a sociedade portuguesa da segunda metade do século xviii
a sociedade portuguesa da segunda metade do século xviii
a sociedade portuguesa da segunda metade do século xviii
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
Regime, então as representações conti<strong>da</strong>s nela eram basea<strong>da</strong>s nas<br />
aparências.<br />
Sennett afirmou que “não havia separação entre o teatro e a rua”, que<br />
ambos mostravam uma ênfase na representação de papéis. 43 Saben<strong>do</strong>-se<br />
disso, é difícil descobrir quem imitou quem: levan<strong>do</strong> em consideração que a<br />
<strong>socie<strong>da</strong>de</strong> está em perpétua mutação, e que o teatro já existia há muito tempo,<br />
afinal quem emulava o comportamento um <strong>do</strong> outro, a <strong>socie<strong>da</strong>de</strong> ou o teatro?<br />
Por um la<strong>do</strong>, nota-se que o teatro era feito para o povo, visan<strong>do</strong> atrair públicos,<br />
e por isso tentava agra<strong>da</strong>r estes públicos. Na<strong>da</strong> mais natural de que ele<br />
emulasse a mentali<strong>da</strong>de “<strong>da</strong>s ruas”. Por outro la<strong>do</strong>, como aponta<strong>do</strong> por<br />
Sennett 44 e Elias, 45 a <strong>socie<strong>da</strong>de</strong> européia <strong>do</strong> <strong>século</strong> XVIII começou a nortear as<br />
suas relações sociais basea<strong>da</strong>s na forma de como se <strong>da</strong>vam no teatro. Sennett<br />
inclusive cita fontes <strong>da</strong> época em que se constata que “não havia mais<br />
separação entre o teatro e a rua”. Assim como ocorria com os atores, os<br />
indivíduos também a<strong>do</strong>tavam um figurino que os fizesse representar um papel<br />
na <strong>socie<strong>da</strong>de</strong>. É então que se consegue entender melhor a importância em se<br />
reservar certos tipos de vestuários e de atuações em público para<br />
determina<strong>da</strong>s classes sociais, ao se notar que a própria vi<strong>da</strong> em público era<br />
vista como um teatro, como uma representação. Assim como o ator buscava<br />
obter a credibili<strong>da</strong>de <strong>do</strong> papel que representava (por exemplo, se estivesse<br />
representan<strong>do</strong> um fi<strong>da</strong>lgo, deveria fazer parecer ao público que era um fi<strong>da</strong>lgo),<br />
o indivíduo deveria fazer parecer para os outros que ele era quem era (um<br />
fi<strong>da</strong>lgo de ver<strong>da</strong>de deveria proceder como o ator, tanto no discurso como na<br />
aparência).<br />
Sennett ain<strong>da</strong> teve mais observações interessantes no tocante à idéia de<br />
“ver o mun<strong>do</strong> como um palco”. Ele percebeu que ao se transformar em um ator<br />
<strong>do</strong> âmbito público, o indivíduo acaba por provocar uma espécie de divórcio<br />
entre suas ações e sua natureza. 46 Isto tornava a morali<strong>da</strong>de presente na<br />
<strong>socie<strong>da</strong>de</strong> mais leve, e com isso o indivíduo “se divertia mais”. Como o caráter<br />
<strong>da</strong>s ações e o caráter <strong>do</strong>s atores eram separa<strong>do</strong>s, se tornou possível que se<br />
43<br />
SENNETT, R. O declínio <strong>do</strong> homem público, as tiranias <strong>da</strong> intimi<strong>da</strong>de, São Paulo, 1988. p.94<br />
44<br />
Ibidem, p. 97<br />
45<br />
ELIAS, Norbert. A <strong>socie<strong>da</strong>de</strong> de corte. Rio de Janeiro, 2001.p. 115<br />
46<br />
SENNETT, R. O declínio <strong>do</strong> homem público, as tiranias <strong>da</strong> intimi<strong>da</strong>de, São Paulo, 1988. p. 141<br />
19