pós-graduação). A distinção, porém, é sutil e é muito comum o uso das duas<br />

palavras como sinônimas. Ademais, considerar que o direito a um julgamento justo e imparcial, garantido inclusive<br />

pela sexta emenda à Constituição norte-americana, pode ser “negociado” até o ponto de sua total renúncia<br />

ecoa antigas e pré-modernas concepções de justificação da escravidão, por exemplo, que desconsideravam o fato<br />

de que certos direitos humanos são pura e simplesmente inegociáveis e irrenunciáveis.

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