Prosa - Academia Brasileira de Letras
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O olho <strong>de</strong> Bluteau, o <strong>de</strong> Cândido Lusitano...<br />
Prolonga-se o verbete por muito mais, analisando músculos, revestimentos,<br />
humores, expressões do rosto marcadas pela abertura dos olhos, doenças que<br />
os afetam, animais e seres mitológicos que têm muitos olhos e por aí vai. Em<br />
<strong>de</strong>terminado passo, observa:<br />
“Sobre o temperamento dos olhos saõ differentes as opinioens: os que seguem<br />
a opinião <strong>de</strong> Aristóteles dizem, que os olhos saõ <strong>de</strong> temperamento humido:<br />
& os sequazes <strong>de</strong> Platão dizem, que os olhos saõ <strong>de</strong> temperamento igneo.<br />
Mas facilmente se po<strong>de</strong>m conciliar estas duas opinioens, dizendose que em<br />
razão do muito humor os olhos saõ humidos, & juntamente igneos, por causa<br />
dos espiritos visuaes, a que Galeno chama fulgidos, & luminosos”.<br />
Pouco a seguir, analisa o étimo da palavra e nele viaja, dizendo, com licença<br />
isidoresca: “No que toca à etymologia, olho se <strong>de</strong>riva <strong>de</strong> Oculus, & Oculus<br />
vem <strong>de</strong> Occultus, ou porque o olho com o véo das pestanas se occulta, ou por<br />
antiphrasi, porque à luz dos olhos nada fica occulto”.<br />
Ao fim do verbete, arrola muitas <strong>de</strong>zenas <strong>de</strong> locuções, coocorrências <strong>de</strong><br />
alta frequência na língua, além <strong>de</strong> outros tipos <strong>de</strong> sintagmas, idiomatismos,<br />
fraseologias, adágios portugueses, até citações <strong>de</strong> poesia em espanhol (Ïñes,<br />
dame tus ojos por una noche,/ Porque quiero con ellos matar a un hombre”).<br />
Os sentidos especiais da palavra olho aparecem em meio a tudo isso.<br />
“Olho. Ás vezes he o mesmo que o meyo <strong>de</strong> alguma coisa. Vir o vento<br />
pelo olho da barra, he vir pelo meyo <strong>de</strong>la. Pôr um homem no olho da rua,<br />
he lançallo fóra da casa don<strong>de</strong> está, & <strong>de</strong>ixallo no meyo da rua.<br />
Olho, nas plantas, he o remate tenro dos ramos nas arvores, & dos talos<br />
nas hervas; o qual remate se se tirar, não cresce tanto a arvore, nem a herva.<br />
Das borbulhas nascem os ramos, & assim olho he differente <strong>de</strong> borbulha,<br />
porque esta se fórma nos lados do ramo novo da arvore fructifera, & aquele<br />
sahe na extremida<strong>de</strong> do proprio ramo da dita planta”.<br />
Os verbetes <strong>de</strong> Bluteau são mais enciclopédicos do que o que hoje chamamos<br />
<strong>de</strong> linguísticos e esten<strong>de</strong>m-se em consi<strong>de</strong>rações, extensões e opiniões<br />
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