17.04.2013 Views

Revista nº 101 (A) - IGHB

Revista nº 101 (A) - IGHB

Revista nº 101 (A) - IGHB

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

46<br />

como figura não apenas para ser pintada, mas<br />

sentida, como criatura não para ser esposável, mas<br />

para ser comida, a mulata é o lugar decorrente do<br />

desejo imaginário escravocrata. Ela é o espaço<br />

mestiço onde a ideologia, também mestiça, exercita<br />

ambiguamente o jogo da sedução e da dominação<br />

erótica e econômica.<br />

No século XIX, mesmo com a participação de algumas<br />

mulheres operárias na revolução industrial, quando as<br />

reivindicações feministas saem do plano teórico, encontrando<br />

fundamentos sócio-políticos e econômicos, as mesmas<br />

ainda vivem sob o domínio do homem; quase sempre<br />

submissas aos seus desejos e veleidades. Em se tratando da<br />

figura feminina de cor, o grau de submissão é maior; primeiro<br />

por ser do gênero feminino e depois por trazer no<br />

seu estereótipo traços de uma raça tida como inferior, esta<br />

que deveria estar sempre apta ao trabalho e aos caprichos<br />

da casa-grande.<br />

Em poemas como “Na fonte” (Alves: 339), o poeta, se<br />

contrapondo aos valores da época, dá voz à personagem<br />

Maria, que durante o poema vai narrando os seus momentos<br />

de júbilos, de desconfiança e medo. Um canto que emana<br />

na carnadura dos versos e pelo qual o sujeito lírico possibilita<br />

à escrava, através da oralidade, a denúncia, o poder<br />

da fala, uma vez que, até então, a negra encontrava-se muda.<br />

Essa operação poética de Castro Alves contraria aquela<br />

ordem citada por Flávio Kothe (1997, p. 93) ao trazer a fala<br />

de Roland Corbisier, este que pontua:<br />

O escravo não é sujeito e não tem direitos,<br />

porque, como diria Hegel, não é “reconhecido” pelo<br />

senhor, não é visto por ele como se fosse também<br />

sujeito. O escravo não tem ser próprio, nada é, em<br />

si mesmo, pois o seu ser fundamenta-se no ser do<br />

senhor, de cuja vontade é apenas reflexo [...] O<br />

Rev. Inst. Geogr. Hist. Bahia, Salvador, v. <strong>101</strong>, p. 39-52, 2006

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!