Lovisolo. Mulheres e esporte: processo civilizador ou (des) civilizador.costumes decentes foi uma das formas nativas em se pensar e gestar o processocivilizador. Ao invés de cruzar a espada ou o punhal pode se realizar uma lutade boxe com regras e, finalmente, ao invés da luta real e da mimética contratarum bom advogado. Ao invés de sermos felizes aqui e agora poderemos empurrara felicidade para o futuro criando, no presente, suas condições. A esperançacivilizatória dos conservacionistas reside em acreditar que podemos renunciara vantagens do presente para garantir o futuro.Sob o ponto de vista o dos argumentos retóricos sobre as esperanças epropostas morais, gostaria que entendêssemos a teoria de Elias como um refinamentoteórico e empírico daquilo que circulava nas consciências do públicoe dos formadores de opinião fazia já bastante tempo, claramente a partir doséculo XVIII e, especialmente pelo seu impacto, na obra de Adams Smith. Oentendimento da teoria social como refinamento não implica nenhum tipo deminimização ou descrédito de seu labor como historiador e cientista social. Defato, creio que a maioria das teorias sociais se podem entender como refinamentode reflexões e argumentos, sobretudo morais, que circulam nas marchase contramarchas do sentido comum, do bom sentido comum. A obra de Elias,para mim, é um valioso exemplo de refinamento teórico.A circularidade das influências, entre as afirmações nativas e as dos eruditos,retomada argutamente por Baktin, creio que hoje se tornou um princípioativo e consensual no entendimento do social. Antes de Baktin, Borgesentendeu que a literatura gauchesca argentina era produto, não da criação dosgaúchos, mas do trabalho de intelectuais sobre ela. Talvez a ciência social sejaapenas isso: um refinamento metodologicamente controlado de opiniões sociais,como Rorty explicitou. Assim, ao invés de fundamentar os conhecimentoscientíficos do social na ruptura, o faríamos a partir do refinamento decontinuidades com a moral e o sentido comum. O rigor no tratamento deveocupar, então, o lugar da ruptura revolucionária tão proclamada, com fundamentonas elaborações de Gaston Bachelar, feitas a partir da física, porém, comgrande êxito no campo das ciências sociais e humanas e, sobretudo, no marxismoestruturalista francês cujo ícone foi Althousser com suas teorias sobre osaparelhos do Estado.Esferas e transversalidadeUma segunda idéia de Elias que considero importante é a que denominode visão transversal. As ciências sociais nos acostumaram, a partir da divisãodisciplinar, a observar o social como se fossem esferas, instâncias ou práticasseparadas. Por vezes, o estudo de uma esfera, a econômica ou a política, porexemplo, parece que pode ser feito sem a recorrência a aquilo que ocorre nasoutras ou, simplesmente, considerando-as enquanto contexto daquela esferaque focamos. Creio que Elias nos acostumou a pensar uma visão transversalprocurando a correspondência de padrões ou valores que vigorariam em váriasesferas, tanto na procura de concomitâncias quanto de temporalidades e modosespecíficos. Os que estudam esportes destacam sua análise da correspondênciade valores ou padrões entre a esfera política e a esportiva na Inglaterra,LOGOS <strong>33</strong>Comunicação e Esporte. Vol.17, Nº02, 2º semestre 201031
Lovisolo. Mulheres e esporte: processo civilizador ou (des) civilizador.no surgimento do esporte moderno. Na esfera política, os inimigos que deviamser destruídos se tornam adversários e a aceitação do rodízio no poder vira regrado funcionamento democrático. Na esfera do esporte alguma coisa semelhanteocorre, trata-se de lidar e ganhar dos adversários aceitando o rodízio no pódio.De fato, esta análise geral da luta ou guerra domesticada, civilizada ou “organizada”teria como horizonte comparativo de referência a própria guerra. A competiçãoregrada na esfera econômica, política, esportiva e cultural substituiriao uso da violência que, na clássica análise weberiana, passará a ter apenas porator legítimo o Estado. Os que adotam a teoria de Elias e suas categorias textualmentepoderão usar a linguagem das figurações e configurações. Contudo,os processos não são lineares e podem exigir exercícios conceptuais finos paraentendermos os “barulhos” que provoca a interdependência crescente.De modo geral, os inimigos se tornam adversários ou competidores e a“festa das espadas” será substituída por jogos emocionantes, porém, regradose que eliminam ou reduzem a destruição de pessoas e poses. As lutas, pelosobjetos valiosos de cada campo, serão civilizadas ou “organizadas” por padrõesou valores semelhantes que os atravessam. A guerra real, a emocionante “festadas espadas”, cederá seu lugar para as emoções miméticas. Observemos, novamente,que o comércio foi visto, por vários autores, como força pacificadora oucivilizadora. Os comerciantes não poderiam comerciar no meio da violência daguerra, analogia ou forma semelhante da suspensão da guerra entre os gregospara a realização de suas olimpíadas.Sem a idéia da transversalidade de padrões ou valores seria difícil, mesmoimpossível, entender o processo civilizador como processo geral do Ocidente.Processo que ocorre no tempo e que pode ter ritmo próprio em cada esfera.Mulheres, inclusão geral e segregação no esporteCreio que agora posso entrar em meu problema. Parece-me que pelomenos faz três séculos a mulher foi posta na representação como a parte menosviolenta, mais civilizada ou “organizada” da sociedade. Foram construídos argumentos,não raro baseados em afirmações supostamente científicas sobre asdiferenças naturais, pelos quais os valores dos guerreiros e da guerra pertenciamaos homens, eram de sua natureza. Os lugares protegidos, como o lar, eramprioritariamente para e das mulheres. Homens em bando caçando, mulheresem grupo nos acampamentos colhendo frutos da natureza e da sociabilidade.Os militares homens não desejavam partilhar suas habilidades guerreiras nemcom os civis homens nem com as mulheres.Devemos ressaltar que a descrição científica de uma natureza não é automaticamentevalor a ser procurado na formação. Dawkins, por exemplo, postulaque por estarmos comandados naturalmente pelo “gene egoísta” devemoseducar no valor do altruísmo (que até pode ser negativo para o indivíduo,porém positivo para a população). Assim, a descrição da natureza humanapode nos levar tanto a práticas que tentam seu desenvolvimento quanto àquelasque lhe são contrárias, quando as características da natureza não podem setornar valor nem moralidade de funcionamento do social. Em outras palavras,LOGOS <strong>33</strong>Comunicação e Esporte. Vol.17, Nº02, 2º semestre 201032
- Page 3 and 4: CATALOGAÇÃO NA FONTEUERJ/Rede Sir
- Page 5 and 6: LOGOS - EDIÇÃO Nº 33 - VOL 17, N
- Page 7 and 8: 165176191Temas LivresTango, Samba e
- Page 9 and 10: De qualquer modo, a iniciativa da L
- Page 11 and 12: Estudos Sociais do Esporte:vicissit
- Page 13 and 14: Gastaldo. Estudos Sociais do Esport
- Page 15 and 16: Gastaldo. Estudos Sociais do Esport
- Page 17 and 18: Gastaldo. Estudos Sociais do Esport
- Page 19 and 20: Gastaldo. Estudos Sociais do Esport
- Page 21 and 22: Futebol (argentino) pela TV: entre
- Page 23 and 24: Alabarces e Duek. Fútbol (argentin
- Page 25 and 26: Alabarces e Duek. Fútbol (argentin
- Page 27 and 28: Alabarces e Duek. Fútbol (argentin
- Page 29 and 30: Alabarces e Duek. Fútbol (argentin
- Page 31 and 32: Alabarces e Duek. Fútbol (argentin
- Page 33 and 34: Alabarces e Duek. Fútbol (argentin
- Page 35: Lovisolo. Mulheres e esporte: proce
- Page 39 and 40: Lovisolo. Mulheres e esporte: proce
- Page 41 and 42: Lovisolo. Mulheres e esporte: proce
- Page 43 and 44: Lovisolo. Mulheres e esporte: proce
- Page 45 and 46: Marques. A função autor e a crôn
- Page 47 and 48: Marques. A função autor e a crôn
- Page 49 and 50: Marques. A função autor e a crôn
- Page 51 and 52: Marques. A função autor e a crôn
- Page 53 and 54: Marques. A função autor e a crôn
- Page 55 and 56: Marques. A função autor e a crôn
- Page 57 and 58: Aguiar e Prochnik.Quanto vale uma p
- Page 59 and 60: Aguiar e Prochnik.Quanto vale uma p
- Page 61 and 62: Aguiar e Prochnik.Quanto vale uma p
- Page 63 and 64: Aguiar e Prochnik.Quanto vale uma p
- Page 65 and 66: Aguiar e Prochnik.Quanto vale uma p
- Page 67 and 68: Aguiar e Prochnik.Quanto vale uma p
- Page 69 and 70: Aguiar e Prochnik.Quanto vale uma p
- Page 71 and 72: Costa. Futebol folhetinizado. A imp
- Page 73 and 74: Costa. Futebol folhetinizado. A imp
- Page 75 and 76: Costa. Futebol folhetinizado. A imp
- Page 77 and 78: Costa. Futebol folhetinizado. A imp
- Page 79 and 80: Costa. Futebol folhetinizado. A imp
- Page 81 and 82: Costa. Futebol folhetinizado. A imp
- Page 83 and 84: A visão bipolar do pódio:olímpic
- Page 85 and 86: Novais. A visão bipolar do pódio:
- Page 87 and 88:
Novais. A visão bipolar do pódio:
- Page 89 and 90:
Novais. A visão bipolar do pódio:
- Page 91 and 92:
Novais. A visão bipolar do pódio:
- Page 93 and 94:
Novais. A visão bipolar do pódio:
- Page 95 and 96:
O surfe brasileiro e as mídiassono
- Page 97 and 98:
Fortes. O surfe brasileiro e as mí
- Page 99 and 100:
Fortes. O surfe brasileiro e as mí
- Page 101 and 102:
Fortes. O surfe brasileiro e as mí
- Page 103 and 104:
Fortes. O surfe brasileiro e as mí
- Page 105 and 106:
Fortes. O surfe brasileiro e as mí
- Page 107 and 108:
Fortes. O surfe brasileiro e as mí
- Page 109 and 110:
Fortes. O surfe brasileiro e as mí
- Page 111 and 112:
Blogs futebolísticos no Brasil e n
- Page 113 and 114:
Prudkin. Blogs futbolísticos en el
- Page 115 and 116:
Prudkin. Blogs futbolísticos en el
- Page 117 and 118:
Prudkin. Blogs futbolísticos en el
- Page 119 and 120:
Prudkin. Blogs futbolísticos en el
- Page 121 and 122:
Prudkin. Blogs futbolísticos en el
- Page 123 and 124:
Prudkin. Blogs futbolísticos en el
- Page 125 and 126:
Prudkin. Blogs futbolísticos en el
- Page 127 and 128:
Prudkin. Blogs futbolísticos en el
- Page 129 and 130:
O agendamento midiáticoesportivo:c
- Page 131 and 132:
Mezzaroba e Pires. O agendamento mi
- Page 133 and 134:
Mezzaroba e Pires. O agendamento mi
- Page 135 and 136:
Mezzaroba e Pires. O agendamento mi
- Page 137 and 138:
Mezzaroba e Pires. O agendamento mi
- Page 139 and 140:
Mezzaroba e Pires. O agendamento mi
- Page 141 and 142:
Mezzaroba e Pires. O agendamento mi
- Page 143 and 144:
Silveira e Esteves. Entre a memóri
- Page 145 and 146:
Silveira e Esteves. Entre a memóri
- Page 147 and 148:
Silveira e Esteves. Entre a memóri
- Page 149 and 150:
Silveira e Esteves. Entre a memóri
- Page 151 and 152:
Silveira e Esteves. Entre a memóri
- Page 153 and 154:
Silveira e Esteves. Entre a memóri
- Page 155 and 156:
Silveira e Esteves. Entre a memóri
- Page 157 and 158:
Maia e Oliveira. Futebol, Identidad
- Page 159 and 160:
Maia e Oliveira. Futebol, Identidad
- Page 161 and 162:
Maia e Oliveira. Futebol, Identidad
- Page 163:
Maia e Oliveira. Futebol, Identidad
- Page 166 and 167:
Maia e Oliveira. Futebol, Identidad
- Page 168 and 169:
Maia e Oliveira. Futebol, Identidad
- Page 170 and 171:
Tango, Samba e IdentidadesNacionais
- Page 172 and 173:
Helal e Lovisolo.Tango, Samba e Ide
- Page 174 and 175:
Helal e Lovisolo.Tango, Samba e Ide
- Page 176 and 177:
Helal e Lovisolo.Tango, Samba e Ide
- Page 178 and 179:
Helal e Lovisolo.Tango, Samba e Ide
- Page 180 and 181:
Helal e Lovisolo.Tango, Samba e Ide
- Page 182 and 183:
Caiafa. Segunda Linha: comunicaçã
- Page 184 and 185:
Caiafa. Segunda Linha: comunicaçã
- Page 186 and 187:
Caiafa. Segunda Linha: comunicaçã
- Page 188 and 189:
Caiafa. Segunda Linha: comunicaçã
- Page 190 and 191:
Caiafa. Segunda Linha: comunicaçã
- Page 192 and 193:
Caiafa. Segunda Linha: comunicaçã
- Page 194 and 195:
Caiafa. Segunda Linha: comunicaçã
- Page 196 and 197:
Apontamentos sobre a relaçãoentre
- Page 198 and 199:
Maia e Pereira. Apontamentos sobre
- Page 200 and 201:
Maia e Pereira. Apontamentos sobre
- Page 202 and 203:
Maia e Pereira. Apontamentos sobre
- Page 204 and 205:
Maia e Pereira. Apontamentos sobre
- Page 206 and 207:
Maia e Pereira. Apontamentos sobre