a sociedade portuguesa da segunda metade do século xviii
a sociedade portuguesa da segunda metade do século xviii
a sociedade portuguesa da segunda metade do século xviii
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
uma dádiva. O cria<strong>do</strong> não hesitava em mu<strong>da</strong>r os seus atos e a quem apóia em<br />
benefício próprio.<br />
Em Chocalho <strong>do</strong>s anos de Dona Lesma, de Leonar<strong>do</strong> José Pimenta e<br />
Antas, vemos um caso que demonstra a razão <strong>da</strong> subordinação <strong>do</strong>s filhos<br />
diante <strong>do</strong> pai. No enre<strong>do</strong> deste entremez, temos Valentim, descrito como<br />
“peralta”, que é filho de Severino. Desaponta<strong>do</strong> com as “peraltices”, Severino<br />
mostra sua determinação em punir o filho com o açoite para que ele “se<br />
alinhasse”. Valentim, por sua vez, mostra-se arrependi<strong>do</strong>, e promete ao pai que<br />
vai se “endireitar”.<br />
Sev. Não faltarei às leis <strong>da</strong> humani<strong>da</strong>de:foste insolente, castigar-te<br />
quero,cumprin<strong>do</strong> a obrigação de pai severo.<br />
Val. Eu prometo, meu pai, de me emen<strong>da</strong>r.<br />
Sev. Olhe bem o que dizes.<br />
Val. Se eu faltar, use <strong>do</strong> seu rigor,mate-me agora. 196<br />
Outro entremez, Amor artífice, de Antonio Rodrigues Galhar<strong>do</strong>,<br />
apresenta outro enre<strong>do</strong> típico: <strong>do</strong>is jovens amantes e seus respectivos cria<strong>do</strong>s,<br />
sen<strong>do</strong> o obstáculo a ser supera<strong>do</strong>, o personagem <strong>do</strong> tutor <strong>da</strong> jovem, que quer<br />
casá-la com um “homem de bem”. Esta jovem não se conforma com a<br />
situação.<br />
Caz. Pérfi<strong>do</strong> e cruel destino, baste já de ser tyranno, e o falso, que<br />
me despreza, mu<strong>da</strong>-lhe o gênio de ingrato. Sempre vem por estas<br />
horas,falar a seu bem ama<strong>do</strong>, que me rouba os seus affectos, e me<br />
expõem a tanto <strong>da</strong>mno, quan<strong>do</strong> experimento no exame, opprimi<strong>da</strong><br />
de mil sustos, e cerca<strong>da</strong> de cui<strong>da</strong><strong>do</strong>s. 197<br />
Através de uma armação, Leandro e seu cria<strong>do</strong> Pelaio conseguem ter a<br />
aprovação de Geronte, o tutor, para casar-se com Cazimira. Mais uma vez, os<br />
cria<strong>do</strong>s agem como subalternos confidentes, agin<strong>do</strong> nos basti<strong>do</strong>res, conforme<br />
a vontade de seus patrões, e Pelaio consegue, como recompensa pelos seus<br />
esforços, a união com a cria<strong>da</strong> de Cazimira. Nota-se a autori<strong>da</strong>de incontestável<br />
<strong>da</strong> figura <strong>do</strong> tutor (personagem raro, na maioria <strong>da</strong>s vezes o personagem é o<br />
pai <strong>da</strong> moça). Não importa se é injusto ou tirano, ele está em nível hierárquico<br />
superior e é necessário que se obtenha sua aprovação para se faça algo que<br />
196 ANTAS, L. J. P. Chocalho <strong>do</strong>s anos de Dona Lesma. Lisboa. 1783. ps. 13-14<br />
197 GALHARDO, A.R. Amor artífice. Lisboa. 1782. p. 9<br />
55