Lovisolo. Mulheres e esporte: processo civilizador ou (des) civilizador.podemos escolher seguir os determinantes naturais ou ir contra eles em direçõesmais civilizadas.Uma história que considero imaginativa é a que monta um cenário, queteria dominado durante milhares de anos, onde os homens eram caçadores eguerreiros e as mulheres nos acampamentos colhiam alimentos, criavam osfilhos e eram ativas no falatório que se tornaria gritaria nas situações de perigo.Os caçadores deviam ser silenciosos, rápidos, eficientes no ataque, furtivos eassertivos. Vejam, por exemplo, o filme O ultimo dos moicanos. A coragem e aviolência na destruição dos inimigos foram e continuaram a ser, embora emtrajetória declinante, valores admirados na formação dos homens. As mulheresaté hoje nos superariam na capacidade de usar a linguagem e de expressarcom elas suas emoções (talvez resultado do exercício do parloteio, do apego apessoas e coisas e da gestualidade afetuosa). Rousseau foi duramente criticadopor estabelecer diferenças na educação de homens e mulheres. O Emílio e AHeloísa são os testemunhos das diferenças. Um exemplo mais recente seria avisão da mulher como doce mãezinha que os autores da educação física daprimeira metade do século XIX utilizavam para alijar as mulheres dos esportesde contato físico mais ou menos forte ou violento, como as lutas, o futebol eo rúgbi, para mencionar apenas alguns dos mais citados. No Brasil, sempre élembrada a proibição legal, derrogada faz algumas décadas atrás, para as mulheresparticiparem desse tipo de esportes.Parece-me bastante claro que nos autores da educação física partilhavasea idéia de que os esportes de contato, incluído as lutas, podiam funcionarcomo civilizadores e formadores do caráter dos homens. A prática das lutasregradas, a mimese da guerra, seria civilizadora para os homens, formados emséculos de tradições de guerreiros e caçadores, amantes da festa das espadas, efortemente potenciados e excitados pela carne, álcool, drogas, morte e sangue.O paroxismo da guerra podia ser civilizado pelo esporte que, não por acaso,pune a utilização de drogas que o potenciam e excitam. O fair play, sob a perspectivacivilizadora, aparece, sobretudo, como aquilo que diferencia e separada conduta na guerra. Colocar a bola fora do campo quando um adversárionão se levanta é um gesto metonímico e icônico do fair play no futebol. Creioque, em relação às mulheres, a prática desses esportes era considerada comouma espécie de retrocesso: processos (des) civilizadores e corrosivos das docesvirtudes do caráter feminino, associadas ao carinho, aos cuidados, à fala e aessa imagem tão valorizada: a de mãe. As mulheres igualitaristas, no entanto,podiam interpretar tal gesto como exclusão, como desigualdade. O feminismopodia lutar contra essas proteções ou proibições.Estamos no terreno das construções sociais. Os e as desconstrutivistasdiriam que os homens imaginaram a natureza feminina como eles a desejavame não como ela seria de fato ou significaram aspectos naturais enquanto orientaçõessociais. Melhor dizendo, um construtivista conseqüente diria que talnatureza não existe, portanto, qualquer afirmação sobre ela é mera construçãoque pode ter por fundamento apenas a vontade de poder sobre as mulheres.Observo, apenas de passagem, que os e as construtivistas parecem ter umaLOGOS <strong>33</strong>Comunicação e Esporte. Vol.17, Nº02, 2º semestre 2010<strong>33</strong>
Lovisolo. Mulheres e esporte: processo civilizador ou (des) civilizador.forte associação com os funcionalistas: as construções dos homens são funcionaispara a ordem patriarcal e o domínio sobre as mulheres. Em contrapartida,se poderia argumentar que o paternalismo masculino outorgou vantagensàs mulheres entendidas como forma de proteção em campos variados comoaposentadorias, licenças especiais nos dias de menstruação e de parto e a nãoparticipação do serviço militar obrigatório, dentre outras. Em outras palavras,o paternalismo parece estar obrigado ou se obrigar a negociar a manutençãodo poder (hipótese do poder) ou apenas outorgar vantagens a partir de suasnarrativas ou representações sobre a natureza feminina (hipótese da proteção).A proteção da mulher implica o reconhecimento de ambigüidades nopaternalismo protetor ou, pelo menos, uma funcionalidade mais complexa oumediada. Algumas medidas, por exemplo, podem ser entendidas como proteçãoda prole mediante benefícios concedidos às mulheres. Assim, as relaçõesentre o domínio/poder, a proteção e a outorga de vantagens para as mulheresmerecem ser mais e melhor trabalhada. Este tema complexo mereceria tratamentosmais refinados não sendo esta a oportunidade para os mesmos.O feminismo tem uma estreita relação com a crítica construtivista. Nocampo dos esportes, as feministas defenderam o direito a participar de qualquermodalidade esportiva e assim afirmaram a negação das diferenças naturaiscomo significativas. Não renegaram nem as artes marciais nem o boxe eassim tivemos um filme tão excepcional como Menina de ouro. Em minha últimaviagem a Buenos Aires fiquei assombrado olhando para cartazes de lutasde boxe cujos protagonistas eram mulheres e, o local, o velho e machista LunaPark. Também fiquei pasmo por serem os preços dos ingressos semelhantes aosque vigoram nas lutas masculinas.Posso agora colocar meu paradoxo. Quando pensamos o esporte a partirdo gênero parece que há evidências consideráveis que levam a pensar que asmodalidades esportivas, mesmo as de contato e com graus relativos de violências,foram crescentemente vistas como civilizadoras no caso dos homens.No caso das mulheres, muitos desses esportes foram vistos como contrários ànatureza feminina e, mais ainda, como masculinizantes e como fatores quepodiam ajudar a desenvolver a violência entre as mulheres. Assim, os esportesteriam para os homens, pelo seu poder mimético, a capacidade de torná-losmais civilizados. No caso das mulheres poderia agir na direção contrária daflecha civilizatória.Observo que a inclusão das mulheres no mercado de trabalho, na política,na educação e em outras esferas foi realizada de forma competitiva comos homens, ou seja, de forma não segregada. As mulheres disputaram com oshomens, lado a lado e de forma crescente, os postos de trabalho, os concursospúblicos e privados, os vestibulares universitários, as vagas no exército ena polícia e passaram a agir juntamente com os homens. Abandonamos combastante rapidez o ensino e o trabalho que separava ou segregava por gênero.Claramente, a não separação na concorrência e no desempenho se tornou regrae tendência. As feministas apresentam tal processo como resultado de suasprédicas, reivindicações e organização para a ação. Na descrição de Marx doLOGOS <strong>33</strong>Comunicação e Esporte. Vol.17, Nº02, 2º semestre 201034
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