Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
C. A amplitude desta Revolução<br />
A Revolução tem derrubado muitas vezes autoridades legítimas, substituindo-as por outras<br />
sem qualquer título de legitimidade. Mas haveria engano em pensar que ela consiste apenas nisto.<br />
Seu objetivo principal não é a destruição destes ou daqueles direitos de pessoas ou famílias. Mais<br />
do que isto, ela quer destruir toda uma ordem de coisas legítima, e substituí-la por uma situação<br />
ilegítima. E “ordem de coisas” ainda não diz tudo. É uma visão do universo e um modo de ser do<br />
homem, que a Revolução pretende abolir, com o intuito de substituí-los por outros radicalmente<br />
contrários.<br />
D. A Revolução por excelência<br />
Neste sentido se compreende que esta Revolução não é apenas uma revolução, mas é a<br />
Revolução.<br />
E. A destruição da ordem por excelência<br />
Com efeito, a ordem de coisas que vem sendo destruída é a Cristandade medieval. Ora, essa<br />
Cristandade não foi uma ordem qualquer, possível como seriam possíveis muitas outras ordens. Foi<br />
a realização, nas circunstâncias inerentes aos tempos e aos lugares, da única ordem verdadeira entre<br />
os homens, ou seja, a civilização cristã.<br />
Na Encíclica Immortale Dei, Leão XIII descreveu nestes termos a Cristandade medieval:<br />
“Tempo houve em que a filosofia do Evangelho governava os Estados. Nessa época, a influência da<br />
sabedoria cristã e a sua virtude divina penetravam as leis, as instituições, os costumes dos povos,<br />
todas as categorias e todas as relações da sociedade civil. Então a Religião instituída por Jesus<br />
Cristo, solidamente estabelecida no grau de dignidade que lhe é devido, em toda parte era<br />
florescente, graças ao favor dos Príncipes e à proteção legítima dos Magistrados. Então o<br />
Sacerdócio e o Império estavam ligados entre si por uma feliz concórdia e pela permuta amistosa<br />
de bons ofícios. Organizada assim, a sociedade civil deu frutos superiores a toda a expectativa,<br />
cuja memória subsiste e subsistirá, consignada como está em inúmeros documentos que artifício<br />
algum dos adversários poderá corromper ou obscurecer” 19 .<br />
Assim, o que tem sido destruído, do século XV para cá, aquilo cuja destruição já está quase<br />
inteiramente consumada em nossos dias, é a disposição dos homens e das coisas segundo a doutrina<br />
da Igreja, Mestra da Revelação e da Lei Natural. Esta disposição é a ordem por excelência. O que se<br />
quer implantar é, per diametrum, o contrário disto. Portanto, a Revolução por excelência.<br />
Sem dúvida, a presente Revolução teve precursores, e também prefiguras. Ario, Maomé,<br />
foram prefiguras de Lutero, por exemplo. Houve também utopistas em diferentes épocas, que<br />
conceberam, em sonhos, dias muito parecidos com os da Revolução. Houve por fim, em diversas<br />
ocasiões, povos ou grupos humanos que tentaram realizar um estado de coisas análogo às quimeras<br />
da Revolução.<br />
Mas todos estes sonhos, todas essas prefiguras pouco ou nada são em confronto da Revolução<br />
em cujo processo vivemos. Esta, por seu radicalismo, por sua universalidade, por sua pujança, foi<br />
tão fundo e está chegando tão longe, que constitui algo de ímpar na História, e faz perguntar a<br />
muitos espíritos ponderados se realmente não chegamos aos tempos do Anticristo. De fato, parece<br />
que não estamos distantes, a julgar pelas palavras do Santo Padre João XXIII, gloriosamente<br />
reinante: “Nós vos dizemos, ademais, que, nesta hora terrível em que o espírito do mal busca todos<br />
os meios para destruir o Reino de Deus, devemos pôr em ação todas as energias para defendê-lo,<br />
se quereis evitar para vossa cidade ruínas imensamente maiores do que as acumuladas pelo<br />
terremoto de cinqüenta anos atrás. Quanto mais difícil seria então o reerguimento das almas, uma<br />
19<br />
Encíclica “Immortale Dei”, de 1º-XI-1885, Bonne Presse, Paris, vol. II, p. 39.<br />
16