relatório sobre os usos e costumes no posto administrativo de chinga
relatório sobre os usos e costumes no posto administrativo de chinga
relatório sobre os usos e costumes no posto administrativo de chinga
You also want an ePaper? Increase the reach of your titles
YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.
154<br />
Francisco A. Lobo Pimentel<br />
fácil <strong>de</strong> compreen<strong>de</strong>r: como compelido, é obrigado a trabalhar diariamente<br />
e a horas certas e, como voluntário, trabalha quando e como quer<br />
e isto porque europeus há que mes mo <strong>os</strong> 15$00 lhes não pagam, como<br />
seja o dito senhor Oliveira em M’Luli, on<strong>de</strong> há pret<strong>os</strong> que há dois ou três<br />
an<strong>os</strong> não recebem <strong>os</strong> seus salári<strong>os</strong>, sem que, <strong>no</strong> entanto, se queixem ou<br />
<strong>de</strong>ixem <strong>de</strong> trabalhar, já na esperança <strong>de</strong> um dia receber <strong>os</strong> salári<strong>os</strong> em<br />
atraso e já porque, conforme lhes diz o patrão, ou melhor, o agricultor,<br />
enquanto ali estão, ninguém <strong>os</strong> incomoda com serviç<strong>os</strong> compelid<strong>os</strong> e até<br />
mesmo com o pagamento do imp<strong>os</strong>to <strong>de</strong> palhota, a que todo o preto é<br />
obrigado. Portanto, repito, obrigue-se o preto a trabalhar para que ele <strong>de</strong><br />
futuro ao trabalho se <strong>de</strong>dique; eis a razão por que en tendo que não <strong>de</strong>via<br />
ser permitido ao agricultor ou industrial o recrutamento <strong>de</strong> voluntári<strong>os</strong>.<br />
Do voluntariado resulta a liberda<strong>de</strong> dada ao preto <strong>de</strong> trabalhar se<br />
quiser. Na Europa, o europeu é obrigado a trabalhar se não quer ser consi<strong>de</strong>rado<br />
vadio e <strong>de</strong>slocado da sua terra natal para as Colónias, dando-se<br />
assim ao negro uma liberda<strong>de</strong> que se não dá ao europeu; <strong>sobre</strong> o assunto,<br />
veja-se o <strong>relatório</strong> do gran<strong>de</strong> colonial, falecido, António Enes que diz:<br />
«O que se fez porém? Por medo <strong>de</strong> que as práticas do regime abolido<br />
lhe <strong>sobre</strong>vivessem, elaboraram-se leis e regulament<strong>os</strong> encimad<strong>os</strong><br />
por uma es pécie <strong>de</strong> <strong>de</strong>claração d<strong>os</strong> direit<strong>os</strong> d<strong>os</strong> negr<strong>os</strong>, que lhes dizia<br />
textualmente: ‘De ora em diante ninguém tem obrigação <strong>de</strong> trabalhar’;<br />
e <strong>os</strong> tribunais, e as autorida<strong>de</strong>s administrativas, foram encarregadas <strong>de</strong><br />
proteger contra qualquer atentado o sagrado direito <strong>de</strong> oci<strong>os</strong>ida<strong>de</strong> reconhecido<br />
a<strong>os</strong> african<strong>os</strong>. Na Me tró pole não se reconhece a<strong>os</strong> branc<strong>os</strong><br />
semelhante direito. Na Metrópole tod<strong>os</strong> são obrigad<strong>os</strong> a procurar adquirir<br />
trabalho e mei<strong>os</strong> <strong>de</strong> subsistência que lhes faltam, sob pena <strong>de</strong> serem<br />
consi<strong>de</strong>rad<strong>os</strong> vadi<strong>os</strong>. Na Metrópole professa-se uma fil<strong>os</strong>ofia e uma jurisprudência<br />
que preceituam a tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> seres racionais o cuidarem do<br />
seu aperfeiçoamento; a tod<strong>os</strong> <strong>os</strong> membr<strong>os</strong> da socieda<strong>de</strong> a coope rarem<br />
para o bem da colectivida<strong>de</strong>. Todavia, o pavor da escravatura, o frenesim<br />
<strong>de</strong> opor às doutrinas d<strong>os</strong> seus <strong>de</strong>fensores rasgadas reclamações liberais<br />
e humanitárias, saltaram por cima do código e da moral, do bom senso e<br />
das necessida<strong>de</strong>s económicas para ensinarem ao negro que tinha a liberda<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong> continuar a viver <strong>no</strong> estado selvagem, pois que tal é a necessária<br />
consequência da liberda<strong>de</strong> <strong>de</strong> não trabalhar, <strong>de</strong>ixada a quem só pelo tra-<br />
E-BOOK CEAUP 2008