A CONDESSA VÃSPER Aluà sio Azevedo - Bibliotecadigital.puc ...
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muito mais forte que as anteriores.<br />
As lágrimas saltaram-lhe dos olhos e o coração lhe palpitou com<br />
veemência.<br />
Teve uma terrível noite de febre e de ansiedade. O pai e a avó viram-se<br />
aflitos. O médico cobria-os de perguntas, e olhava atentamente para os olhos<br />
expressivos de Laura.<br />
— Não é nada... dizia ele depois, em particular ao cocheiro.<br />
E segredou-lhe alguma cousa ao ouvido.<br />
— Não! não! respondeu Jorge. Isso foi logo que ela entrou nos quatorze<br />
anos... Hoje está com dezesseis.<br />
— Ela tem algum namoro?...<br />
— Qual!... Teve um, mas foi tolice de criança; passou!<br />
— Entretanto, aquilo pode converter-se em seria... É preciso casá-la.<br />
Desde esse dia, Jorge vivia preocupado com a idéia de casar a. filha. Mas<br />
não achava jeito de tocar-lhe no assunto.<br />
Além disso, coitada! pensava o bom homem; a quem diabo iria ela<br />
escolher para marido?... A pobre rapariga só conhecia gente, que lhe podia<br />
encher as medidas!<br />
Laura estava, com efeito, na crise fi<strong>sio</strong>lógica em que as aves cantam, e<br />
ter-se-ia dedicado exclusivamente a preparar o seu ninho, se, como dizia o pai<br />
no seu rude bom senso, houvesse por ali algum rapaz que lhe enchesse as<br />
medidas.<br />
O vela de Sebo, apesar de toda a sua semelhança com Bonaparte, fora<br />
posto à margem, desde que ultimamente dera para emborrachar-se aos<br />
domingos. Laura, pois, não tinha a quem dedicar os gorjeios da sua<br />
puberdade. Seu canto de amor ficou sem resposta e transformou-se em<br />
gemidos, que foram cair aos pés de Ambrosina, como um tesouro sem dono.<br />
Eis em que condições olhava, embevecida, a filha do cocheiro, para<br />
aquele formoso ser que permanecia prostrado sobre a cama.<br />
No quarto reinava o silêncio triste das noites de chuva, só se ouvia a<br />
conversa monótona de Jorge, que na sala próxima tomava café com Alfredo,<br />
servidos pela velha Benedita.<br />
Fez-se mais tarde, e Jorge, depois de cuidado o hóspede, disse aos seus<br />
que se recolhessem.<br />
Teve-se de armar uma cama para Alfredo, na sala de visitas; Laura<br />
dormia ao lado de Ambrosina, no mesmo leito.<br />
Daí a meia hora, estavam todos acomodados. Laura fechou as portas do<br />
quarto, soltou os cabelos e despiu-se. A amante de Gabriel continuava a<br />
dormir. A menina assentou-se perto dela, quedou-se a contemplá-la com um<br />
olhar profundamente meigo.<br />
A espaços, leves suspiros entreabriam os lábios da adormecida.<br />
Laura vergou-se sobre ela e deu-lhe um beijo.<br />
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XXIV<br />
O IMPLACÁVEL ALFINETE<br />
Foi uma noite de insônia e divagações para a filha do cocheiro.<br />
Logo que ela se deitou ao lado de Ambrosina, sentiu um estremecimento<br />
nervoso encrespar-lhe a dourada penugem do corpo. Encolheu-se toda, como<br />
uma rola acariciada.<br />
A luz frouxa de uma lamparina de azeite derramava-se no quarto,<br />
deixando perceber confusamente os objetos.<br />
Laura, apoiada sobre o cotovelo esquerdo, amparando a cabeça com a<br />
mão, tinha, no gracioso abandono íntimo do leito, um profundo ar de enlevo e<br />
de melancolia. O colo, meio descoberto, aparecia-lhe através das modestas<br />
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