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RISCO E FUTURO DA

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Risco e futuro da democracia brasileira<br />

Direito e Política no Brasil contemporâneo<br />

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desejo de que ocorresse o contrário. Assim, esses constituintes não se encontram<br />

na mesma posição das pessoas que estão expressando suas ideias durante uma<br />

conversa, pois eles estão decidindo votar a favor de um texto cuja interpretação<br />

pode vir a ser contrária a seus desejos. Isso nos ajuda a concluir que a ausência<br />

de discussão sobre as relações homossexuais na Constituinte não é suficiente<br />

para comprovar que havia a “intenção” de excluí-las do âmbito da união estável.<br />

Imaginemos agora um constituinte que, nas fases iniciais da Assembleia, tenha<br />

defendido uma emenda estabelecendo que a família se constitui exclusivamente<br />

por meio do casamento. Após a derrota dessa proposição, ele vota a favor do<br />

texto final do art. 226, § 3º, na medida em que o dispositivo prevê que a lei deve<br />

facilitar a conversão da união estável em casamento. Nesse caso, também pode<br />

haver um conflito entre expectativas e desejos: o constituinte pode desejar que a<br />

regulamentação da união estável não venha a ser feita, mantendo, na prática, a<br />

exclusividade do casamento como forma de constituição da família, embora ele<br />

preveja que o legislador regulamentará o dispositivo constitucional.<br />

Nesses exemplos de disjunção entre expectativas e desejos, qual deveria<br />

ser a opção do intérprete? Seria fácil cogitar que os desejos manifestam de<br />

modo mais autêntico a intenção do legislador (Dworkin, 1999, p. 388), porém,<br />

como vimos no segundo exemplo, alguns desses desejos podem não ser<br />

considerados válidos pelo direito, uma vez que negam eficácia à Constituição.<br />

De modo similar, também não poderia ser admitida uma interpretação fundada<br />

no argumento de que o constituinte, embora não se opusesse à união homoafetiva,<br />

votasse contra uma eventual proposta de reconhecimento porque<br />

seu desejo é que a rejeição da proposta o ajude a ser reeleito por um eleitorado<br />

fortemente conservador em temas envolvendo a família. Isso significa que o<br />

intérprete deve se orientar pelas expectativas do legislador? Essa conclusão<br />

tampouco pode ser obtida quando percebemos que essas expectativas representam,<br />

na maioria dos casos, uma previsão sobre como a norma será interpretada<br />

pelos juízes, o que nos colocaria em uma situação demasiadamente<br />

hipotética: o fundamento da decisão judicial seria aquilo que o juiz imagina<br />

que o legislador teria imaginado sobre como ele decidiria um caso (Dworkin,<br />

1999, p. 389). Além da possível divergência entre as expectativas e os desejos<br />

dos legisladores, outra situação é ainda mais previsível: os constituintes,

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