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Papel e pel-355cula da montagem liter-341ria - Centro de Ensino ...

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Um mormaço levantou-se <strong>da</strong> terra queima<strong>da</strong>. Estremeceu lembrando-se <strong>da</strong><br />

seca, o rosto moreno <strong>de</strong>sbotou, os olhos pretos arregalaram-se. Diligenciou<br />

afastar a recor<strong>da</strong>ção, temendo que ela virasse reali<strong>da</strong><strong>de</strong>. Rezou baixinho<br />

uma ave-maria, já tranqüila, a atenção <strong>de</strong>svia<strong>da</strong> para um buraco que havia<br />

na cerca do chiqueiro <strong>da</strong>s cabras. Esfarelou a <strong>pel</strong>e <strong>de</strong> fumo entra as palmas<br />

<strong>da</strong>s mãos grossas, encheu o cachimbo <strong>de</strong> barro, foi consertar a cerca.<br />

Voltou, circulou a casa atravessando o cercadinho do oitão, entrou na<br />

cozinha.<br />

-É capaz <strong>de</strong> Fabiano ter-se esquecido <strong>da</strong> vaca laranja (RAMOS, 2000, p.<br />

41-42).<br />

No exemplo acima, o autor inicia o parágrafo com o discurso indireto, logo em<br />

segui<strong>da</strong> insere sutilmente o indireto livre, marcado nas lembranças <strong>de</strong> sinha Vitória.<br />

Neste momento, confun<strong>de</strong>-se com o personagem, numa simbiose discursiva, on<strong>de</strong><br />

apenas uma tênue linha separa narrador e personagem. Em segui<strong>da</strong>, retorna<br />

novamente para o indireto, e finaliza com o discurso direto, através <strong>da</strong> fala <strong>da</strong><br />

mesma.<br />

Fábio Freixeiro concluiu, em O estilo indireto livre em Graciliano Ramos<br />

(1959, p.150), que a presença <strong>de</strong>ste estilo peculiar nas obras do autor possui o<br />

mérito <strong>de</strong> se manter o cunho lingüístico originário <strong>da</strong>s frases <strong>da</strong> personagem, sem<br />

que seja necessário transcrevê-las em seu nome.<br />

Outro fato marcante no trecho citado é a presença <strong>de</strong> verbos carregados <strong>de</strong><br />

expressivi<strong>da</strong><strong>de</strong>, como <strong>de</strong>sbotar, estremecer e diligenciar, que <strong>pel</strong>a presença do<br />

discurso indireto livre, pu<strong>de</strong>ram transmitir to<strong>da</strong> a essência do momento.<br />

A linguagem do romance Vi<strong>da</strong>s secas, composta quase que totalmente por<br />

períodos simples, frases curtas, diretas, econômicas e <strong>pel</strong>a presença do discurso<br />

indireto, permitiu que o autor pu<strong>de</strong>sse controlar a pouca fala <strong>de</strong> seus personagens,<br />

ou até mesmo falar por eles, po<strong>de</strong>ndo assim manter seu estilo objetivo, e fazendo<br />

até com que a obra se aproxime <strong>de</strong> um monólogo, on<strong>de</strong> só existe um narrador.<br />

Para Roland Barthes (1976, p. 64), uma narrativa po<strong>de</strong>ria ser sustenta<strong>da</strong> <strong>pel</strong>a<br />

linguagem articula<strong>da</strong>, oral ou escrita, <strong>pel</strong>a imagem fixa ou móvel, <strong>pel</strong>o gesto ou <strong>pel</strong>a<br />

mistura or<strong>de</strong>na<strong>da</strong> <strong>de</strong> to<strong>da</strong>s estas substâncias. Graciliano soube mesclar variados<br />

olhares sobre uma reali<strong>da</strong><strong>de</strong>, fazendo com que o resultado <strong>da</strong> obra se apresente<br />

como que um caleidoscópio <strong>liter</strong>ário, surpreen<strong>de</strong>nte e intrigante.<br />

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