22.12.2012 Views

déchets. stigmatisations, commerces, politiques ... - Viva Rio en Haiti

déchets. stigmatisations, commerces, politiques ... - Viva Rio en Haiti

déchets. stigmatisations, commerces, politiques ... - Viva Rio en Haiti

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

isco de interrupção, o que poderia reverter no efeito<br />

contrário ao desejado: désordre.<br />

Trata-se, é claro, de um conjunto de posições<br />

que não são homogêneas, mas que delineiam um<br />

campo de ações, ideias e debates. É nesse campo<br />

que se inserem os programas que o VR começou a<br />

implem<strong>en</strong>tar no domínio do lixo, em 2008, na zona<br />

em que realizamos a etnografi a. As percepções que<br />

alguns moradores da área têm das iniciativas do<br />

VR são igualm<strong>en</strong>te nuançadas. De um lado, algumas<br />

pessoas exprimiam satisfação pela limpeza e<br />

pelas mudanças notórias que estavam ocorr<strong>en</strong>do<br />

em alguns locais, mediante a ação das equipes de<br />

limpeza de ruas e canais, a instalação de lixeiras<br />

imediatam<strong>en</strong>te utilizadas e as campanhas de s<strong>en</strong>sibilização<br />

associadas ao projeto Bèlè Vèt. De outro<br />

lado, não deixa de haver desconfi ança sobre a<br />

continuidade das ações, como no caso da limpeza<br />

do canal Rockefeller na área de Pont Rouge. Ao<br />

mesmo tempo em que estava cont<strong>en</strong>te com o trabalho<br />

das brigadas, a população não deixava de lembrar<br />

que o canal já havia sido limpo outras vezes,<br />

que “não é a primeira vez, e depois volta tudo ao<br />

mesmo” e que o problema da sujeira não é deles,<br />

“mas de quem joga lá em cima, em Pétion Ville”.<br />

Entre os moradores da zona, percebem-se os<br />

efeitos da geração de postos de trabalho associados<br />

à coleta de lixo e limpeza das ruas. Mesmo<br />

não s<strong>en</strong>do empregos estáveis e em ocasiões de curto<br />

termo, receber um salário signifi ca uma grande<br />

difer<strong>en</strong>ça, explicitam<strong>en</strong>te reconhecida nas falas<br />

e na satisfação com que muitos <strong>en</strong>caram o trabalho.<br />

Mas permanecem as dúvidas quanto ao futuro,<br />

e os s<strong>en</strong>tim<strong>en</strong>tos de frustração daqueles que<br />

não estavam s<strong>en</strong>do empregados na época da pesquisa<br />

exprimiam-se muitas vezes com força e sob<br />

a forma de ameaça.<br />

12. CONCLUSÕES<br />

“O mar nunca retém a sujeira, a água que corre<br />

está sempre limpa” (Lanmè a pa janm k<strong>en</strong>be salte,<br />

dlo na k ap koule na li toujou pwòp). Afi rmações<br />

como estas, escutadas no decorrer da pesquisa,<br />

possuem conteúdos reveladores sobre o universo<br />

do lixo em Porto Príncipe e permitem voltar<br />

aos três eixos m<strong>en</strong>cionados no início deste trabalho:<br />

as lógicas da estigmatizações, as políticas e<br />

os circuitos comerciais.<br />

As frases referem-se a um suposto ditado corr<strong>en</strong>te<br />

no mundo rural, segundo o qual o lixo poderia<br />

ser simplesm<strong>en</strong>te jogado não importa em que<br />

local, pois a água se <strong>en</strong>carregaria de levar a sujeira<br />

para o mar. Pronunciadas em Porto Príncipe, elas<br />

descrevem a s<strong>en</strong>sação de desajuste <strong>en</strong>tre supostos<br />

hábitos rurais e a ausência de infraestrutura<br />

no mundo urbano. Elas trazem igualm<strong>en</strong>te à tona<br />

um elem<strong>en</strong>to-chave na confi guração social descrita<br />

neste trabalho: o fato de que a maior parte dos<br />

moradores é recém-chegada à área, prov<strong>en</strong>i<strong>en</strong>te do<br />

interior do país. Nas microrregiões 1 e 2, a maior<br />

parte deles não nasceu em Porto Príncipe; nas microrregiões<br />

4 e 6, há uma grande proporção de fi -<br />

lhos de imigrantes. Algumas pessoas chegaram de<br />

longe, outras das zonas rurais, que hoje são contíguas<br />

à área metropolitana da cidade.<br />

Pres<strong>en</strong>ciamos múltiplas situações que certam<strong>en</strong>te<br />

não acontecem só nessa área em que o lixo<br />

era simplesm<strong>en</strong>te jogado. 37 Constatamos igualm<strong>en</strong>te<br />

a ausência de infraestrutura, a falta de lixeiras,<br />

a acumulação de sujeira durante dias e semanas<br />

sem que houvesse serviço de coleta. Juntam<strong>en</strong>te<br />

com isto, como já dissemos, observamos<br />

a preocupação das pessoas com a limpeza, não só<br />

através das queixas relativas à degradação ambi<strong>en</strong>tal<br />

da área, mas também com a t<strong>en</strong>tativa de<br />

manter o lixo fora das habitações e longe dos corpos.<br />

Constatamos que, como acontece em outras<br />

grandes metrópoles, aqui também a maior quantidade<br />

de lixo não é produzida pelos habitantes<br />

dessas áreas extremam<strong>en</strong>te pobres. Eles insistem<br />

com razão sobre o fato de que a sujeira vem de fora,<br />

de cima e dos mercados. 38<br />

37 Os sacos plásticos vazios após o consumo água constituem,<br />

certam<strong>en</strong>te, um dos objetos mais jogados nas<br />

ruas. Como relatamos em um trabalho anterior, os sachè<br />

dlo são a principal fonte de água potável na região<br />

(Neiburg & Nicaise 2009). Várias pessoas chamaram a<br />

at<strong>en</strong>ção para as características singulares desse lixo<br />

e a sua importância no saneam<strong>en</strong>to da área e, em geral,<br />

na gestão do lixo em Porto Príncipe. M<strong>en</strong>cionaram,<br />

igualm<strong>en</strong>te, a necessidade de implem<strong>en</strong>tação de formas<br />

de reaproveitam<strong>en</strong>to dos saquinhos plásticos e/ou de<br />

criação de instrum<strong>en</strong>tos legais (como os que existem<br />

em outros países) que obrigue as empresas a pagarem<br />

parte do custo ambi<strong>en</strong>tal desses objetos.<br />

38 Além do fato de que a proporção maior de lixo produzido<br />

pelos extremam<strong>en</strong>te pobres é orgânico e não inorgânico,<br />

ao contrário do que se verifi ca nas áreas ricas<br />

das grandes metrópoles.<br />

LIXO | 107

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!