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EXAME Moz 86

Edição de Março da EXAME, com tema de capa sobre a CTA, dossier sobre a nova lei laboral e um especial inovação com ênfase, nesta edição, na importância do ensino para a promoção da inovação

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alteração, por isso olho mais pela necessidade

que existe. Ao invés de se estar a

fazer uma revisão da lei — ainda que lhe

tenham chamado revisão pontual —, se

calhar a prioridade devia ser a regulamentação

da actua Lei do Trabalho. Este

é um aspecto.

O segundo aspecto tem a ver com o facto

de que se inicia um processo de revisão em

que não ficaram muito claros quais são os

termos de referência. Como consequência,

neste momento não há muita clareza

sobre o que vai ser alterado e porque está

a ser alterado.

São estes dois aspectos, que considero

prévios, que, antes de se iniciar o processo,

deviam ter sido considerados; verificar,

por um lado, se não valeria a pena

fazer apenas a regulamentação da actual

lei, por forma a suprir uma série de lacunas,

e, por outro lado, ficar muito claro o

que se pretende alterar e porque se está

a alterar. E, infelizmente, do que me foi

dado a ver, porque não participei directamente

no processo, há uma série de figuras

que foram introduzidas ou estão a

ser introduzidas sem terem sido resolvidos

os problemas que a anterior lei traz.

Ao invés de se estar a resolver um problema,

do meu ponto de vista podemos

estar a criar um problema ainda maior.

Que aspectos problemáticos deviam

ser sanados na lei em vigor ou

acautelados na proposta de revisão?

Eu vou só apontar alguns, mas são vários.

Por exemplo, no âmbito da contratação,

temos o contrato a termo certo que não

deixa claro se é permitida ou não a chamada

contratação sucessiva. O que é que

isso quer dizer? Se eu celebrei um contrato

a termo certo com um trabalhador por um

período, por exemplo, de um ano, quando

terminar esse período ele fica uma semana

ou um mês em casa e eu volto a contratá-lo.

Será que há continuidade entre estes dois

contratos ou devem ser considerados díspares?

E isso tem uma consequência, porque,

efectivamente, se forem considerados

contratos sucessivos, no final, quando for a

contar o tempo de serviço do trabalhador,

será maior do que se estiver a considerá-los

isoladamente. A lei não resolve essa questão

“NÃO DEVIA SER

UMA PREOCUPAÇÃO

INCREMENTAR O

NÚMERO DE HORAS”

e tem havido discussões sérias, mesmo nos

tribunais, porque em determinadas áreas

de actividade, por exemplo na construção

civil, é comum o empreiteiro contratar por

períodos curtos em função da actividade

que o trabalhador vai realizar; findo esse

período é dispensado, mas se entretanto

ele tiver outra obra volta a contratar e a

questão é que o trabalhador, quando se

vai queixar, quando termina a relação de

trabalho, diz: “Eu estou a trabalhar desde

2000.” No entanto, com intervalos entre

contratos em que é que ficamos? A lei não

clarifica. Podíamos também falar da questão

dos despedimentos. No processo disciplinar

há uma lacuna em relação à fase

de instrução, ou seja, se o trabalhador,

quando se está a defender, pedir à entidade

empregadora para realizar determinadas

diligências probatórias, a lei não

estabelece claramente qual é o período de

que dispõe a entidade empregadora para

realizar essas tais diligências probatórias.

Consequência: se a entidade empregadora

descurar a realização das diligências, o trabalhador,

naturalmente, e o sindicato, que

é chamado também para emitir um parecer,

não vão aceitar o documento [da decisão

do processo disciplinar]. Vão dizer que

foi pedida a realização de diligências probatórias

que não foram realizadas devido

a questões meramente formais.

As entidades patronais entendem

que certos aspectos da actual Lei do

Trabalho são um travão à mobilidade

e flexibilidade laboral e à criação de

emprego. Que comentário lhe merece

esta análise das entidades laborais?

Do meu ponto de vista, um factor que

podia até entusiasmar as entidades empregadoras,

nesse contexto de uma revisão

pontual da Lei do Trabalho, seria mais

nesta perspectiva, a de procurar resolver

as lacunas da actual Lei do Trabalho,

de procurar solucionar alguns aspectos.

As entidades patronais perceberam que

na proposta de revisão que estava a ser

apresentada não se estavam a resolver os

problemas que tinham. Pelo contrário,

estavam a ser criadas situações que, provavelmente,

vão contribuir para mais complicações.

Perante este facto, acho que faz

todo o sentido eles sentirem-se defraudados.

Quando se diz “vamos avançar para

uma revisão” e não está muito claro o que

vamos rever e porque estamos a rever, é

óbvio que em algum momento pode desagradar

a uma das partes envolvidas no

processo de revisão legislativa.

A introdução da decisão arbitral

obrigatória seria uma forma simulada

de reintroduzir a obrigatoriedade da

prévia mediação laboral?

Não, o que se trata em relação à mediação

obrigatória é mais para salvaguardar

os interesses de natureza pública porque,

como sabe, há empresas que perseguem

interesses públicos, para toda a sociedade.

Alguns sectores do patronato

manifestaram preocupação com

a possibilidade de redução dos

períodos probatórios porque lhes

reduz a margem de avaliação

das aptidões profissionais dos

trabalhadores. Como olha para essa

inquietação?

Acho que faz sentido. Vamos pegar num

caso concreto: eu contratei um técnico

médio ou superior na área de construção

civil para ele estar à frente de uma obra.

Não é possível em menos de seis meses

avaliar se ele tem capacidade ou não de

orientar a construção de uma obra. Convenhamos

que isso não faz sentido.

Em suma, não está optimista quanto

a esta revisão?

Tenho reservas de que, efectivamente, este

momento seja oportuno. Acho que tem

de haver uma análise mais profunda da

razão de ser de cada uma das alterações

que estão a ser introduzidas e, ao mesmo

tempo, deve-se estudar se não é possível

resolver muitas das questões que estão a ser

propostas através de um regulamento. b

* Serviço especial da agência Lusa para a EXAME.

março 2020 | 45

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