déchets. stigmatisations, commerces, politiques ... - Viva Rio en Haiti
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102 | LIXO<br />
dedica-se à compra e exportação de objetos visando<br />
a reciclagem. As outras intervêm na coleta de<br />
lixo domiciliar (recolhido em grandes caçambas<br />
deixadas nas ruas), de instituições públicas e privadas,<br />
hotéis, ONGs e, inclusive, das sedes da MI-<br />
NUSTAH. 30 A essas atividades, várias ainda acresc<strong>en</strong>tam<br />
o serviço de limpeza de latrinas e de dedetização<br />
(pest control). Vale a p<strong>en</strong>a sublinhar também<br />
que n<strong>en</strong>huma delas faz coleta em locais públicos<br />
e que, evid<strong>en</strong>tem<strong>en</strong>te, suas áreas de ação<br />
t<strong>en</strong>dem a ser as zonas mais favorecidas da cidade,<br />
longe de Bel Air ou Cité Soleil. Algumas dessas empresas<br />
(como Sanitec) empregam poucos funcionários,<br />
outras (notadam<strong>en</strong>te Jedco, Boucart e GS),<br />
mais de uma c<strong>en</strong>t<strong>en</strong>a. Estas últimas também des<strong>en</strong>volvem<br />
atividades em outras cidades do país.<br />
As empresas possuem registros ofi ciais, s<strong>en</strong>do<br />
supostam<strong>en</strong>te fi scalizadas pelo governo nacional<br />
e pelas prefeituras. No caso das companhias de<br />
coleta de lixo (como a Boucart, talvez a maior delas),<br />
fi scais do Ministério de Obras Públicas acompanham<br />
o percurso dos caminhões até a descarga.<br />
Além do pagam<strong>en</strong>to de impostos, elas mantêm<br />
uma relação int<strong>en</strong>sa com a gestão estatal do lixo,<br />
principalm<strong>en</strong>te no que diz respeito ao ger<strong>en</strong>ciam<strong>en</strong>to<br />
do lixão de Truitier. Algumas <strong>en</strong>com<strong>en</strong>daram<br />
a elaboração de planos para o que seria uma<br />
melhor gestão do local, aí <strong>en</strong>xergando algum tipo<br />
de negócio. Elas criticam a anarquia imperante<br />
e, principalm<strong>en</strong>te, as condições de acesso e circulação,<br />
o que destrói os caminhões, justifi cando –<br />
embora ninguém declare isto publicam<strong>en</strong>te – que<br />
em certas ocasiões o lixo seja descarregado em locais<br />
proibidos. 31<br />
Várias dessas empresas foram fundadas em<br />
meados da década de 1970. A mais antiga delas,<br />
Sanitec, foi criada em 1974 por um <strong>en</strong>g<strong>en</strong>heiro químico,<br />
antigo professor na Faculdade de Medicina<br />
e Farmácia, que foi Ministro de Obras Públicas.<br />
Como várias outras do mesmo tipo, no início, tratava-se<br />
de um negócio familiar dedicado basicam<strong>en</strong>te<br />
ao ramo da dedetização. Mais tarde, transformou-se<br />
em sociedade anônima à qual se agregaram<br />
outros investidores, ampliando os serviços<br />
também para a área de coleta de lixo (hoje em dia,<br />
conta com quatro caminhões).<br />
Na atualidade, a maior empresa privada no ramo<br />
da coleta é Boucart, criada em 1977, inicialm<strong>en</strong>te<br />
também como uma companhia familiar de dedetização.<br />
Segundo os seus proprietários, teria sido a<br />
deterioração da infraestrutura de serviços públi-<br />
cos que se seguiu à queda da ditadura Duvalier, em<br />
1986, que estimulou a <strong>en</strong>trada no negócio da coleta<br />
de lixo, consolidado a partir de 1993 (essa cronologia<br />
coincide com a história de outras empresas do<br />
ramo, como a Jedco, criada em 1995).<br />
Várias delas (Jedco, Boucart, Clean Rite) também<br />
oferecem o serviço de limpeza de latrinas e fossas<br />
sépticas, que pode ser realizado de duas maneiras:<br />
com máquinas ou manualm<strong>en</strong>te, empregando o<br />
trabalho de bayakous. Neste caso, o serviço é mais<br />
caro e deve ser realizado de noite (“são coisas que<br />
não podem ser feitas durante o dia”). A participação<br />
de bayakous ou o uso de máquinas dep<strong>en</strong>de da existência<br />
ou não de fossas sépticas. Quando elas existem,<br />
a chance de utilização de máquinas é maior;<br />
quando se trata de latrinas, costuma-se utilizar os<br />
bayakous. Isto dep<strong>en</strong>de também do estado das latrinas:<br />
se estão secas ou cheias de outros dejetos<br />
(como pedras ou plásticos) não é possível o uso de<br />
máquinas, o que obriga à interv<strong>en</strong>ção de bayakous.<br />
Segundo afi rma o proprietário de uma das empresas:<br />
“Os bayakous são livres, nós trabalhamos com<br />
eles só quando é preciso”. As matérias fecais são supostam<strong>en</strong>te<br />
jogadas em Titany<strong>en</strong>, único local autorizado<br />
pelo Estado. O preço do serviço dep<strong>en</strong>de da<br />
difi culdade de acesso às latrinas e fossas sépticas<br />
e da quantidade de caminhões necessária.<br />
A única companhia de compra de objetos<br />
(plástico, metais e papelão) para reciclagem e exportação<br />
é a GS. A empresa dedica-se exclusivam<strong>en</strong>te<br />
a esta atividade, nela trabalhando mais de<br />
100 funcionários. Foi fundada em 1971 como uma<br />
fábrica de colchões. Segundo relatam seus dirig<strong>en</strong>tes,<br />
após o fi m do regime dos Duvalier, o mercado<br />
teria sido inundado por colchões contrabandeados,<br />
o que levou à mudança de ramo. Foi <strong>en</strong>tão<br />
que resolveram ingressar no mercado do lixo, inicialm<strong>en</strong>te<br />
adquirindo ferro. A partir de 2003, começaram<br />
a comprar outros metais. Em 2007, incorporam<br />
o papelão e, em 2008, garrafas de plástico.<br />
Na época da realização desta pesquisa, a companhia<br />
preparava-se para iniciar a compra de papel,<br />
óleo de motores e lixo eletrônico. 32<br />
A GS adquire os objetos diretam<strong>en</strong>te em sua<br />
sede (na Rue de l’Aéroport) de grandes intermediários<br />
e de pequ<strong>en</strong>os vandè pa pèz-kokorats. No<br />
local da empresa, há cartazes que explicam os tipos<br />
de materiais que podem ser v<strong>en</strong>didos e as condições<br />
nas quais eles devem ser <strong>en</strong>tregues (fotos<br />
39 e 40). Os funcionários da GS também adiantam<br />
informações relativas aos preços futuros, que va-