22.12.2012 Views

déchets. stigmatisations, commerces, politiques ... - Viva Rio en Haiti

déchets. stigmatisations, commerces, politiques ... - Viva Rio en Haiti

déchets. stigmatisations, commerces, politiques ... - Viva Rio en Haiti

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

94 | LIXO<br />

ga, onde os corredores estão mais d<strong>en</strong>sam<strong>en</strong>te habitados.<br />

Há construções de dois andares, fala-se<br />

em “casas”; em alguns casos, trata-se de moradias<br />

alugadas (como em quase todo o mercado imobiliário<br />

da cidade, o pagam<strong>en</strong>to dos aluguéis é anual).<br />

Há, em termos relativos, uma grande quantidade<br />

de latrinas resid<strong>en</strong>ciais, em geral, situadas<br />

nos fundos das moradias. Des<strong>en</strong>volve-se nessa microrregião<br />

uma grande quantidade de atividades<br />

ligadas a diversos ateliês de objetos em madeira<br />

(pilão, artesanato etc.) e, principalm<strong>en</strong>te, padarias<br />

(com fornos a l<strong>en</strong>ha, nunca gás) (foto 9).<br />

5. Na direção norte, <strong>en</strong>tra-se em Cité Vinc<strong>en</strong>t,<br />

ainda prefeitura de Porto Príncipe e, logo após, na<br />

área de Pont Rouge, já em Cité Soleil. Trata-se de<br />

uma grande zona resid<strong>en</strong>cial na qual se <strong>en</strong>contram<br />

vários ateliês de fabricação de objetos em<br />

alumínio (principalm<strong>en</strong>te panelas) e em madeira.<br />

Os primeiros aproveitam dejetos <strong>en</strong>contrados nos<br />

canais, principalm<strong>en</strong>te na área de Pont Rouge, na<br />

qual, após as chuvas, se acumula lixo plástico e<br />

borracha (usado como combustível) e metais (como<br />

ferro, ou o próprio alumínio). Nas movim<strong>en</strong>tadas<br />

ruas que delimitam essa microrregião, <strong>en</strong>contram-se<br />

várias balanças de compra / v<strong>en</strong>da de metais.<br />

No mom<strong>en</strong>to de realização da pesquisa, essa<br />

área era objeto de importantes ações por parte do<br />

VR, visando à limpeza do canal de Pont Rouge e<br />

das principais ruas em torno deste último e à instalação<br />

de lixeiras (fotos 10, 11 e 12).<br />

6. Do outro lado do Portail Saint Josef, atravessando<br />

a Grande Rue, <strong>en</strong>tramos na zona de<br />

Tokyo. Atrás da calçada onde se localiza o Kay Nou<br />

do VR, est<strong>en</strong>de-se uma região com uma organização<br />

socioespacial singular. Sua d<strong>en</strong>sidade populacional<br />

e sua história de ocupação parecem ser<br />

mais curtas do que na microrregião 4, logo à fr<strong>en</strong>te.<br />

Quase não há ateliês, balanças de pesagem ou<br />

pontos de compra / v<strong>en</strong>da de lixo (como em todas<br />

as outras microrregiões). Tampouco há latrinas comerciais,<br />

e as resid<strong>en</strong>ciais são extremam<strong>en</strong>te escassas.<br />

Ao contrário das outras microregiões onde<br />

isso é mais esporádico, aqui os corredores são sistematicam<strong>en</strong>te<br />

chamados de lakou, nome que tradicionalm<strong>en</strong>te<br />

designa o espaço territorial habitado<br />

pelas famílias ext<strong>en</strong>sas haitianas. 14 Mas esses<br />

lakous apres<strong>en</strong>tam também uma realidade muito<br />

variada. Há alguns nos quais o boss é o proprietário<br />

da área, v<strong>en</strong>do a si próprio e s<strong>en</strong>do visto pelos<br />

moradores como a fi gura <strong>en</strong>carregada de manter<br />

a infraestrutura do local – incluindo as latrinas –<br />

em bom funcionam<strong>en</strong>to. Alguns moradores são da<br />

família do boss, seus fi lhos, netos, afi liados, restavek.<br />

15 Mas há também <strong>en</strong>tre os moradores dos<br />

lakous os que são locatários e que não consideram<br />

possuir vínculos familiares com o boss. Há ainda<br />

lakous cujo boss não mora no local, mas só aparece<br />

ou <strong>en</strong>via alguém para receber o aluguel. E há<br />

lakous com histórias confl itivas ligadas aos longos<br />

períodos da “violência”, nas décadas de 1990<br />

e início de 2000, quando o antigo boss morreu ou<br />

emigrou e foi substituído por outro indivíduo, um<br />

antigo morador ou, inclusive, em alguns casos, o<br />

chefe de alguma banda armada a quem até hoje se<br />

deve pagar o aluguel.<br />

4. GRANNÈG JETE MALERÈ RANMASE<br />

A hierarquia social e a lógica estigmatizante<br />

revelam-se toda a sua força nesse ditado kreyòl “o<br />

que o peixe grande joga fora, o coitado aproveita”.<br />

Sempre há alguém por cima jogando e alguém por<br />

baixo aproveitando aquilo que o superior descarta.<br />

Essa frase, que revela percepções agudas sobre<br />

desigualdade e hierarquia social, aponta ainda<br />

para outro fato crucial: no limite, tudo pode ser<br />

aproveitado, reutilizado, transformado ou v<strong>en</strong>dido;<br />

o que é lixo para uns não é lixo para outros; em<br />

suma, os objetos tidos como lixo possuem vida social<br />

após terem sido descartados. 16<br />

No <strong>Haiti</strong>, como em outras sociedades com indicadores<br />

semelhantes de desemprego e pobreza,<br />

os objetos são int<strong>en</strong>sam<strong>en</strong>te aproveitados e reutilizados.<br />

Trata-se, por exemplo, do paraíso da “segunda<br />

mão”: o chamado pèpè. Originado de doações<br />

de objetos usados (principalm<strong>en</strong>te roupas),<br />

<strong>en</strong>viados a partir da década de 1960, especialm<strong>en</strong>te<br />

dos Estados Unidos, o pèpè cresceu <strong>en</strong>ormem<strong>en</strong>te<br />

depois do embargo imposto ao país, em 1994, e<br />

inclui, hoje, um importante mercado dos mais diversos<br />

objetos usados, consumidos maciçam<strong>en</strong>te<br />

no <strong>Haiti</strong> — de aparelhos de TV a roupas e sapatos,<br />

distribuídos principalm<strong>en</strong>te a partir do Marché<br />

Croix de Bossales, ao lado da área de pesquisa e,<br />

especialm<strong>en</strong>te, da microrregião 2, onde se conc<strong>en</strong>tra<br />

a v<strong>en</strong>da de roupa pèpè. 17 (foto 15)<br />

Mas há ainda uma infi nidade de objetos catados<br />

nas ruas ou <strong>en</strong>costas que são também int<strong>en</strong>sam<strong>en</strong>te<br />

reaproveitados. Eles podem ser destinados<br />

à construção ou ao equipam<strong>en</strong>to das mo-

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!