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cruphoto/iStock<br />
500 anos <strong>de</strong><br />
disrupção<br />
“Existem três monstros<br />
perigosos: a ingratidão, a soberba<br />
e a inveja. Quando mor<strong>de</strong>m<br />
<strong>de</strong>ixam uma ferida profunda”.<br />
Martinho Lutero<br />
Francisco alberto Madia <strong>de</strong> souza<br />
maior país católico do mundo a caminho<br />
acelerado e irreversível da perda<br />
O<br />
<strong>de</strong> duas supremacias. De ser o maior país<br />
católico do mundo, e <strong>de</strong> ter no catolicismo<br />
a religião da preferência da maioria <strong>de</strong> sua<br />
população. Impossível para alguns, improvável<br />
para outros, hoje todos sabem inexorável.<br />
E acontece agora, 500 anos <strong>de</strong>pois,<br />
porque as religiões evangélicas apostaram<br />
na televisão, e a católica só <strong>de</strong>cidiu-se<br />
quando já era tar<strong>de</strong> <strong>de</strong>mais. Caso contrário,<br />
talvez fossem necessários entre 100 a 200<br />
anos mais.<br />
O processo <strong>de</strong> disrupção começou há<br />
mais <strong>de</strong> 500 anos, quando um padre da<br />
Alemanha, Lutero, aproveitando-se da<br />
<strong>de</strong>scoberta <strong>de</strong> Gutenberg, a impressão com<br />
tipos móveis, pô<strong>de</strong> disseminar sua revolta<br />
e <strong>de</strong>nunciar os graves crimes que aconteciam<br />
no Vaticano. Hoje, para cada <strong>de</strong>z programas<br />
evangélicos na TV, e, exagerando,<br />
no máximo, um católico. Assim, se os registros<br />
estatísticos continuarem apresentando<br />
em suas curvas o mesmo comportamento<br />
dos últimos anos, a data marcada é<br />
2035. Quando a Igreja Católica Apostólica<br />
Romana per<strong>de</strong> a sua li<strong>de</strong>rança na crença e<br />
preferência dos habitantes do Brasil.<br />
Até o Censo <strong>de</strong> 2010 era claro que isso,<br />
lá pela meta<strong>de</strong> do século, iria acontecer.<br />
No entanto, a ascensão dos evangélicos e a<br />
queda do catolicismo aceleraram-se. E, assim,<br />
em vez <strong>de</strong> per<strong>de</strong>r 1% <strong>de</strong> seus fiéis por<br />
ano, o catolicismo per<strong>de</strong> agora entre 1,1% e<br />
1,2%. Em entrevista para o jornal Valor, o<br />
<strong>de</strong>mógrafo José Eustáquio Diniz Alves, da<br />
Escola Nacional <strong>de</strong> Ciências Estatísticas<br />
do IBGE (Instituto Brasileiro <strong>de</strong> Geografia<br />
e Estatística), sentenciou: “Possivelmente,<br />
entre 10 e 15 anos, o Brasil não terá mais a<br />
supremacia católica”. E aí Ricardo Lessa e<br />
Valor foram conferir esses dados junto a<br />
algumas autorida<strong>de</strong>s da Igreja Católica no<br />
país, principalmente seu sentimento em<br />
relação a esse fato, se correspon<strong>de</strong> à realida<strong>de</strong><br />
que vivem no dia a dia. E quem se<br />
manifestou, para surpresa e perplexida<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> todos diante do que disse, foi o car<strong>de</strong>al<br />
Dom Sérgio da Rocha, presi<strong>de</strong>nte da CNBB<br />
(Conferência Nacional dos Bispos do Brasil),<br />
afirmando que na prática a situação é<br />
mais dramática do que os números do IBGE<br />
revelam. “Esse não é o maior problema da<br />
Igreja Católica – afirma Dom Sérgio –, o que<br />
mais preocupa não são os que seguem Jesus<br />
em outras igrejas, mas os que se dizem<br />
católicos e não vivem como tal!” Afirmação<br />
confirmada pelo Padre Valeriano dos Santos<br />
Costa, diretor da Faculda<strong>de</strong> <strong>de</strong> Teologia<br />
da PUC-SP: “Menos <strong>de</strong> 10% dos batizados<br />
frequentam as missas dominicais...”<br />
Pior que a crise no Brasil do catolicismo,<br />
só a do Chile. E por essa razão, a <strong>de</strong>cisão<br />
<strong>de</strong> Francisco <strong>de</strong> não ter vindo ao Brasil<br />
por ocasião dos 300 anos da padroeira Nossa<br />
Senhora da Aparecida, ter <strong>de</strong>cidido-se<br />
pelo Chile. Lá os números são <strong>de</strong>sesperadores.<br />
Segundo os institutos <strong>de</strong> pesquisa,<br />
a confiança na Igreja Católica, que era<br />
<strong>de</strong> 80% em 1996, <strong>de</strong>spencou para 37% em<br />
2017, muito especialmente em razão dos escândalos<br />
<strong>de</strong> pedofilia do padre Karadima,<br />
no ano <strong>de</strong> 2010.<br />
Tem como fazer-se alguma coisa para<br />
reverter essa situação? Não, não tem. Até<br />
conseguir-se movimentar uma das maiores<br />
corporações do mundo, com ranços culturais<br />
<strong>de</strong> dois milênios, tudo o que as estatísticas<br />
sinalizam hoje terão mais que se<br />
confirmado. E aí então, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> que os fiéis<br />
remanescentes <strong>de</strong>cidam e queiram, tudo a<br />
fazer é tentar reposicionar a ICAR, respeitando<br />
suas crenças e propósitos, na tentativa<br />
dramática e <strong>de</strong> extrema dificulda<strong>de</strong> <strong>de</strong><br />
resgatar o que anos atrás se <strong>de</strong>nominava<br />
<strong>de</strong> rebanho... Não era rebanho, eram pessoas<br />
<strong>de</strong> carne e osso, com muitas e muitas<br />
dores, sofrimentos e carências, que não se<br />
conformavam em ter <strong>de</strong> esperar a re<strong>de</strong>nção<br />
só <strong>de</strong>pois da morte... Queriam ser felizes<br />
aqui e agora. Nesta vida, na Terra. Assim,<br />
nesse ritmo, 500 anos <strong>de</strong>pois, aproxima-<br />
-se do final o maior processo <strong>de</strong> disrupção<br />
da história. Em menos <strong>de</strong> duas décadas, a<br />
maior religião do Brasil converter-se numa<br />
religião <strong>de</strong> médio porte. E, se nada fizer,<br />
mais adiante, numa religião <strong>de</strong> nicho. Nada<br />
é para sempre.<br />
Francisco Alberto Madia <strong>de</strong> Souza<br />
é consultor <strong>de</strong> marketing<br />
famadia@madiamm.com.br<br />
62 <strong>24</strong> <strong>de</strong> <strong>junho</strong> <strong>de</strong> <strong>2019</strong> - jornal propmark