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A CONDESSA VÉSPER Aluí sio Azevedo - Bibliotecadigital.puc ...

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porém, é que se não deixou tragar assim tão facilmente, e a cada nova aurora<br />

reflorescia mais grimpadora e viçosa. Diziam dele, entretanto, que, para embaricar<br />

um bom cágado num lasquenetezinho bancado, não havia no Rio de<br />

Janeiro mão mais limpa, nem mais lúcida cultura.<br />

Depois do ardente desfilar das sociedades carnavalescas, seguiram os<br />

três e mais Rita Beijoca para o hotel dos Príncipes, onde a bela crápula fervia<br />

de portas adentro num inferno de guinchos e risadas em falsete.<br />

O Barros, que era o gerente do hotel, mal os viu entrar, levantou-se a<br />

recebê-los com tal risinho açucarado, e mandou pela surrelfa chamar lá em<br />

cima, com urgência, a Rosa Cantagalense.<br />

A Rosa Cantagalense, apesar de simples hóspede no hotel, podia a justo<br />

título dizer-se o braço direito do Barros, e tinha por isso, sobre as despesas<br />

extraordinárias a que obrigasse os fregueses de boa lá, certa percentagem que<br />

lhe era abatida nas próprias contas. Entre as muitas e variadíssimas<br />

tosquiadoras do principesco estabelecimento, era ela a única deveras perfeita<br />

naquele agronômico e astucioso trabalhinho, a única que sabia a primor tosar<br />

uma desgarrada ovelha, sem que desse por tal a paciente, enquanto não<br />

estivesse de todo tosquiada.<br />

A Cantagalense não desceu ao chamado do gerente; mando dizer que:<br />

"Ainda estava ocupada a despachar o mineiro..."<br />

O Barros subiu logo de carreira a ter com ela.<br />

Veio a loureira falar-lhe à porta do quarto, em meias e roupão de alcova:<br />

— É preciso esperar mais um pouco, segredou, a piscar o olho, no<br />

ardiloso tom que as regateironas põem nas suas palavras quando tratam de<br />

negócio. Agora é que ele está pegando no sono...<br />

— Fizeste-o gastar mais alguma cousa no quarto?... perguntou o Barros<br />

com interesse.<br />

— Fiz, respondeu a outra; creio que ele não deixará menos de uns<br />

duzentos mil-réis...<br />

— Bem; mas, avia-te daí, que és necessária lá embaixo. O Gabriel<br />

chegou já, e vem de troça! Estão todos meios prontos.<br />

— Eles que se vão servindo; eu já desço!<br />

O mineiro, que se achava recolhido ao quarto do hotel dos Príncipes,<br />

havia chegado esse mesmo dia de Minas, com intenção de assistir<br />

pacificamente às festas do carnaval do Rio.<br />

Às três e meia da tarde sentiu vontade de jantar, e a desgraça o levou<br />

ao hotel dos Príncipes.<br />

O mineiro comeu com apetite e achou até muito bom o que lhe serviram.<br />

Mas, enquanto comia, reparou que, de certa mesa, uma mulher bonitona<br />

olhava para ele com meiga insistência<br />

Era a Cantagalense, que nessa ocasião acabava de almoçar.<br />

O mineiro não se preocupou com isso, e continuou a atacar as vitualhas<br />

com uma considerável energia e um silêncio mais solene.<br />

À sobremesa, porém, a tentadora já havia levantado, e viera assentar-se<br />

à mesa imediata à do nosso mineiro.<br />

O bom homem fez-se da cor de uns marmelos em calda que nessa<br />

ocasião triturava, e só conseguiu levantar os olhos ao fim de alguns segundos.<br />

— A senhora é servida?... perguntou ele no gracioso sotaque da sua<br />

província.<br />

A loureira agradeceu e, com tal mimo lhe pediu que aceitasse um taça do<br />

seu vinho, que o amimado não resistiu ao convite.<br />

Para não ficar atrás, fez vir chamapanha. A moça então por sua conta e<br />

risco pediu uma salada de ananás cozido em madeira, um pudim negro e<br />

borgonha para destemperar o cliquot. Depois vieram charutos, cigarrilhos café<br />

e licores.<br />

Daí a nada, o mineiro recebia uma ardente declaração de amor e<br />

correspondia contando francamente a sua vida e os seus negócios.<br />

É inútil dizer que em seguida a isso as cousas foram muito longe, e que a<br />

dourada mosca, uma vez pri<strong>sio</strong>neira nas teias da ardilosa aranha, tinha de ser<br />

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